O meia Lucas Paquetá, que atua no West Ham, da Inglaterra, e há um ano convivia com o risco de ser banido do futebol por envolvimento em manipulação de apostas esportivas foi considerado inocente da acusação. O caso ganhou um ponto final nesta quinta-feira (31/7), com a Justiça inglesa. não encontrando provas que comprovassem a denúncia que partiu da própria federação de futebol do país, a FA.
No Brasil, Bruno Henrique, do Flamengo, enfrenta processo semelhante, ainda sem sentença. Outro famoso que teve o nome ligado a suspeitas de manipulação em campo para favorecer apostadores foi o ex-atacante do Botafogo Luiz Henrique, que hoje está no Zenit, da Rússia.
Jogadores menos cotados já foram investigados por aqui – e punidos – por participação nesse tipo de esquema. Geralmente, a coisa funciona assim: eles seguem o combinado de fazer algo durante uma partida que beneficiará algum apostador. Ou vários. Levar um cartão amarelo ou ser expulso, por exemplo. E tem muito dinheiro envolvido nesse mercado.
Houvesse algum elemento ético nessa relação das bets com o futebol, agentes do esporte nunca deveriam estar envolvidos em nada relativo a elas. Porém, em gramados brasileiros, o céu é o limite. Os atletas que, com suas decisões em campo, vão definir quem ganha ou quem perde são até garotos-propaganda de casas de apostas.
Eles são pagos pelos clubes para defender as cores daquela camisa, mas também pelas empresas de jogos de azar (há quem associe as apostas a sorte, mas a definição está muito mais para o lado oposto) para angariar cada vez mais apostadores. É muito evidente o caráter pernicioso dessa relação. Contudo, são poucos os que, nesse meio, parecem se incomodar.
Jogadores e ex-jogadores; jornalistas e influenciadores; clubes de futebol; veículos de comunicação; campeonatos. Estão todos entrelaçados nesse sistema nocivo, criado sob a pretensão de entreter, mas que está adoecendo cada vez mais pessoas. E matando.
Na semana passada, um crime bárbaro veio à tona, em Belo Horizonte. Um filho que assassinou a mãe depois de discussão sobre dívida gerada por gastos em bets. Um caso que, infelizmente, não é isolado. O vício nessas apostas e jogos eletrônicos virou um mal da sociedade contemporânea. Os mais afetados? Estudos apontam uma triste realidade: são as pessoas de baixa renda.
Reportagem veiculada pelo grupo de comunicação alemão Deutsche Welle (DW) coletou dados que mostram que, entre as ligas mais importantes, a brasileira é o que tem mais anúncios de bets e jogos de azar. É um problema mundial, mas que encontrou por aqui terreno fértil para proliferar.
Já reparou na transmissão de uma partida de futebol quantas vezes a palavra bet é visualizada? Está nos comerciais, nas camisas dos times, nas placas de publicidade dos estádios, no troféu das competições. Outro dia, em apenas um jogo do Brasileiro, contei sete marcas diferentes de bets aparecendo ao redor do gramado, nos painéis de propaganda. Uma verdadeira lavagem cerebral.
Levantamento feito pela DW apontou que 70% dos anúncios exibidos à beira do campo na última rodada do Campeonato Brasileiro de 2024 eram de empresas ligadas a apostas ou jogos de azar. O número é 16% maior que o segundo lugar, a Primeira Divisão da Colômbia, e mais que o dobro das principais ligas europeias, como a Série A da Itália e a Premier League, da Inglaterra.
É preciso um regramento para reduzir os danos que já são muitos. Seguir exemplos como a Espanha, que proibiu, em 2021, a exibição de anúncios durante transmissões de eventos esportivos no horário nobre. Lá, os clubes também não podem assinar contratos de patrocínio com essas empresas – hoje, no Brasil, são as bets as maiores fontes de receita dos grandes times.
O assunto é muito sério e precisa ser discutido urgentemente. Sem hipocrisia, sem medo.
Difícil encontrar alguém que nunca tenha se aventurado, uma vez que seja, nesse mundo nefasto. Há quem perceba os riscos e pare a tempo. Há quem precise ser internado em clínica para se recuperar da dependência. E há os casos que terminam em morte.
Em comum, famílias destruídas e muita gente ganhando em cima da tragédia alheia, usando como escudo a falácia “jogue com responsabilidade”.