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América: Salum detalha planos da SAF, orçamento e objetivo até o fim do mandato

Em entrevista exclusiva ao No Ataque, Salum passou a limpo questões que envolvem negociação da SAF e detalhou planos para 2024
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Presidente da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do América, Marcus Salum é um veterano no futebol – são quase 40 anos de envolvimento e dedicação ao clube. No fim de 2024, o mandato se encerra. Até lá, o dirigente deseja concluir alguns objetivos – o principal deles é a venda da SAF. Em entrevista exclusiva ao No Ataque, o dirigente passou a limpo questões que envolvem a negociação e detalhou planos para a temporada, visando ao retorno do Coelho à Série A do Campeonato Brasileiro.

É notável a influência de Salum no América. Ainda que o departamento de futebol conte com outros nomes, como o diretor de futebol, Fred Cascardo, e Euler Araújo, integrante do Conselho de Administração do clube, as principais decisões estão nas mãos do presidente. Das intermediações de negócios até mesmo a palavras de incentivo no vestiário.

Em 2024, Salum precisou ‘recalcular a rota’ – afinal, o América voltou à Série B depois de três anos. À reportagem, o mandatário avaliou bem o trabalho inicial na Segunda Divisão e também explicou como o clube irá contornar possíveis prejuízos.

Além disso, o dirigente detalhou o orçamento e os planos para este ano. Salum relembrou as negociações pelo atacante Gonzalo Mastriani e pelo meio-campista Martínez, que movimentaram o mercado da bola no início da temporada, e também a polêmica saída de Alexandre Mattos ao Cruzeiro.

Por fim, o dirigente explicou os planos da SAF. Ao No Ataque, Salum destrinchou o que o clube pretende com a negociação e quais são as exigências para que a venda se concretize o mais breve possível.

Leia a entrevista completa ou assista no player abaixo:

No Ataque com Marcus Salum, presidente da SAF do América

O que a diretoria vê como fatores principais para cumprir o principal objetivo de 2024, que é o retorno à Série A?

O América teve, depois de três anos de muito sucesso, essa queda para a Segunda Divisão. Como torcedor e como dirigente, era uma coisa que a gente não esperava, muito difícil de assimilar. Mas a gente não vive ganhando todas as guerras, algumas você perde. Essa nós sentimos muito, mas temos a convicção que o América na Série B, é um clube grande, é um dos maiores. E que tem como obrigação lutar para subir.

Nós desvirtuamos um pouco a nossa essência ano passado, com as contratações, por tudo o que aconteceu, (e este ano) de ter um grupo mais coeso, mais unido, com muitos atletas em formação, foi muito bem planejado. Avaliamos muito e temos todos os ingredientes que sempre tivemos para fazer a volta à Primeira Divisão. Se nós voltaremos, só o trabalho e o tempo vão dizer, mas nós temos as condições para isso.

O que significaria, para o América, uma eventual permanência na Série B?

Por exemplo, nós projetamos uma Copa do Brasil este ano muito melhor do que ela foi. Esse foi um baque que nós sofremos, naquela derrota no último minuto, naquele jogo em que nós colocaram no meio da torcida, em um calor louco, com um juiz péssimo, perdemos. Tudo o que você planeja tem que ter o plano A e B. Você não pode jogar todas suas fichas. ‘Se eu não subir estou ferrado’, não é assim, a Série B não é o fim do mundo.

O América tem estrutura se não subir. Eu não coloco a permanência no meu plano, mas é um risco calculado. A Série B este ano está dificílima. Nós fizemos 15 pontos e estamos em segundo lugar, 15 pontos em 21 é ponto para caramba na Série B. Nós não sabemos se vamos subir, é um sonho, um projeto, mas não é o fim do mundo.

A Série B vai ser vendida a partir de 2025, aumentará as receitas, tudo isso vai acontecer, e é um campeonato que, se você pegar no mundo inteiro, grandes clubes disputam a Série B, não é o fim do mundo. Não vou dizer que esse é o maior problema da história do América. A SAF pode acontecer, entrar um cara na Série B, investir mais. Não gostaria de fechar meu período da SAF sem subir, mas se acontecer é mais uma coisa que eu vou ter que aprender. 

O América começou a Série B muito bem – está no G4, conforme o planejado, e tem demonstrado evolução em campo. Como a diretoria avalia o trabalho do técnico Cauan de Almeida, que assumiu pela primeira vez o profissional, até aqui?

