Machismo, misoginia e falta de incentivo. Esses são alguns dos fatores que impediram o futebol feminino avançar e receber o mesmo tratamento que o masculino por entidades esportivas e até torcedores ao longo dos anos. Aos poucos e com muita luta, liderada inclusive por atletas, esse cenário começa a mudar – ainda que timidamente. Da última edição da Copa do Mundo Feminina, em 2019, para a atual (que começa na próxima quinta-feira), houve uma mudança de patamar, com aumento nas premiações e nos patrocínios. Mesmo assim, a disparidade em relação aos homens permanece.
Neste ano, o prêmio total do torneio gira em torno de US$ 110 milhões (cerca de R$ 527 milhões na cotação atual), três vezes mais que em 2019. O aumento é ainda mais relevante quando comparado ao valor pago na Copa de 2015, que foi 10 vezes menor. Ou seja, na época, a premiação era de US$ 15 milhões totais.
O choque vem quando a quantia é comparada ao prêmio total concedido na Copa do Catar, em 2022. As seleções – não só jogadoras mas também comissão técnica e federações nacionais, faturaram US$ 440 milhões (R$ 2,3 bilhões), quase três vezes mais que o valor a ser embolsado na competição feminina na Austrália e na Nova Zelândia.
Já o prêmio para a Seleção campeã será de US$ 4,29 (R$ 20,6 milhões na cotação atual). Neste ano, as jogadoras também vão receber prêmios individuais, que podem variar de US$ 30 mil (R$ 147 mil) para quem cair na primeira fase até US$ 270 mil (R$ 1,3 milhão) para as que forem campeãs.
A disparidade também é grande quando comparada ao valor recebido pela Argentina, na Copa do Catar em 2022. Os sul-americanos embolsaram US$ 42 milhões (R$ 142 milhões na cotação atual) – quase dez vezes mais a premiação que a seleção campeã da Austrália receberá este ano.
O presidente da Federação Internacional de Futebol (Fifa), Gianni Infantino, declarou em congresso da entidade que o objetivo é igualar as premiações femininas e masculinas no próximo ciclo, com as Copas do Mundo de 2026 e 2027.
A crescente do futebol feminino passa tanto pelo reconhecimento das entidades em relação à importância de investir no esporte quanto pelo apoio de torcedores e mídia. O Mundial disputado na França, em 2019, que sagrou a Seleção dos Estados Unidos tetracampeã, contou com 1,12 bilhão de espectadores, segundo a Fifa.
Tal relevância impulsionou e direcionou os holofotes para o campo e a qualidade do jogo, que antes só era apreciada no masculino.
No mesmo ano da última Copa, a CBF determinou que os clubes da Série A do Campeonato Brasileiro tivessem equipes femininas. Com o aumento da visibilidade da modalidade, o futebol feminino passou a ter novos focos, além de discussões sobre o tamanho do gol ou da falta de habilidade de jogadoras – que passaram anos impedidas de jogar futebol, seja por falta de investimentos ou bloqueadas pelo preconceito.
Para a Copa da Austrália e Nova Zelândia, mais recordes são esperados. Neste ano, novos meios de comunicação investiram em transmissões, mais um indicativo da evolução e na aceitação de que o futebol feminino é um produto que merece investimento.
Personagens da luta
Em 2019, a atacante estadunidense Megan Rapinoe foi uma das grandes figuras que protestaram pelo pagamento igualitário entre os jogadores e as jogadoras de futebol. Mesmo sem receber o reconhecimento desejado, ela continuou defendendo essa bandeira nos anos seguintes.
“Não há status, realizações ou poder para nos proteger das garras da desigualdade”, disse a atleta no Congresso Nacional dos EUA, em 2021.
Em 2021, a meia-atacante brasileira Marta, considerada uma das maiores jogadoras da história, foi para a Olimpíada de Tóquio sem patrocínio, em protesto contra disparidades de investimentos entre ela e os jogadores da Seleção masculina.
“Eu queria dar esse exemplo para outras atletas e até outras atividades fora do esporte, para que a gente possa buscar igualdade. Juntas. Financeiramente, não ganhei nada com isso”, disse, na época.
Outros impactos no futebol brasileiro
A campanha pela igualdade salarial e a luta por direitos iguais impactaram o futebol brasileiro de diversas formas. Além do aumento no número de torcedores, que passaram a ir a campo apoiar times femininos, a pressão pelo incremento nos investimentos deu resultado.
A final do Campeonato Brasileiro Feminino de 2022, entre Corinthians e Internacional, bateu recorde de público no jogo da volta: 41.070 pessoas prestigiaram a partida na Neo Química Arena, em que o Timão ergueu a taça. O número representa o crescimento de popularidade e relevância na modalidade.
Em 2023, o número de patrocinadores do campeonato também aumentou. São 80 marcas que estampam o nome nas camisetas e nas publicidades dos clubes e do próprio torneio nacional.
Erramos: Os valores pagos pela Fifa como premiação nas competições feminina e masculina estavam equivocados e foram corrigidos