Fosse Fernando Seabra um medalhão, daqueles que estão há muitos anos no cenário do futebol brasileiro e com idas e vindas por diversos clubes do país, não estaria ele entre os treinadores mais comentados do país? Decerto, o que tem feito na Toca da Raposa já o credencia para tal. Mas como o técnico do Cruzeiro ainda não é figurinha carimbada, talvez o bom trabalho não esteja recebendo o reconhecimento devido – dentro e fora de casa.
Sob o comando de Seabra desde o início de abril, a Raposa contabiliza 11 vitórias, quatro empates e cinco derrotas – 61,7% de aproveitamento. Não é exagero dizer que a campanha celeste neste início de Campeonato Brasileiro supera as expectativas de muitos analistas. A equipe soma 26 pontos em 15 jogos.
Na Copa Sul-Americana, também faz bom papel. O Cruzeiro terminou como líder do Grupo B e, dessa forma, garantiu vaga direta nas oitavas de final. O adversário nessa fase ainda não foi definido: sairá do vencedor do confronto Independiente del Valle x Boca Juniors, que vão se enfrentar em 17 e 24 deste mês.
A análise sobre o trabalho de Seabra precisa passar, sobretudo, pelo contexto. Observar bem como ele pegou o time, e como o Cruzeiro chegou até aqui. É certo que tudo o que tem alcançado tem sido com um grupo muito mais modesto do que aquele de grande potencial que está sendo construído pós-chegada de Pedro Lourenço ao comando da SAF celeste.
O que o Cruzeiro era quando Seabra foi (re) contratado já é bem diferente do que ele é hoje. E ainda mais distante do que a equipe celeste pode vir a ser, com as novas contratações. Ou, o que tem gerado de expectativa, pelo grupo que está formando. Esse link entre passado, presente e futuro é fundamental para conferir méritos ao técnico.
O time tinha questões problemáticas em praticamente todos os setores quando ele assumiu. Ainda assim, nessa caminhada, houve partidas em que, mesmo com uma formação longe do ideal, a Raposa conseguiu atuar bem. Até em derrotas (como nos 2 a o para o São Paulo) chegou a ser elogiada pelos momentos de lucidez em campo.
Mas o treinador também foi cobrado mais de uma vez por suas escolhas. O momento mais crítico foi na sequência de duas derrotas, para Flamengo (2 a 1) e Criciúma (1 a 0). Especialmente depois da partida contra os catarinenses, muitos torcedores ficaram de bronca pela escalação de Palacios e Lucas Silva.
Teve até quem dissesse que o Cruzeiro estava declínio, e a mira de muitos se voltou para o treinador. Mas logo depois vieram os triunfos sobre Corinthians (3 a 0) e Grêmio (2 a 0) e, com eles, a recuperação de posições na classificação e da credibilidade. A paz voltou a reinar.
Seabra no Cruzeiro
Não é possível avaliar um trabalho apenas jogo por jogo. Até porque oscilações são normais, sendo influenciadas por diversos fatores. A análise mais justa e fiel à realidade, além de despida de elementos passionais, é obtida ao olhar a floresta inteira – em vez de árvores isoladas. Isso vale tanto para as virtudes quanto para os defeitos. No balanço de vitórias e derrotas.
Seabra desponta como um bom nome da nova geração. Claro que isso não é garantia de que alcançará o topo entre os treinadores, nem que empilhará títulos. Contudo, por ter conseguido tais ajustes no time dentro de um cenário de muita dificuldade e, sobretudo, antes mesmo dos reforços, ele tem muitos méritos.
A experiência como interino em duas oportunidades no clube, no ano passado, deve ter ajudado. Em setembro, Seabra ocupou temporariamente o cargo após a saída do português Pepa. Voltou a ser convocado pelos dirigentes celestes quando Zé Ricardo foi demitido, a seis jogos do fim da Série A. Quem estava na linha de frente era Paulo Autuori (representante da categoria medalhão), porém, quem treinava a equipe e ficava à beira do campo, passando instruções para os jogadores, era Seabra.
Foi uma espécie de estágio. Ali ele viu, na prática, o que era estar no comando de um clube da Primeira Divisão. Ao voltar neste ano, desta vez como efetivo, não tinha mais sombra, nem escudo. E tem mostrado competência.