Tecnicamente, que o América voltou, né? O América teve um período da era Mancini, Marquinhos Santos, que o jeito de jogar era diferente que o projeto que nós fizemos em 2020, na época do Lisca. Como voltamos para a Série B, que exige um jogo de mais posse, o estilo do Cauan fortalece muito isso. O América tem o domínio da bola, o domínio do jogo. Nós temos alguns problemas para serem resolvidos, mas o potencial do Cauan, nós conhecemos.

Tudo o que aconteceu é porque o Cauan queria alçar um voo maior e ele ganhou certa experiência. E nós achamos que esse era o melhor momento para dar essa oportunidade. O desempenho está muito dentro do que eu esperava, trabalho sério, organizado, com comando. Começar a Série B bem é importante, mas a Série B não é a arrancada, a Série B é um trabalho que tem que ter regularidade e força, para que possa vencer as dificuldades. E temos experiência com isso. Talvez a pessoa que já viveu mais subidas fui eu – da C para a B, B para a A, tenho sete acessos. Então sei a dificuldade que é o campeonato. Vai ter sofrimento, tem jogos difíceis, alguns momentos que vai balançar, tem que ter tranquilidade para chegar lá.

Com a queda para a Série B, o América deixará de arrecadar algumas receitas que eram garantia na Série A (cotas de televisão e premiação). Qual é o planejamento para contornar essa perda?

Isso faz parte da vida do América. Vocês chegaram aqui e antes estava meu CEO financeiro (Dower Araújo) com todo o fluxo de caixa do ano. Eu estudo, de onde vai arrumar dinheiro, a gente sabe. É um ano caminhando para um déficit, porque perdemos receita, mas também reduzimos despesas. Estamos mantendo investimentos, construção do CT, sabemos administrar isso e sabemos que não é fácil, mas isso não nos assusta.

Qual é o orçamento do América para este ano?

Temos muitas variáveis de orçamento. De cabeça, não sei, porque perdi essa reunião com os números, mas é perto de R$ 80 milhões ou R$ 90 milhões de receita. É até um absurdo eu não saber de cabeça, mas estou mais preocupado em controlar a folha, saber o que tem para pagar. 

Torcida do América no Independência

Dentro do plano para 2024, estava a captação de torcedores. Incentivar o torcedor do América a ir ao estádio, aumentar esse número, principalmente entre os jovens. Existe algum plano estratégico para alcançar essa meta?

Essa é uma luta que eu faço há anos. Nós tivemos bons momentos e maus momentos. Hoje, temos um público frequente abaixo do público médio que eu convivi durante anos, que era de 2 a 3 mil torcedores em qualquer jogo do América. Hoje, às vezes é 1.800, 2.500 torcedores. Temos uma vantagem. O público que vai a campo hoje é muito mais jovem do que aquele que ia há alguns anos.

O América trabalhou muito nesses últimos anos para o sócio-torcedor, o que vem dando resultado. Focamos nas nossas escolinhas, também vêm dando resultado. Nosso alunos, se quiser, tem direito a uma carteira para frequentar os jogos. Tem desconto na loja. Todos esses projetos que a nossa equipe está fazendo estão andando.

Realmente, tivemos a eleição da presidência do conselho, entrou o Zé Flávio com o Paulo Lasmar, americanos ilustres. Que querem também aprofundar nesse movimento. Ainda não temos o ponto de solução, tem hora que temos bons momentos e outro maus. A maior regra é ganhar. O que aumenta o torcedor é ganhar. Infelizmente, em Minas Gerais, somos muito espremidos, porque é muito torcedor de Atlético e de Cruzeiro, mas estou satisfeito com a nossa torcida.

Estava crescendo, mas no campo ainda não. Mas confesso que esse assunto não está no meu planejamento, porque tem tanto problema pra resolver, tem equipe para trabalhar nisso. E esse é um assunto iminente no América. Os conselhos vêm com propostas e comissões para propostas novas, mas não é um trabalho rápido, é de formiguinha.

Uma coisa que nós não podemos deixar é que não quero dissociação entre time e a torcida. A torcida tem direito de criticar e o jogador tem que saber que isso vai acontecer. A nossa torcida é o nosso patrimônio. Já tivemos um bom resultado, porque no fim do jogo contra o Guarani, eles (jogadores) foram ficar com a torcida.

