Não dá pra acusar Ronaldo, sócio majoritário da SAF do Cruzeiro, de ter enganado o torcedor celeste. Muito pelo contrário. Se tem alguém que sempre buscou passar uma mensagem de pés no chão é o Fenômeno. Ele nunca estabeleceu metas mirabolantes à frente da Raposa. Nas raras vezes em que tem se manifestado publicamente, não joga para a galera, distribuindo promessas vazias apenas para inflar o ego da torcida.
Isso é um ponto positivo em um meio no qual as pessoas se aproveitam da passionalidade do torcedor para vender ilusões. O futebol é terreno fértil para discursos utópicos, pouco embasados, utilizados apenas para angariar a simpatia das torcidas. Assim são construídos supertimes e estabelecidas metas fantasiosas – que existem apenas no imaginário desses cartolas.
Até que um dia entram em choque a falácia e a vida real. A consequência disso são torcedores revoltados, mas não com quem alimentou neles ideias irreais. Geralmente, quem paga essa conta são jogadores e treinadores.
A meta de Ronaldo
No caso do Cruzeiro, Ronaldo sempre enfatizou que a meta neste ano era permanecer na Série A do Campeonato Brasileiro. Falou isso mais de uma vez. A última, há quase três meses, em entrevista ao podcast Mano a Mano, comandado pelo rapper Mano Brown.
Em 6 de julho, ele disse: “É um processo. A gente subiu ganhando a Série B. E, neste ano, o nosso objetivo é só a permanência, só a permanência. A gente tratou de deixar muito claro para não enganar o nosso torcedor de que este ano é um ano de sobreviver na Série A”.
Àquela altura, muitos estavam animados com o Cruzeiro de Pepa. Afinal, foram quatro vitórias nos seis primeiros jogos (sendo duas goleadas – 3 a 0 sobre Bragantino, em Bragança Paulista, e 4 a 0 sobre o América, no Independência) e certa regularidade nas partidas seguintes.
Passadas 13 rodadas, a Raposa somava 18 pontos de cinco triunfos, três empates e cinco derrotas. Ronaldo ressaltou, na mesma entrevista, que o planejamento passava por manter o clube na elite para, “a partir do ano que vem, criar mais receitas e aí ser mais competitivo”.
Até hoje o Cruzeiro está na zona estabelecida por Ronaldo. Ainda na 12ª colocação, com 25 pontos, 39% de aproveitamento. O problema é que, desde aquele bate-papo com Mano Brown, o time conquistou somente uma vitória, e o número de empates (sete) e derrotas (oito) cresceu vertiginosamente.
Nessa hora, toda a culpa recai sobre o treinador, ainda que em um grupo tecnicamente limitado as oscilações em competições de tiro longo, como o Brasileiro, sejam comuns. Era natural que o Cruzeiro não ficaria entre os primeiros, a instabilidade viria. Como veio. Sobrou, então, para Pepa. Não só para ele: também para quem chegar para tocar o barco até o fim do ano.
A saída de Pepa do Cruzeiro
A troca no comando alivia a pressão, mas não resolve todos os problemas celestes. Se havia situações mal resolvidas relativas ao entendimento do português com o grupo, por outro lado há questões preocupantes referentes ao time em si. O grupo não foi formado para buscar aspirações maiores. A mudança de treinador tem efeito moral e motivador, porém, ela não soluciona todos os males para os lados da Toca da Raposa.
A meta, não se esqueçam, é permanecer na Série A. É o que determinou Ronaldo, e ele está certíssimo. Só não dá para cobrar, de quem passou ou de quem for contratado, campanha de campeão, nem de G-4. Mais do que isso, é necessário certa racionalidade até para esticar a corda. Entender o que é possível alcançar.
Se o próximo treinador surpreender com um bom início de trabalho (leia-se uma sequência de bons resultados) novamente, que ele não se torne refém da expectativa criada por torcedores.