TIRO LIVRE

O que se vai com Antero Greco, Silvio Luiz e Apolinho

Com a morte dos três se vai também um pouquinho um tipo de jornalismo esportivo que se recolhe na nostalgia de um passado bom

Impossível a quem gosta de esporte e cresceu (ou viveu, já adulto) nos anos 1980 e 1990 não carregar a voz de Silvio Luiz na memória afetiva. Os bordões que ele criou extrapolam gerações, mas tocam diferente em quem os ouviu ao vivo, durante a narração de um jogo. Assim como quem acompanha a ESPN desde os primórdios e se acostumou ao jeito doce e inteligente de Antero Greco comentar – sem contar os ataques de riso ao lado do grande parceiro Paulo Soares, o ‘Amigão’. Há uma turma, essa um pouco mais vivida e apaixonada por rádio, que seguiu de perto Apolinho em suas transmissões esportivas.

Com a morte dos três se vai também um pouquinho um tipo de jornalismo esportivo que, a cada novo aplicativo, a cada nova plataforma, se recolhe na nostalgia de um passado bom.

Silvio Luiz foi parte importante da programação da TV Bandeirantes, com o Show do Esporte aos domingos. Tudo o que acontecia ali ajudou a forjar muitos cronistas esportivos, entre eles a jornalista que lhes escreve. Simone Mello e Elys Marina incentivaram, ainda que sem ter ideia disso, mulheres a entrar na área, numa época ainda mais machista e masculina.

Sob o comando de Luciano do Valle, eram transmitidas as competições pensadas e impensadas. São espectadores para quem nomes como o de Rui Chapéu fazem sentido. O campeonato de sinuca era uma pequena parte do vasto mundo esportivo que se abria, em apenas um canal de TV, muitas vezes no único aparelho de televisão da casa de cada família.

Tinha campeonato italiano com comentários de Sílvio Lancellotti, jogo da Seleção Brasileira de masters (com Rivelino, Gérson, Edu e Serginho Chulapa em campo, entre outros), partidas de NBA, vôlei e tênis, Fórmula Indy… O que hoje se espalha por dezenas de canais de TV a cabo e outra infinidade na internet estava reunido em um só lugar. E reunia famílias e amigos, nas alegrias das vitórias e na indignação pós-derrotas.

Cenário bem diferente do atual, em que, com o celular em mãos, cada qual mergulha em seu universo e, quando quer fazer algum comentário, em vez de olhar para o lado, faz uma postagem em rede social. Tão abrangente quanto solitário.

Com a morte de Silvio Luiz se vai um pouco mais dessa forma de ver esporte. Que trazia aconchego.

A morte de Antero Greco

Já Antero Greco leva consigo um outro tipo de jornalismo, de brilhar os olhos de quem gosta de um português bem pensado, falado e escrito. De explicações claras e elegantes sobre uma partida ou um contexto esportivo – estilo cada vez mais raro, perdido na busca ferrenha por “cliques e likes”.

Antero era dono de inteligência e bom humor tão singulares e refinados que explicava o futebol da forma mais singela. Mesmo nos momentos de crítica, usava sabiamente as palavras, sem subir o tom de voz, sem exaltações burlescas.

Muito na contramão do que ganha cada vez mais popularidade por aí: transmissões de jogos baseados em piadas e gritos; comentário ora rasos, embasados tão somente pelo olhar de torcedor; ora prolixos demais, amparado por pretensos modernos olhares que explicam o futebol a partir do “jogo posicional e do funcional, das linhas baixas ou do bloco médio”.

Silvio Luiz, Antero e Apolinho são parte de uma história escrita por estórias que não mais se repetirão. Por muitos fatores. O mundo de hoje deixa cada vez menos espaço para isso. Tudo tem seu lado bom e o ruim. Mas num dia como esse, com perdas que tanto aguçam a memória, é difícil não se render a uma certa melancolia e imaginar que o bom vai perdendo um pouco mais essa luta.

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