No balanço de 2023, divulgado recentemente, o América aumentou consideravelmente a receita com a venda de jogadores. Foi detalhado que ainda faltava quantia a ser recebida pelo Vitor Roque e outros atletas. Quem são esses outros e quais valores estão pendentes?

Com relação ao Vitor Roque, é uma operação que temos vinculada ao Athletico-PR. No início do ano, houve uma antecipação desses valores, negociado com fundos, com algum juros. Tudo o que o Athletico-PR fez, nós autorizamos, e eles repassaram para a gente. Do Vitor Roque, já na data de hoje, nós só teremos os bônus, caso ele desempenhe – e espero que desempenhe, mesmo com esse momento ruim dele, sei que ele tem potencial para desempenhar.

O que temos para receber este ano são as parcelas do Mastriani, que já tem uma e vai pagar a outra, tem a do Martinez, que vence no meio do ano. Temos algum recurso ainda do Richarlison. O que está ‘pegando’ nos recebimentos é o Botafogo, que tem que nos pagar 800 mil dólares (R$ 4,1 milhões) do Carlos Alberto. Pagou 200 mil dólares (R$ 1 milhão) e está devendo. Mas a regra do jogo é: não paga, denuncia a Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) e vamos seguir em frente. Talvez, dos recebimentos que tenhamos, o único que está pendente é este, que está em atraso. O resto está dentro do plano.

Fico muito orgulhoso do que aconteceu ano passado, porque um dos meus projetos pessoais era vender um jogador diretamente para o exterior. O que aconteceu com o Arthur. O América não tinha 100% do Arthur, tinha um percentual bom, mas queriam que eu vendesse por 3 ou 4 milhões de euros, mas enquanto não chegou em 7 milhões (R$ 37 milhões, na época) eu não vendi. E foi no braço. E o América não vai receber isso tudo, porque não tínhamos o percentual todo, tínhamos 60%. Isso me deixou muito feliz, porque temos muitos jogadores com o mesmo potencial e sei que vamos fazer receita.

Não adianta. O América vive da receita de formação de vendas. O futebol, para sustentar em alto nível, tem que vender. Todos os grandes clubes que têm balanço de R$ 800 e 900 milhões vendem. Futebol é muito caro, e você não equilibra essas receitas com outra coisa. Esse é um que vai continuar no América. Não pode parar a fábrica, porque se vende, não repõe. Estamos em obra no CT, mesmo sem ter investidor, estamos restaurando a base no CT, porque é dali que sai o nosso maior ativo. 

Vitor Roque pelo Barcelona em jogo de La Liga - (foto: LLUIS GENE/AFP)
Vitor Roque pelo Barcelona em jogo de La Liga(foto: LLUIS GENE/AFP)

O América já acionou o CNRD por causa do atraso do Botafogo pelo Carlos Alberto?

Ainda não. É um processo normal. Venceu, comunica o Botafogo, tenta receber, somos parceiros. Se não pagar, aciona. E assim mesmo, tem uma parcela em atraso. Mas como você perguntou separadamente, o América é muito transparente e eu gosto de falar as verdades.

Recentemente o América fez grandes vendas de atletas, como a venda do Arthur ao Bayer Leverkusen, o Breno ao Shabab Al-Ahli. Tem algum outro jogador que vocês enxergam que pode gerar uma possível grande receita para o clube futuramente? 

Internamente, tem. Mas isso a gente não fala externamente. E nem estamos preocupados em vender. Estamos preocupados em desempenhar. A venda é um processo natural depois que o jogador desempenha. Você pega um jogador igual ao Adyson, que está começando a ganhar posição. Se ele desempenha bem, vai para o mercado. A regra do futebol é essa. O cara não compra o reserva, quer comprar o titular.

E tem que dar tempo, não é porque eu quero que ele jogue, se o Jacaré tiver melhor, vai jogar o Jacaré. Futebol é um modo contínuo. Quem merece vai colocar a cabeça de fora e uma hora aparece proposta. O que nós não podemos fazer é negociar mal. O desgaste que nós tivemos esse ano, com Mastriani e Martínez, não quero para ninguém. Você cai para a Segunda Divisão, comprou um jogador de um clube pequeno no exterior e ele quer sair? É muito duro para a gente que dirige. Você inventou uma nova forma dele viver, num nível melhor, e ele vira as costas para você? Isso foi ruim para mim. Foi um baque que eu não esperava.

