COLUNA TIRO LIVRE

O cruzeirense queria o direito de sonhar

A dobradinha com a torcida vai embalar a nova gestão do Cruzeiro: os torcedores querem reforços, e a diretoria fala em contratar

Futebol é alimentado por paixão. E dinheiro, muito dinheiro. Ao torcedor (até que o caldo entorne), agrada o cartola que contrata. Investe. Coloca dinheiro. Na esteira das contratações de renome vem maior visibilidade e, por vezes, bons resultados e títulos. A qual preço? Não importa. Brigar por taças está no topo da lista de desejos. E quem promete isso cai naturalmente nas graças de qualquer torcida.

O início da gestão de Pedro Lourenço no Cruzeiro segue a cartilha. O novo dono da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) celeste chegou dizendo o que os cruzeirenses queriam ouvir. Foi além do discurso: chegou agindo. Contratando. Não qualquer um. Trouxe um dos maiores ídolos do Corinthians nos últimos tempos: o goleiro Cássio. E já avisou que não vai parar por aí.

Pedrinho, como é chamado, foi direto no orgulho celeste. Para tanto, bastou dar vazão ao modo preferido de trabalho de Alexandre Mattos, a quem entregou a chefia do departamento de futebol. Em todos os clubes pelos quais passou, Mattos se notabilizou pela postura agressiva no mercado da bola. Arrojado, sem essa de contenção de despesas. A aposta é na contratação por atacado.

A estratégia não se baseia apenas em quantidade, importante destacar. A busca também é por jogadores de renome, para mexer com a torcida e mandar um recado claro aos adversários: mostrar que o Cruzeiro mudou de rota. A meta, agora, inclui alçar voos altos para reconquistar lugar no cenário nacional. Em resumo, viver o agora. Projeto com retorno imediato, nada de preocupações a longo prazo.

O efeito já é sentido, com a empolgação de muitos cruzeirenses com a contratação de Cássio e um resgate até de autoestima. As declarações de Edu Dracena, diretor técnico da Raposa – de que, com Pedrinho, a filosofia do clube mudou e a ordem é contratar –, serviram de combustível para aumentar o fogo. Jogou a expectativa lá no alto.

Já está claro que a dobradinha com a torcida vai embalar a nova gestão: o torcedor quer reforços, e os dirigentes falam em contratar. Nomes surgem em listas: Gabigol está às turras com o Flamengo? Hora de ir atrás dele. Rony já deixou escapar incômodo pela reserva no Palmeiras? Momento de fazer uma proposta.

No período de apenas 25 dias (desde que Pedrinho assumiu oficialmente a SAF do Cruzeiro), falou-se também em Yerry Mina, Thiago Mendes, Philippe Coutinho, Keno, Júnior Santos, Cuellar… Nessa toada, daqui a pouco completa-se um time inteiro de reforços, e não será espanto se o comando sair das mãos do jovem Fernando Seabra e for parar com um treinador medalhão…

A racionalidade de Ronaldo

O sentido é diametralmente oposto ao que Ronaldo Fenômeno entendia ser a forma mais adequada de gerir a SAF do clube. O olhar dele era de empresário, desprendido de qualquer passionalidade. Estava determinado a tocar um planejamento baseado num balanço contábil equilibrado. Ao pegar o Cruzeiro numa fase de pré-extinção, nunca determinou metas ousadas ou jogou confete para a torcida.

Pelo contrário: o discurso (e a ação) de Ronaldo foi sempre o de pés no chão. Jogar luz sobre a situação, por mais que não fosse o cenário sonhado pela torcida. Um realismo extremo, distante das fantasias – que agradam muito mais. O meio do futebol brasileiro não costuma gostar muito, nem aprovar a racionalidade. Soa incompatível.

Já Pedrinho joga com o sonho. Era isso o que o cruzeirense queria, depois de tanto sofrimento: o direito de sonhar. Nessa equação, não cabe se ocupar com as consequências. Se der errado, isso é problema para mais pra frente.

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