COPA DO MUNDO DE 1998

Brasil vendeu a final da Copa de 98? Relembre a fake news

No aniversário de 25 anos da derrota marcante do Brasil para a França, relembre a fake news que tomou o Brasil e motivou até a abertura de CPI

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Ha exatos 25 anos, o Brasil levava um sonoro 3 a 0 da França na final da Copa do Mundo de 1998. Com dois gols de Zidane e um de Petit, a seleção do país-sede do torneio acabou com o sonho do pentacampeonato brasileiro. O resultado motivou a criação de uma das fake news mais famosas do mundo do futebol e culminou até na criação de uma CPI.

Houve um acontecimento inusitado no dia da final. Melhor jogador da Seleção Brasileira, Ronaldo Fenômeno sofreu convulsão horas antes do jogo. Após avaliação médica, o camisa 9 foi liberado para jogar a partida, mas não foi bem. Abatido, o Brasil foi mal na final e viu a França adiar o penta, com atuação de gala do craque Zidane.

A forma como tudo aconteceu deixou o público com a sensação de que a situação toda ficou “mal-explicada”. Muita gente não acreditou que Ronaldo sofreu uma convulsão. Como assim, o melhor jogador da Seleção, que estava arrebentando no torneio, teve um ataque epiléptico pela primeira vez logo no dia da final contra a seleção do país-sede, que nunca tinha vencido uma Copa?

A “estranha” derrota do Brasil, após convulsão do melhor jogador no dia da decisão, motivou a criação de fake news que afirmava que a CBF vendeu a final da Copa do Mundo de 1998.

Muita gente acreditou nos boatos, que ganharam diferentes versões e foram amplamente divulgados, até mesmo pela imprensa. A teoria da conspiração se espalhou da maneira tão impressionante que pode ser considerada uma das fake news mais famosas do mundo do futebol.

“Se vocês soubessem o que aconteceu, ficariam enojados”

Pouco depois da final da Copa de 1998, uma carta assinada por um jornalista chamado Gunther Schweitzer foi amplamente divulgada.

O texto revelava “o escândalo que todo mundo suspeitava”. No início, frase impactante era atribuída ao jogador Leonardo (ele nunca disse isso): “Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo, ficariam enojadas”.

O suposto jornalista afirmava, no texto, que estava comprovado que “O Brasil vendeu a Copa do Mundo para a Fifa”. A decisão da venda, segundo ele, teria sido informada aos jogadores algumas horas antes da final, pelo então presidente da CBF, Ricardo Teixeira.

Cada jogador da Seleção receberia o “valor total dos prêmios”. O texto dizia que a Nike estava envolvida no “esquema” e pagaria um valor alto em bônus para cada atleta, que teriam a oportunidade de assinar contrato com a empresa norte-americana com as mesmas bases financeiras dos craques Ronaldo e Roberto Carlos, do Brasil, Batistuta, da Argentina, e Raúl, da Espanha.

Por fim, a carta garantia que a venda facilitaria o pentacampeonato da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 2002. Curiosamente, o Brasil realmente foi campeão mundial no ano citado.

Invasão ao site da CBF

Dias após a derrota do Brasil na final da Copa de 98, hackers invadiram o site da CBF e postaram uma outra versão do texto atribuído a “Gunther Schweitzer”.

Fake news foi publicada no site da CBF - (foto: Reprodução)
Fake news foi publicada no site da CBF(foto: Reprodução)

Nela, a conspiração é ainda maior: dizia que, a venda teria sido feita porque, graças à ela, o Brasil sediaria a Copa do Mundo de 2002. Com isso, o Mundial de 2006 seria sediada no Japão e na Austrália.

Contudo, nada disso aconteceu. A Copa de 2002 aconteceu na Coréia do Sul e no Japão e a de 2006, na Alemanha.

Quem era Gunther Schweizer?

Gunther Schweizer realmente existia, mas não era jornalista.

Ele era personal trainer e tornou-se “autor” da corrente por engano – contou à ESPN que recebeu por e-mail a carta da teoria da conspiração e a recompartilhou, mas, como usava a função de “assinatura” ao final dos e-mails, a autoria do texto foi atribuída ao seu nome.

CPI da CBF/Nike

A “estranha” derrota da Seleção Brasileira para a França e a ampla divulgação das teorias da conspiração culminou em crise administrativa da CBF, que motivou a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara e no Senado.

A CPI da CBF/Nike foi aberta para investigar o contrato da Confederação Brasileira de Futebol com a fornecedora esportiva norte-americana – havia suspeitas de desvios de dinheiro, manipulação de convocações e em resultados de jogos da Seleção Brasileira.

Relator da comissão, o então deputado Sílvio Torres (PSDB-SP) disse à Folha, na época, que “Todo esse episódio que envolveu a escalação do Ronaldo não está muito esclarecido”.

A CPI convocou 125 depoentes. Entre eles, os jogadores Ronaldo e Roberto Carlos, o técnico Zagallo e o Presidente da CBF, Ricardo Teixeira foram intimados a falar sobre o que aconteceu no dia da decisão.