Como você recebeu essa notícia? Que ele havia pedido para sair?

A partir do momento que um jogador te pressiona para sair e buscar proposta, você acaba sendo espremido. Um exemplo agora, do Cássio. O Cássio quer sair e perturba o Corinthians pra sair. Ou tem um atleta que não quer jogar ou vou vender. O caso do Mastriani e Martínez, o vínculo era pequeno, de um ano só. Tenho jogadores lá que têm orgulho de vestir a camisa na A ou na B. E são jogadores menores de mercado. Não foi um negócio fácil. O Mastriani foi mais fácil, porque ele pediu para colocar um preço e desempenhou. O Martínez a gente sabe quem foi o culpado, tem CNPJ. 

Quem foi o culpado?

Não vou falar. Mas todo mundo que tem inteligência sabe. 

Martínez, do América - (foto: Mourão Panda/América)
Emmanuel Martínez se destacou no Barcelona de Guayaquil (EQU) antes de chegar ao Coelho(foto: Mourão Panda/América)

Sobre a venda da SAF. Recentemente você falou em entrevista que é um desejo concluir até o fim do seu mandato. Tem alguma empresa no radar? Em que pé está?

Isso é uma coisa que eu não abro mão. O momento da SAF não é favorável no Brasil, porque o Brasil está instável juridicamente. O próprio exemplo do Vasco demonstrou isso. Estamos num momento ruim para alguém apostar na nossa economia. Estamos buscando alternativas de investidores e também de parceiros, que dividam o risco com a gente. Montei uma comissão, com dois ex-presidentes e duas pessoas do clube para me ajudar nesse processo, conselheiros do América. Estou otimista que algumas novidades vão surgir. Mas o América sobrevive sem isso.

Por que eu tenho esse sonho? Porque eu quero mudar o América de patamar. Os clubes fizeram isso porque não sobreviviam, estavam quebrados. Então, sobreviver sofrendo, como eu sofro todo ano, para pagar as contas e tal, a gente consegue sofrer. Quando a gente tem um investidor e muda de patamar, o América tem mais chance na Primeira Divisão. E na Série A, eu (hoje) consigo trabalhar  com o 15ª, 14ª orçamento. Isso diminui as chances, tem que ter excelência o tempo todo, coisa que faltou ano passado e nos fez cair. Com mais recurso, pode errar mais e tem mais massa de manobra para não acontecer. Eu espero que, este ano, com o bom desempenho, uma sinalização de subida, acelere o processo de venda da SAF. 

E os detalhes dessa venda? O CT entra? E o Independência?

Não, o América não vende patrimônio. O América, se for fazer qualquer tipo de negócio, temos duas modalidades. Primeira modalidade é a venda das ações, com aluguel do CT e aluguel do Independência, por um período, com o valor pago. O CT está vinculado à execução de melhorias. Do Independência está vinculado a desempenho e melhora do estádio. América venderia parte das ações e daria um bônus por desempenho. Com algumas regras, porque tem o conselho, mas quem vai por dinheiro vai assumir isso. Responsabilidade sobre a dívida, CT e nós queremos o mínimo de investimento em futebol.

Tenho que ter a certeza que a minha dívida parcelada vai ser paga, e quero investimento, porque se não tiver, não precisa vender. Eu tenho uma folha na Série A de R$ 5 milhões, se alguém comprar, tem que estar próximo de R$ 10 milhões. Tem que estar num nível mais alto, porque tem que ser competitivo. Perdi jogadores ano passado porque eu não podia pagar o salário de 400 mil, 350 mil. Aí você tem que acertar nas duas apostas. Acertamos na maioria das vezes, mas ano passado não fomos felizes.  

Tem alguma SAF no futebol brasileiro que você toma como inspiração?

Gostaria muito de ter uma SAF como tem o Manchester City, porque a expertise no futebol é fundamental. Mas (a SAF) do Bragantino tem uma similaridade com a do América. Ela não é SAF, é uma venda efetiva de um clube, mas onde que o Bragantino concentra sua receita? Na formação de jogadores. Eles compram jogador jovem, formam o jogador para poder reciclar. E é vinculado a um grande clube europeu, que tem na Alemanha, Áustria e Estados Unidos. Eu gostaria de ter essa vinculação a clubes que pudessem ter uma parceira para isso. “Ah, mas vai jogador para lá”. Não é problema, desde que tenham regras.

