
Há pouco mais de um ano, o Cruzeiro passou por mudança importante na gestão da Sociedade Anônima de Futebol (SAF). Em abril de 2024, o ex-jogador Ronaldo Fenômeno vendeu 90% das ações ao empresário Pedro Lourenço, torcedor declarado do clube. O movimento, é claro, impactou o futebol feminino. Em entrevista exclusiva ao No Ataque, Bárbara Fonseca, diretora da modalidade, explicou o efeito das gestões para as Cabulosas.
Os primeiros anos de Cabulosas
Bárbara Fonseca trata os dois dirigentes como cruciais para o desenvolvimento do futebol feminino do Cruzeiro. Enquanto Ronaldo solidificou o trabalho e ‘derrubou muros’, Pedro Lourenço abriu o bolso para investir, conta Bárbara.
“A diferença de um dono e outro foi exatamente encurtar o tempo para investir o que o futebol feminino merecia e precisava”, destaca a dirigente.
O projeto se iniciou em 2019, ano em que a Confederação Brasileira de Futebol determinou que clubes da Série A do Campeonato Brasileiro tivessem equipes femininas. Na primeira temporada, o Cruzeiro se sagrou vice-campeão da Série A2 e subiu para a elite – ali, Wagner Pires de Sá era o presidente.
Em 2020, a Raposa encerrou a participação no Brasileiro em 10º lugar – Sérgio Santos Rodrigues assumiu a presidência. O advogado permaneceu no cargo até 2021, quando Ronaldo adquiriu as ações da SAF. Naquele ano, as Cabulosas ficaram na 11ª colocação.
Gestão de Ronaldo para o feminino do Cruzeiro
“Os primeiros anos da SAF foram ainda de baixo recurso, mas é nítido que a SAF seria mais organizada e tinha caixa para investir mais no futebol feminino. Era questão de tempo e equalizar crises que havia: ideológica, administrativa e, principalmente, financeira. Era entender que era momento de organizar. O Cruzeiro precisou fazer muitos cortes, traçar novas rotas, não foi fácil, mas, no coração, a gente tinha ideia de que chegaria ao patamar que alcançamos”, analisou Bárbara Fonseca.
No ano seguinte à posse de Ronaldo, o Cruzeiro assumiu a responsabilidade de se dedicar mais à modalidade. Bárbara atuava como coordenadora desde 2019, e, em 2021, ganhou a companhia de Kin Saito, diretora até setembro de 2024.
Segundo a dirigente, a gestão implementou a cultura do futebol feminino dentro do Cruzeiro, ainda que com valores limitados.
“O Ronaldo chega, organiza, derruba muros, porque existia dentro do Cruzeiro uma ideia de que precisava entregar pouco e que com esse pouco o futebol feminino se virava. A gente começa então a entrar em espaços que antes não entrava, uma realidade interna. Ele ajudou muito nesse contexto da cultura – ao lado do investimento, era o viés que a gente mais precisava para, de fato, desenvolver e colocar o Cruzeiro feminino competitivo ao nível nacional. Mas, com o Ronaldo, a gente sabia que o apetite financeiro era muito dosado. Era de freio mesmo”
Bárbara Fonseca, diretora de futebol feminino do Cruzeiro
Ascensão cuidadosa do Cruzeiro feminino
Em campo, as Cabulosas evoluíram pouco a pouco. Em 2022, o Cruzeiro, treinado por Felipe Teixeira, encerrou a participação na fase classificatória da Série A1 do Brasileiro em 12º lugar, a primeira posição fora da zona de rebaixamento – a meta daquele ano era justamente a permanência.
Posteriormente, em 2023, as Cabulosas alcançaram o oitavo lugar e avançaram ao mata-mata pela primeira vez na história. Nas quartas de final, enfrentaram o Corinthians e ficaram pelo caminho: derrota por 2 a 1 no primeiro jogo, e por 4 a 2 na volta.
No fim de 2023, o Cruzeiro contratou o técnico Jonas Urias, que segue no comando. O ano de 2024 foi de mais evolução em campo. Além de ter chegado à final da Supercopa (derrota para o Corinthians), terminou a fase classificatória do Brasileiro em quinto lugar – até então, a melhor campanha do time na competição.
Nas quartas de final, entretanto, o Palmeiras levou a melhor: triunfou na ida por 2 a 1 e ficou com a vaga na semifinais com o empate por 2 a 2 na volta.
Gestão de Pedrinho para o feminino do Cruzeiro
A temporada foi marcada por mudanças. Pedro Lourenço adquiriu as ações de Ronaldo e alterou peças da gestão. Pouco tempo depois, Kin Saito decidiu deixar o clube, e Bárbara Fonseca assumiu como diretora.
Naquele momento, havia o receio de que a modalidade enfrentasse instabilidades, já que Pedrinho tinha dito que a intenção era manter um time razoável e não fazer grandes investimentos. Na prática, não foi o que ocorreu.
“Fiquei com o coração muito tranquilo porque sabia os movimentos internos que estavam acontecendo. Como vou aceitar a imprensa dizer que o Pedrinho ia sucatear o futebol feminino se a gente estava fazendo contrato com atletas de quatro anos, que nunca tinha sido feitos no Cruzeiro? Tranquilidade, mas sabendo que tinha uma ponta solta, interna, que precisávamos resolver”, ressaltou Bárbara Fonseca.
Aumento de mais de 800% no investimento
Segundo a dirigente, Pedro Lourenço logo acatou os planos e abriu o bolso para elevar o patamar das Cabulosas. Se em 2019 o Cruzeiro investia quase R$ 2 milhões na equipe feminina, hoje o valor alcança R$ 15 milhões e pode ser superado ainda no segundo semestre deste ano.
No início desta temporada, a Raposa, mais agressiva no mercado, apresentou 13 contratações e renovou 15 vínculos.
“O Pedrinho é apaixonado. Mesmo antes, quando era só patrocinador, ele percebia que o problema era investimento. Várias vezes, nos anos de crise do Cruzeiro, o meu salário foi pago por ele, os salários do futebol feminino eram bancados por ele. Ele faz jus ao que sempre fez mesmo estando de fora. Confiou, sabia que o trabalho no departamento de futebol feminino era feito com muita responsabilidade, nos deu autonomia e nos deu grana”
Bárbara Fonseca, diretora de futebol feminino do Cruzeiro
Cruzeiro na temporada
O apoio financeiro deu resultado. Em 2025, o Cruzeiro exibiu regularidade na primeira fase do Brasileiro e avançou ao mata-mata como líder, com 36 pontos, 11 vitórias, três empates e apenas uma derrota – a melhor campanha da equipe. Nas quartas de final, previstas para agosto, as Cabulosas enfrentarão o Bragantino, oitavo colocado, com 20 pontos.
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ainda vai anunciar dia, horário e locais dos confrontos. Como apurado pelo No Ataque, a Raposa planeja atuar no Mineirão ou no Independência, ambos em Belo Horizonte.
O Cruzeiro ainda tem pela frente a Copa do Brasil (entrará na terceira fase, assim como os outros times da elite, e conhecerá o rival por meio de sorteio da CBF) e o Campeonato Mineiro – ainda sem detalhamentos.