Quando o Campeonato Brasileiro chega ao fim, começam as listas. Os melhores, os piores, as surpresas, as decepções, o craque… Sem que nos déssemos conta, com o passar cada vez mais frenético do tempo, aqui estamos novamente, diante desse cenário. O que dá para dizer é que a edição de 2023 foi pródiga, especialmente, em histórias. Não faltaram, em seu enredo, plot twists – termo da moda que descreve as famosas reviravoltas.
Se esta coluna tivesse uma trilha sonora, ela seria o (ou um dos, porque são vários) hit de Lulu Santos Como uma onda. Vejamos os versos iniciais da canção: “Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia/Tudo passa, tudo sempre passará/A vida vem em ondas como um mar/ Num indo e vindo infinito/Tudo que se vê não é igual ao que a gente viu há um segundo/ Tudo muda o tempo todo no mundo”.
O Brasileiro foi assim, se renovando, mudando certezas de lugar, com tudo passando como ondas, tal qual a mutação cantada por Lulu. Foram vários os momentos em que algo que parecia certo, se perdeu. Ou que estava muito errado e se corrigiu. O desespero de alguns encontrou, no apito final, o deleite do alívio. A felicidade antecipada de outros se transformou em frustração tardia.
É possível contar como foi o Brasileiro deste ano resumindo-o a cinco tópicos. Três deles são referentes ao futebol de Minas, que viveu toda sorte de emoções. E dois são relativos à arte do imponderável.
O ponto de partida é, na verdade, o ponto final. A definição do dono do título somente na derradeira rodada, com o Palmeiras erguendo, de novo, a taça. Naquele que pode ter sido o último capítulo do vitorioso Abel Ferreira no Brasil, o time paulista conseguiu uma arrancada baseada na solidez do trabalho que o treinador português desempenha há três anos.
Mas é impossível dissociar a ascensão palmeirense à derrocada do Botafogo. O alvinegro carioca assumiu a liderança na terceira rodada, ficou nada menos que sete meses na primeira colocação – inclusive impondo 13 pontos de vantagem para o segundo lugar –, mas não se sustentou no topo. Na 34ª rodada do Brasileiro, foi ultrapassado pelo Palmeiras. E aí o Verdão não mais deixou o posto.
Atlético, Cruzeiro e América
Um estranho no ninho roubou a cena para dividir o protagonismo com os palmeirenses e escrever também um roteiro de superação neste Brasileiro. Paulinho obteve uma marca pessoal: a artilharia do torneio, com gols sobretudo na Arena MRV, que calou de críticos a intolerantes religiosos. Em nenhum momento o camisa 10 atleticano jogou na imprensa palavras relativas a vingança. A melhor resposta veio em campo, a cada bola que foi morrer no fundo das redes.
O Cruzeiro também viveu uma trajetória de resgate. No início do campeonato, sob o comando de Pepa, ensaiou uma campanha espetacular, mas a desilusão veio na mesma proporção, tomando contornos assustadores na reta final. A ameaça de rebaixamento se fez presente, reacendendo traumas e pesadelos. No apagar das luzes, a uma rodada do encerramento, veio a redenção.
Já o América não escapou da fatalidade. Em sua pior campanha em todos os tempos na era dos pontos corridos, em nenhum momento conseguiu sair da zona de rebaixamento. Viveu de uma triste regularidade: passou todas as 38 rodadas entre os piores. Não esboçou sequer lampejos de reação. Traduzindo em números, somou apenas 24 pontos e sofreu nada menos que 81 gols. Depois de três boas temporadas na elite, com direito ao oitavo lugar de 2021 (que lhe deu a inédita vaga na Copa Libertadores) e à 10ª posição em 2022 (que o levou à Sul-Americana), o Coelho voltou para a Série B da forma mais cruel, numa queda livre e desenfreada.