Eu tenho uma modalidade de venda e a outra modalidade é o América ser sócio de algum investidor, num projeto de formação de jogadores. Ao invés de entrar com valor muito grande, entra com valor menor e eu fico com um percentual e tenho direito de recompra desse investimento durante 10 anos. É uma modalidade que estamos estudando. Mas, este ano, não acho que eu mudo a história do América com uma venda imediata. Se entrar alguém, vai seguir o que está sendo feito. Tenho uma janela no meio do ano, que vou fazer com ou sem investidor. 

A SAF tem algum valor estimado?

Tem, mas não gosto de falar. Tenho assessores financeiros e jurídicos. Mas, basicamente, o que eu quero é uma garantia de investimento anual no futebol. Não estou trabalhando com valor de venda, porque o que eu vou fazer com o dinheiro? É quitar o que o América deve, não quero dinheiro para por no América. Não quero dinheiro, quero que o CT fique pronto, que o Independência fique maravilhoso e quero investimento.

Então estamos vinculando duas coisas importantes, uma eu vou falar, a outra não: é orçamento de futebol nos 10 anos de investimentos. Ah, o América tem uma receita? Tem. Vamos dizer que o América tem R$ 100 milhões de receita e o futebol exige R$ 150 milhões, ele vai ter que aportar R$ 50 milhões todo ano. Um exemplo. Eu quero uma garantia mínima de investimento no futebol, porque sei que vai trazer resultado.

Projeto de reforma do CT Lanna Drumond - (foto: Divulgação/América)
Projeto de reforma do CT Lanna Drumond(foto: Divulgação/América)

O América planeja ir ao mercado no meio do ano? Quais seriam as principais peças?

Você falar que não vai ao mercado é uma temeridade. Você falar que vai ao mercado, gera uma expectativa negativa. Não é isso que estou pensando. Temos um departamento de futebol que está pensando, em reuniões periódicas, que sabemos que precisamos checar desempenho de alguns para saber o que a gente precisa. Tenho risco de pressão para tirar jogador e tenho algumas necessidades. Do meio pra frente, está abaixo do que gostaria que tivesse. Do meio pra trás o desempenho é bom. Mas não vou ficar falando pra não perturbar meu grupo e para não criar expectativa no mercado. Mas nós avaliamos isso mensalmente e temos um foco de alguns jogadores. Sei que tenho obrigação. tenho que projetar até o final do ano, a gente não sabe o que vai acontecer até o final do campeonato. Toda Série B, os times vão arrancando e vão perdendo força. Não posso perder força do meio (do campeonato) pra frente. E talvez você precise injetar melhoras para não perder força. Contusão, perda de jogador, queda de desempenho, toda semana tem um doente, um machucado. Não posso na hora que preciso, não ter. Tem que ter.

Nós sabemos que o América também está em busca de alguém para substituir o Alexandre Mattos, no cargo de executivo do futebol. Tem algum nome já visado para a função?

O cargo não era do Alexandre Mattos. Ele veio porque nos solicitou voltar para o América. Ele não era a pessoa ideal para a função que eu queria, ele sabe disso. Eu falei com ele: ‘Eu quero uma função mais técnica’. Nós conversamos com Fernando Prass e Paulo Autuori, o nosso pensamento era alguém mais na área técnica junto aos jogadores e treinadores. Como o Alexandre é um nome muito experiente, solicitou a volta ao América e nós adequamos a presença do Alexandre, inclusive para nos dar (à diretoria) um pouco mais de folga e tranquilidade.

Volto para o meu pensamento original, não é uma sangria desatada, não é um desespero, mas, com certeza, provavelmente, ao longo do campeonato (Série B do Campeonato Brasileiro) vai aparecer essa figura. Nós já conversamos com alguns, que são pessoas mais da área técnica, para fortalecer o trabalho do Cauan, para a gente ficar mais próximo do grupo, para não ter desequilibro no clube.

