Há uma semana, a torcida do Cruzeiro estava em êxtase. Aquela sexta-feira amanhecera celeste, com o cruzeirense desfrutando do triunfo sobre o Boca Juniors, no Mineirão. Foi mais que um jogo de futebol. Um duelo com contornos épicos, daqueles que serão para sempre lembrados. No peito, na raça e no grito da torcida. Por isso, além da classificação para as quartas de final da Copa Sul-Americana, rendeu uma injeção de ânimo – alívio, confiança e felicidade – na alma do torcedor da Raposa. A sensação de voltar a se sentir vencedor. De ser reconhecido. De impor respeito.
“O Cruzeiro voltou” era o que mais se ouvia, de torcedores a analistas esportivos. A estima de se ver e ser visto como um clube de expressão internacional. Como se, a partir dali, todas as agruras do passado recente estivessem, definitivamente, enterradas. O cruzeirense estava transpondo uma espécie de portal. Cicatrizes fechadas.
Uma nova história sendo (re)escrita. Aquele Cruzeiro, das páginas heroicas imortais, finalmente, resgatado. Aparentemente, tudo começava a engrenar.
Isso foi há apenas sete dias. Os dois jogos contra o Internacional, no entanto, mudaram totalmente o panorama. Uma derrota no Beira-Rio (1 a 0) e um empate (0 a 0) no Mineirão fizeram, num espaço de pouco mais de 72 horas, estrago de meses.
Corta para esta sexta-feira (30/8). O céu não parece mais tão azul. O coração celeste não está mais tão leve. Um cenário (exagerado) de crise começa a se desenhar.
Críticas chegam de todo lado: os jogadores, outrora elogiados, não passam mais tanta confiança. O treinador (o mesmo que trouxe o time nessa caminhada de reconstrução) deixou o campo xingado e para muitos está na bica de ser demitido. Até já começaram a elencar possíveis candidatos, e a lista de quem palpita e/ou especula foi de Fernando Diniz a Jorge Sampaoli.
A atuação do clube na última janela de transferências, antes considerada uma das melhores do Brasil, começa a ser questionada. ‘Faltou lateral’, pontuou um. Outro retrucou: ‘Tinha de ter trazido outro atacante, Kaio Jorge não dá’.
Reforço mais caro, custando quase R$ 41 milhões ao caixa do Cruzeiro, Kaio Jorge perdeu um pênalti no último confronto e já tem quem ache que não vai dar certo na Toca. Detalhe: está treinando com o grupo há somente dois meses. Para piorar, depois da partida contra o Inter, ainda viu família e amigos irem parar na delegacia do Mineirão por causa de confusão com torcedores.
Como se ainda fosse pouco, no dia do aniversário de 30 anos, o argentino Juan Dinenno, apontado por muitos como a principal esperança de gols do time, foi informado de que terá de operar o joelho direito. É a quarta lesão do jogador desde que chegou ao Cruzeiro, em janeiro deste ano.
Em abril, ele foi diagnosticado com edema muscular na coxa esquerda e fratura nos ossos do nariz. No fim de maio, precisou passar por cirurgia no púbis e ficou mais tempo longe dos gramados. A previsão atual é de retorno apenas em abril.
Inferno astral do Cruzeiro
Fosse no mês anterior à data de fundação, essa virada de maré poderia ser atribuída ao “inferno astral”, aquele período de má sorte que antecede o aniversário. Mas ainda falta muito tempo para isso, já que o do Cruzeiro é em 2 de janeiro.
Para quem é esotérico, outra explicação poderia estar no mercúrio retrógrado, uma conjunção desfavorável dos astros, que empaca a vida de muitos terráqueos, segundo consta. Ele teve seu fim justamente nessa quarta-feira. Mas já vigorava no dia do triunfo sobre o Boca, então, não dá para culpá-lo.
Tem uma justificativa mais racional. A ressaca pós-vitória sobre o Boca, nas condições que aquela partida exigiu dos jogadores celestes, mais um relaxamento natural e também a boa qualidade do time do Internacional poderiam, sim, resultar na derrota no Sul e no empate em BH.
Contudo, é um argumento desprovido de passionalidade, que não combina muito com quem quer enxergar o futebol apenas sobre a ótica do 8 ou 80. Ou está tudo uma maravilha, ou está tudo péssimo. Para essa turma, é difícil entender que é raríssimo uma equipe descrever trajetória linear. Seria um mundo perfeito, porém, não é a realidade. Sinto avisá-los.