Algumas pessoas atribuem aos treinadores de futebol parcela mínima do resultado das equipes em campo. Essa ala tem, como tese, que quem decide são os jogadores. Bem, fosse assim não seria necessário técnico. Era só juntar 11 atletas e colocar para enfrentar outros 11. Análises simplistas como essa são perda de tempo. É bem evidente a influência do comandante sobre uma equipe. Para o bem e para o mal. No caso do Atlético, a chegada de Jorge Sampaoli significou um sopro de vida. Técnica, tática, física e emocional.
O que o alvinegro tem demonstrado desde a chegada do argentino se compara a um paciente que estava desacreditado em um hospital, até receber a medicação correta e começar a reagir. Primeiro, voltam os sinais vitais. Pouco a pouco, ele se conscientiza de suas fragilidades e aprende a lidar com elas apoiado pela energia que ainda carrega dentro de si. Até que chega o dia em que é liberado para voltar a viver. Renovado.
Sampaoli foi a adrenalina que o Galo precisava para esse despertar.
Era nítido o estado de (des)ânimo do alvinegro nos últimos meses com Cuca. Pouco – ou quase nada – funcionava. A impressão era de que o time jogava intuitivamente. Como aquele sem treinador que alguns defendem, descrito logo no começo desta coluna. Não havia jogada ensaiada, uma saída de bola coordenada, faltava sintonia entre os jogadores. O Galo vivia de lampejos e da qualidade individual de um ou outro e contava com Everson segurando até pensamento sob as traves.
O pior de tudo era a falta de perspectiva. Não havia indícios de que ia melhorar, de que aquelas peças se encaixariam. O Atlético de Cuca era um quebra-cabeças sempre incompleto.
Meio que a contragosto de alguns e graças ao apoio em massa da torcida (com o perdão do trocadilho), a diretoria trouxe Jorge Sampaoli de volta. Em 2020, quando o argentino fez grande trabalho, plantando a semente do vitorioso 2021, ele não tinha um elemento importante, um vazio que, desta vez, está preenchido. Agora, o treinador tem o calor atleticano a sua volta.
Diante da torcida, ele compreende melhor como pulsa o coração alvinegro. Sente. Foi o que faltou na primeira passagem, em tempos pandêmicos. É visível que há uma simbiose. Sampaoli em campo e o torcedor em torno, literalmente, dele, abraçando o time. Grande parte da torcida se identifica com esse baixinho com cara de marrento que reacendeu a chama – do Atlético e do atleticano.
Sampaoli não agrada a todos porque não é o mister simpatia. Mas, em termos de competência, do que ele já mudou no alvinegro, é difícil contestar. O Galo ainda oscila de um jogo para outro, por vezes dentro de uma mesma partida. É natural, afinal, o treinador não completou ainda nem dois meses de trabalho. Só que é possível ver que há um rumo. Um projeto.
O Atlético joga segundo as orientações de um comando técnico. Até quando coloca o maior astro da companhia, Hulk, no banco. Tudo é pensado em prol do time, não de um jogador. Hulk é o craque da companhia, não deixa de sê-lo por atravessar fase ruim. É o homem-gol, mas concentrar apenas nele toda a responsabilidade de carregar a equipe não é bom para ninguém – menos ainda para o próprio camisa 7.
Para Hulk, é bom que o Galo tenha outras válvulas de escape. Outros definidores. Outros garçons. Que tenha um esquema de jogo que não dependa do atacante ou feito exclusivamente para ele. Mas nem todo mundo está preparado para essa conversa.
É difícil entender a escolha por Rony, até começar a analisar o que é passado a ele. Rony entra em campo com uma função tática bem definida, preenche os espaços, dá o primeiro combate. Poderia haver opção melhor? Sim, inclusive de melhor custo-benefício. Mas essa foi uma escolha feita pela diretoria (e por Cuca) na montagem deste grupo, lá no início do ano.
Está tudo perfeito? Claro que não. Chegar à decisão da Copa Sul-Americana foi consequência do que está sendo construído, não o ponto final. Parece óbvio, mas essa é uma percepção que foge a olhares rasos. Novamente, Sampaoli está plantando uma semente no Atlético. Seria bom se, desta vez, ele tivesse a chance de colher os frutos.