Tem nomes que a gente conversou, estamos discutindo. O último nome que eu conversei foi o Autuori, ele falou: “Salum, eu gostaria muito de ir para o América, mas estou indo para o Coritiba por uma relação com as pessoas que estão lá”. Ele me agradeceu, é um nome interessante que nós poderíamos ter trazido. (Mas não é uma prioridade?) Não, nesse período o nosso grupo supera. Eu acho isso necessário (o cargo), o nosso grupo também acha, nosso treinador também acha, e é muito nessa área técnica. Nossa área de organização, de contratação, está muito bem estruturada com o comando do Fred (Cascardo, diretor de futebol), não há necessidade de colocar alguém ali, mas na área técnica temos necessidade.

E sobre essa saída do Mattos? Como foi para você?

Eu acho que as pessoas de bom senso e que vão analisar o que aconteceu, vão julgar as pessoas pelos atos. Eu não vou fazer isso. (Mas ele saiu brigado?) Eu, de forma nenhuma, vou brigar com quem pediu para sair. A única coisa que eu analiso são as coerências das ações. Isso é o básico para mim. Não vou brigar com ninguém por causa disso, mas as pessoas têm que ter coerência nos atos e eles é que se julguem.

Eu sou um cara das antigas, eu sou um cara de ‘filho de bigode’, um cara que está no mercado há 30 anos e que é super respeitado no Brasil todo, por quê? Porque as coisas que eu faço tem perenidade, tem organização, tem tudo. As pessoas agem, o currículo das pessoas não está no papel, está na boca dos outros. Todo mundo sabe quem é o Salum, como ele age. As pessoas tomam as ações e vai para o currículo delas. Não vou tocar no assunto porque é um assunto extremamente desagradável. Não vou julgar ninguém, cada um faz o que quer.

Alexandre Mattos em coletiva no América - (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A. Press)
Alexandre Mattos é o novo executivo de futebol do América(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A. Press)

Como é a sua relação com os outros empresários de Atlético e Cruzeiro? Nós já vimos várias transferências no futebol entre os clubes. Como é o relacionamento com o Rubens Menin, da SAF do Atlético, e com o Pedrinho, da SAF do Cruzeiro?

A minha relação com eles é excelente. Pouca gente sabe, mas o Menin estudou comigo, eu formei junto com ele. Conheço ele há muito anos. Sergio Coelho nem se fala, meu amigo pessoal. A relação é excelente, eu aqui e eles lá, tem a distância dos clubes. Mas, no pessoal, ótima. A minha relação com o Pedrinho, ele é meu patrocinador, nunca tive problema. O que me incomoda é que o América não está no futebol mineiro para servir Atlético e Cruzeiro. Essa visão, de que toda vez que tenho sucesso em alguma coisa, sou obrigado a ceder para Atlético e Cruzeiro.

Então, o caso do Martínez, por exemplo, o mesmo preço que o Fortaleza pagou, o Cruzeiro teve chance de pagar e não quis. Se tivesse pagado, teria ido. Mas sou julgado porque todo jogador sou obrigado a vender pra eles, porque tem mais atleticano e cruzeirense na rua. Todo mundo vem tirar o que o América faz. O América tem um trabalho de excelência.

Na minha base, o tempo todo estão tentando tirar. E quem tenta? Atlético e Cruzeiro. Eles têm esse direito, o que eu não quero é esse julgamento por ter obrigação de fazer. Não tenho que fazer mais barato para ninguém. Também, quando eu quero, vou atrás. Eu tentei trazer o Ademir de volta, mas o Atlético não quis abrir mão e vendeu pro Bahia. O valor que o Bahia pagou, o América podia pagar. Talvez não poderia pagar o salário, mas também tem que ver se o Ademir queria vir. A mesma coisa acontece de lá para cá. Mas em condições iguais, não tem o que fazer. O futebol mineiro nunca esteve tão apaziguado como agora. 

Você comentou sobre o patrocínio do Pedrinho no América. Depois que ele comprou o Cruzeiro, vocês chegaram a conversar? Interfere algo nesse patrocínio? 

Não mudou nada para mim. Não tenho que dar palpite (sobre a compra). Isso é pessoal dele, direito dele, talvez o sonho dele. Não me cabe julgar ele. A gente tem que ter a consciência de fazer o que acredita. O América é um sonho de 30 anos de construção. Tenho um carinho, porque nunca fiz nada sozinho. Recentemente, o Atlético jogou com o Peñarol e perdeu, e eu me lembro do jogo América e Peñarol lá, numa virada histórica. Quando eu poderia imaginar esse jogo? Que o América fosse classificar para a Libertadores, que ficaria entre os oito da Sul-Americana, que seria semifinalista da Copa do Brasil? Isso tudo foram realizações. Eu estava na hora da foto e deixei minha impressão digital lá.

