COLUNA TIRO LIVRE

Um choque de realidade sobre Neymar

Há uma distância entre o atleta que muita gente gostaria que o Neymar fosse e o jogador que o Neymar é

A ida de Neymar para o Al Hilal resultou numa enxurrada de pessoas, do lado de cá do Atlântico, se dizendo decepcionadas com a escolha do atacante. Para essa turma, Neymar não poderia ter se “rebaixado” ao futebol árabe. Com a qualidade que ele tem, deveria jogar em um mercado de nível técnico à altura. Talvez resida aí o grande problema desse tipo de pensamento: a projeção que é feita sobre Neymar.

Há uma distância entre o atleta que muita gente gostaria que o Neymar fosse e o jogador que o Neymar é. Essa conversa não passa necessariamente pelo âmbito da qualidade que ele tem, que é grande. Da geração dele, é o melhor que surgiu. Isso é incontestável.

O que muitos não entendem (ou não aceitam) é que o Neymar não quer e nunca quis ser o atleta que muitos queriam que ele fosse. Ao longo da carreira, deu vários exemplos disso.

Essa determinação do atacante em ser quem é, em fazer o que gosta, em ir onde quer e, sobretudo, em não se preocupar em corresponder expectativas alheias está muito clara, inclusive, no documentário sobre ele, que está disponível no serviço de streaming Netflix. Sem entrelinhas. Para bom entendedor, há diversos momentos ali que demonstram o desapego de Neymar com opiniões de terceiros.

Ele não se interessa em ser exemplo, contrariando quem imagina que poderia ser nome importante para levantar bandeiras nas lutas contra o racismo e a homofobia nos gramados. Nem tampouco se incomoda em ter condutas que não fazem parte da cartilha de um profissional do esporte – choveram críticas pela presença do atacante em festa no réveillon de 2022 no Brasil, quando se recuperava de lesão no tornozelo esquerdo e usava até o auxilio de muletas para andar. Ele tanto não se importa com o que vão falar que posta fotos nas redes sociais.

Dez anos depois de chegar à Europa para jogar no Barcelona, exaltado como grande promessa do futebol mundial, Neymar se despede. Nesse período, esteve entre os melhores, mas nunca foi o melhor. Teve seus momentos de encantamento – no Barcelona –, mas não alcançou o topo que (novamente) muitos imaginariam que ele alcançaria. É um grande jogador, mas não o suficiente para estar num top 5 do futebol de todos os tempos. Neymar foi, e é, Neymar.

Trocou o Velho Continente por um contrato que vai garantir salário de mais de R$ 1 milhão por dia e, segundo a imprensa internacional, mesmo com tanto dinheiro, regalias bancadas pelo clube árabe como mansão com 25 quartos – e detalhe importante, geladeira abastecida com suco de açaí e refrigerante de guaraná –; avião privado; oito carros de luxo; além de pagamentos dos custos de estadias em hotel e restaurantes nas cidades que ele visitará nos dias de folga, entre outros.

Neymar pediu, os xeques atenderam e, aos 31 anos, ele vai ter uma vida das arábias. Não há uma preocupação esportiva. Mais que isso: não há obsessão esportiva. Ele está seguindo a vida dele como sempre quis. Fazendo as escolhas que, para ele, fazem sentido. O futebol é mais um elemento nessa composição.

Não me parece que em algum momento da carreira Neymar tenha perdido o sono por não ser campeão do mundo, ou por não ser eleito o melhor jogador do planeta. Também não parece dar importância ao que dizem dele. Quem esperava ainda vê-lo brilhar em gramados europeus, em ligas importantes, a esta altura, precisa desse choque de realidade.

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