Mauricio Pellegrino costuma refletir sobre o peso da fama em jogadores jovens. Crítico da voracidade do estrelato no futebol, o treinador leva sua filosofia humanista ao Lanús, um clube que aposta nos “pibes” para conquistar a Copa Sul-Americana.
Depois de pendurar as chuteiras em 2006, o técnico argentino de 54 anos tem analisado, com frases curtas porém contundentes, os efeitos do dinheiro, das redes sociais e da pressão psicológica em um esporte sedento por figuras midiáticas.
Ao longo de sua carreira nos bancos de Espanha, Inglaterra e Argentina, comparou a tecnologia ao vício em tabaco e acusa os altos salários no futebol de distraírem os jogadores com banalidades.
Com um estilo de professor, Pellegrino chegou em janeiro passado com esse pensamento ao Lanús, o modesto clube da província de Buenos Aires que no sábado (22/11) disputará contra o Atlético a final da Copa Sul-Americana, em Assunção.
Por trás dos microfones em coletivas e entrevistas, o treinador insiste em suas reflexões:
“É um momento complexo para os jovens. As regras do jogo fazem com que os garotos, por exemplo, recebam contrato pelo que podem vir a ser no futuro e não pelo que são”, disse quando foi apresentado no Granate.
“Antes, se fazia contrato pelo que eram; hoje, pelo que talvez venham a ser”, acrescentou o treinador, que como jogador conquistou uma Libertadores e uma Copa Intercontinental com o Vélez Sarsfield.
Pellegrino é contra o futebol ‘empresarial’
Pellegrino afirma que, como jogador, conheceu um futebol no qual se desfrutava mais do jogo e menos do “mundo empresarial” que o cerca hoje, no qual “não se aceita a derrota nem a ideia de perder”, segundo disse em entrevista à ESPN em 2019.
O argentino foi um alto defensor central de 1,93 metro que vestiu camisas de gigantes como Barcelona, Liverpool e Valencia, onde perdeu duas finais consecutivas, em 2000 e 2001, da Liga dos Campeões da Europa.
Os treinadores que mais admira moldam seu estilo de liderança: o neerlandês Louis Van Gaal, seu chefe no clube catalão, e o espanhol Rafa Benítez, de quem foi auxiliar nos Reds. Ambos são conhecidos como treinadores apegados a modelos conservadores.
Já como técnico, voltou ao Valencia e passou também por vários clubes, como o Southampton inglês. Sempre mistura sua inclinação para formar jovens talentos com a nostalgia por suas épocas douradas em campo.
“Os jovens (de hoje) têm muitas distrações. Recebem todo tipo de estímulo, o tempo todo: redes sociais, notícias sobre eles, agentes, marcas publicitárias. Nós só tínhamos o futebol, então só pensávamos em futebol”, disse ao jornal El País em 2019.
Sua visão acadêmica encaixou perfeitamente no Lanús, que desde 2013 disputou quatro finais continentais (uma Libertadores e três Sul-Americanas, incluindo a deste sábado), sempre com jovens como protagonistas.
Longe dos grandes como Boca Juniors ou River Plate, o Granate não investe grandes somas em contratações.
Ansiedade pela final contra o Atlético
Se vencer na final contra o Atlético, dirigido por seu compatriota Jorge Sampaoli, Pellegrino conquistará seu primeiro título após a aposentadoria como jogador.
Sobre sua personalidade, descreve-se como um guia “próximo”, mas sobretudo “exigente”. “Acredito muito nisso, nas rotinas”, em “criar um ambiente de exigência”, disse ao canal de YouTube Coaches’ Voice.
Embora geralmente seja reservado, às vezes é uma “pessoa muito ansiosa”. Em 2013, quando dirigia o Estudiantes de La Plata, fez um gesto muito brusco com o braço e deslocou o ombro.
Seus ex-companheiros perceberam sua vocação desde cedo. Roberto Ayala, seu antigo parceiro de zaga no Valencia, o define como uma pessoa que “faz pensar”, enquanto para o ex-goleiro espanhol Santiago Cañizares “é um cara com uma mensagem muito profunda”: “Não é uma pessoa superficial”.