Há pouco mais de uma semana, o goleiro Cássio, do Cruzeiro, deu um depoimento exemplar – muito acima da curva em se tratando de futebol brasileiro. Contrariado com a atuação do trio de arbitragem comandado por Rafael Klein na partida contra o Palmeiras, no Allianz Parque, ele trocou o discurso egocêntrico que costuma permear os personagens da bola por uma chamada ao coletivo. Sem esbravejar, sem acusar A ou B, com a maior inteligência e elegância, Cássio deu uma aula. Pena que muita gente não prestou atenção ou não entendeu, inclusive dentro do próprio clube.
“Nós temos que nos unir. CBF, jogadores…”, disse o goleiro celeste. “Temos que nos juntar para melhorar isso, porque eu vejo que muita gente não está se importando com o futebol. Eu já reclamei da arbitragem em certos momentos. O futebol tem que parar com isso e ter união, ver o que pode ser melhorado para ajudar os árbitros, porque eles são seres humanos como a gente”, completou.
Depois, ele dividiu uma experiência pessoal que ajuda a compreender o posicionamento que adotou naquela ocasião: “Eu já sofri com depressão, com pressão, então, eu sei como é ruim. Imagina um árbitro, a cobrança que não é, quando ele erra”.
Por fim, Cássio sugeriu uma postura mais efetiva de quem está no futebol, que saia do “blá-blá-blá”: “Eu falo pelo bem do futebol. O Brasileiro tem que estar entre os melhores campeonatos mundiais, e a arbitragem é muito importante para isso. A gente tem que pensar em conjunto para ver o que pode melhorar e não ficar toda hora: ‘Ah, porque ele errou aqui, ele errou aqui’. Eu falo novamente, eu também já reclamei em certos momentos, mas se não vamos melhorar em conjunto, a gente vai acabar piorando”.
Foi uma das mais lúcidas manifestações no futebol brasileiro em todos os tempos em relação aos problemas que cercam a arbitragem. Cássio expôs um ponto de vista racional, mas que não se encerra no pragmatismo. Em vez de apontar o dedo, ele se colocou no jogo. Entendeu que atletas, dirigentes, entidades e até jornalistas têm responsabilidade sobre a qualidade da arbitragem no Brasil. São cúmplices e deveriam se atentar a isso.
O que o goleiro enfatizou é que nada adianta, a cada fim de jogo, um desses atores do esporte desabafar, criticar, listar erros de arbitragem contra si – algumas vezes sem o conhecimento das regras, apenas se baseando no achismo ou na bronca dos torcedores.
Essa é a maneira mais vazia e ineficaz de tratar o problema. Puramente midiática, sem nenhum efeito prático. No máximo, serve como uma terapia aberta ao público.
Quando o Cruzeiro apresenta, com mais de três meses de antecedência, o pedido para árbitro de fora nos clássicos contra o Atlético pelo Campeonato Mineiro de 2026, nota-se que a mensagem de Cássio não encontra eco nem no clube em que ele trabalha.
Ações isoladas como essa são inócuas. Mera falácia. É como se o clube já buscasse uma justificativa antecipada para seu torcedor e lavasse as mãos. Cássio cobrou união, e o Cruzeiro respondeu com individualismo.
Questões arraigadas, como as que ocorrem com a arbitragem brasileira há anos, não se resolvem com atitudes simplistas. Só uma mobilização coletiva vai gerar resultados.
Enquanto não forem buscadas saídas concretas, que tenham objetivo de melhorar a arbitragem para todos, sem interesses egoístas ou imediatos, Cássio estará sozinho nessa luta.