COLUNA DO GUSTAVO NOLASCO

Silêncio seletivo, flerte com o sapatênis e o eterno “quase”

Não temos mais tempo para esperar que esse bom padrão de jogo continue a ser inoperante quanto aos resultados

Iniciei esses rabiscos exatamente 20 horas após mais uma derrota do Cruzeiro, cravando a sequência de cinco jogos sem uma mísera vitória. Nesse longo período de tempo, nenhuma palavra pública de cobrança da cúpula da SAF para dar uma resposta contundente ao pífio desempenho do time ou para pedir desculpas ao torcedor que, afinal, paga seus salários e gera os lucros esperados para o clube-empresa. Um silêncio que beira a covardia, não fosse ele, na verdade, fruto da prepotência de quem acredita que nós, da arquibancada, somos quem lhes devemos favor, agradecimento ou desculpas.

Se, em 2020/2021, o presidente do clube sumia para não dar satisfação aos jogadores e funcionários do clube sem salários, como revelaram recentemente ex-jogadores, a nossa SAF parece seguir a mesma cartilha em relação à torcida e à imprensa – aqui, leia-se jornalistas que não aceitam jabás, e não “influencers” ou “comunicadores”, muitos desses regados a mimos ou patrocínios casados com o clube.

Voltando às práticas da diretoria anterior, mesmo representando uma torcida de nove milhões de pessoas de todas as classes sociais – em sua maioria, de baixa renda -, dentro da SAF se manteve uma prática nefasta e segregacionista: a de privilegiar uma categoria de sócios-torcedores destinada aos de maior poder aquisitivo quando o tema é o diálogo verdadeiro e a prestação de contas.

O próprio Comitê de Torcedores, iniciativa reconhecida, festejada e aplaudida, parece mesmo – infelizmente – ter o fim temido: o de ser apenas um jogo de cena para aplacar crises de comunicação. Passado um mês de funcionamento, a diretoria do clube renegou seus respeitados integrantes – e por mim, admirados – a um vernissage de fantasia para mascote. 

Esse silêncio seletivo soa como flerte à cultura repugnante do sapatênis, para desonra da classe operária de imigrantes italianos que fundou um clube popular e democrático para chamar de seu em 1921. 

Lá pelas bandas da Turma do Sapatênis, mesmo o Atlético de Lourdes sendo sustentado pelos Bilionários do Brasil Miséria, a cada resultado negativo, insistem na prepotência de jogar a culpa na arbitragem ou no “sistema”, como se ele não fosse operado pelos próprios ricaços. De cá, não tem sido muito diferente.

Bom relembrar o chilique dado por nosso atual mandatário às primeiras e democráticas críticas vindas da torcida raiz ao desempenho pífio no início da temporada.

E o que falar desse eterno “quase” dentro dos gramados? Justiça seja feita, a SAF foi em busca de bons nomes para o restante da temporada. Trouxe reforços pontuais que rapidamente deram provas da capacidade de qualificar o time, como Lucas Silva e Arthur Gomes.

Porém, não temos mais tempo para esperar que esse bom padrão de jogo continue a ser inoperante quanto aos resultados. Chega a ser patética a comemoração – e o silêncio da diretoria da SAF – por jogarmos melhor contra o Palmeiras do que contra o Goiás se, no final, o placar foi o mesmo: derrota.

“Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governados por aqueles que gostam.” A frase do filósofo Platão é boa analogia para refletirmos sobre o perigo de a torcida do Cruzeiro – sempre apaixonada, presente, alegre e maior de Minas Gerais – abrir mão ou se constranger por cobrar a atual diretoria do clube.

Quanto àqueles “que gostam de governar” sob a égide do silêncio seletivo, do flerte com o sapatênis e do eterno “quase” (no Z-4), lamento desagradá-los, mas sigo do lado dos que não nasceram para ser gado ou massa de manobra.

Compartilhe