O torcedor tem orgulho disso, mas achava que estava longe disso. E não está. O América é capaz. O América está crescendo de novo, por isso vem a história da SAF. Nem sempre com menos dinheiro você consegue fazer o que precisa. Acho que já esgotamos e precisamos ter a maturidade, para saber que, se voltar pra Série A, e espero que volte, de investir um pouco mais. Quem está sofrendo hoje na Série A? Vitória, Atlético-GO, Juventude, Criciúma, porque existe uma distância de investimento, é só olhar o plantel dos clubes.

O Vasco, com todo aquele dinheiro que enfiou, não caiu, mas… não vou falar porque fui multado por isso, não falo mais. Mas, enfim, tenho orgulho disso. Eu acho, com a maturidade que eu tenho, tenho funções para exercer no América, mas está na hora de começar a trabalhar substituições, não dou conta disso o resto da vida. Com tudo que eu tenho, é difícil tocar tudo. Espero que venha a SAF, mas se não vier temos que achar o caminho. 

No futuro, então, você planeja continuar no América, mas em outra função?

O América faz parte da minha vida. Operar o América, continuar tocando o futebol, não está nos meus planos, todo mundo no América sabe disso. É lógico que tem funções menos executivas dentro do América que eu vou usar minha experiência para exercer. Não existe esse negócio de ‘vou sair do América’ e virar as costas para algo que eu faço há 30 e tantos anos e sou apaixonado.

Agora, cuidar do futebol como eu cuido, eu acho que o América tem maturidade, nós temos equipes trabalhando internamente para a gente preparar esse momento de escolher esse profissional. Eu fico muito feliz porque dentro do América, quando eu falei que ia fazer isso (sair), fui procurado por pessoas importantes que falaram: ‘Salum, sua saída não é uma coisa simples. Você tem que ficar, nós temos que achar pessoas (para te substituir)’.

Então, nós estamos trabalhando internamente para que a gente tenha estrutura para tocar o futebol com menos ações minhas. Não se vira as costas para um clube que eu ajudei a construir porque estou cansado. Vou estar cansado, mas vou estar em todos os jogos. Eu e o Caio (irmão de Salum) compramos um camarote há cinco anos, e eu não vou ao camarote porque não aguento a cornetagem, eu assisto lá embaixo. Mas, quando eu não estiver dirigindo, eu volto para o camarote, é o camarote da família Salum, a gente paga lá todo ano, toda a minha família está lá, é muito americano. Meu pai foi muito competente, teve cinco filhos americanos. Dos 16 netos, 13 são americanos.

Quais objetivos você pretende cumprir antes do fim do mandato?

Eu quero tocar as obras da base, que nós estamos fazendo. Quero que o América suba (para a Série A). Quero que o América concretize ou se aproxime da solução da venda da SAF e que o América tenha maturidade de ter um futebol estruturado sem a minha presença no dia a dia, mas a minha presença no clube. Isso está sendo trabalhado, não é difícil. Eu pego o Fortaleza (como exemplo). O presidente do Fortaleza era o Marcelo Paz, o presidente remunerado. Ele veio aqui na época da Copa Sul-Americana (de 2023), almoçou com a gente, pegou todas as informações.

Ele brinca que o América é o espelho dele, ele sempre falou isso comigo, temos uma amizade muito grande. O que ele fez? A mesma coisa que nós fizemos: transformou o Fortaleza em SAF e se tornou presidente da SAF, remunerado, coisa que eu não sou e não vou ser nunca, nem se eu for conselheiro, eu não preciso, mas eu acho que ele está certo, é a profissão dele.

Como você dirige uma empresa grande depois que vai ficando mais velho? Você sai da operação e vai para a parte de planejamento. Para isso, você tem que fazer com que a operação funcione, e é isso que nós estamos trabalhando agora. Até o final do ano, eu opero junto com o Euler. Até o final do ano vão ter pessoas, provavelmente, fazendo o que eu faço, que vão sentar comigo, com Euler, todo mês, para prestar conta, dizer o que está certo e o que está errado.

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