Em vários momentos, a final contra a França foi tópico das discussões da comissão.

“Fui depor na CPI e a primeira pergunta que eu respondi foi: ‘Quem deveria ter marcado o Zidane no escanteio?’. Eu falei: ‘Eu não lembro, mas quem deveria não marcou bem’. Claramente não marcou bem”, disse Ronaldo ao podcast Flow.

A CPI foi encerrada em 2001 sem maiores respostas.

Ronaldo deu entrevista sobre o assunto

Em entrevista ao podcast Flow, em 2021, Ronaldo Fenômeno afirmou que tudo não passou de fake news.

“Foi horrível. Palhaçada. Falaram que nós vendemos a Copa para o Governo da França, que a Nike fez não sei o que com a Adidas. Umas teorias, umas coisas mais loucas. E não fica no âmbito do torcedor, não. Vai para imprensa, para a TV, para uma CPI. Olha o absurdo. Tira toda a nossa credibilidade. Estou ali e sou vendido? Está me chamando do quê? Brasileiro gosta muito de teoria da conspiração”, contou o dono da SAF do Cruzeiro.

Fake news virou meme

A frase “Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo, ficariam enojadas”, virou meme e passou a ser usada nas redes sociais em diversas ocasiões.

Quando o Brasil levou 7 a 1 para a Alemanha na final da Copa de 2014, o texto foi modificado para “simular” que o vexame da Seleção teria sido, na verdade, um resultado vendido.

Em 2018, após a derrota do Brasil para a Bélgica nas quartas do Mundial, torcedores da Seleção também fizeram alterações no texto de Gunther Schweizer, atribuindo a famosa frase “Se as pessoas soubessem…” a Fernandinho, Thiago Silva ou a outro jogador da equipe comandada por Tite.

Veja o texto completo atribuído a Gunther Schweizer

“Talvez, isso explique a razão do jogador Leonardo ter declarado a seguinte frase: ‘Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo, ficariam enojadas’. Todos os brasileiros ficaram chocados e tristes por terem perdido a Copa do Mundo de futebol, na França. Não deveriam. O que está exposto abaixo é a notícia em primeira mão que está sendo investigada por rádios e jornais de todo o Brasil e alguns estrangeiros, mais especificamente Wall Street Journal of Americas e o Gazzeta delo Sport e deve sair na mídia em breve, assim que as provas forem colhidas e confirmarem os fatos.

Fato comprovado: O Brasil VENDEU a copa do mundo para a Fifa. Os jogadores titulares brasileiros foram avisados, às 13:00 do dia 12 de Julho (dia do jogo final), em uma reunião envolvendo o Sr. Ricardo Teixeira (na única vez que o presidente da CBF compareceu a uma preleção da seleção), o técnico Mário Zagallo, o Sr. Américo Faria, supervisor da seleção, e o Sr. Ronald Rhovald, representante da patrocinadora Nike. Os jogadores reservas permaneceram em isolamento, em seus quartos ou no lobby do hotel. A princípio muito contrariados, os jogadores se recusaram a trocar o pentacampeonato mundial por sediar a Copa do Mundo.

A aceitação veio através do pagamento total dos prêmios, US$70.000,00 para cada jogador, mais um bônus de US$400.000,00 para todos os jogadores e integrantes da comissão, num total de US$ 23.000.000,00 vinte e três milhões de dólares) por meio da empresa Nike. Além disso, os jogadores que aceitarem o contrato com a empresa Nike nos próximos 4 anos terão as mesmas bases de prêmios que os jogadores de elite da empresa, como o próprio Ronaldo, Raul, da Espanha, Batistuta, da Argentina e Roberto Carlos, também do Brasil.

Mesmo assim, Ronaldo se recusou a jogar, o que obrigou o técnico Zagallo a escalar o jogador Edmundo, dizendo que Ronaldo estava com problemas no joelho esquerdo (em primeira notícia divulgada às 13:30 no centro de imprensa) e, logo depois, às 14:15, alterando o prognóstico para problemas estomacais). A sua situação só foi resolvida após o representante da Nike ameaçar retirar seu patrocínio vitalício ao jogador, avaliado em mais de US$90.000.000,00 (noventa milhões de dólares) ao longo da sua carreira.

Assim, combinou-se que o Brasil seria derrotado durante o ‘Golden Goal’ (prorrogação com morte súbita), porém a apatia que se abateu sobre os jogadores titulares fez com que a França, que absolutamente não participou desta negociação, marcasse, em duas falhas simples do time brasileiro, os primeiros gols. O Sr. Joseph Blatter, novo presidente da Fifa, cidadão franco-suíço, aplaudiu a colaboração da equipe brasileira, uma vez que o campeonato mundial trouxe equilíbrio à França num momento das mais altas taxas de desemprego jamais registradas naquele país, que serão agravadas pela recente introdução do euro (moeda única européia) e o mercado comum europeu (ECC).

Garantiu, também, ao Sr. Ricardo Teixeira, através de seu tio, João Havelange, que o Brasil teria seu caminho facilitado para o pentacampeonato de 2002. Por gentileza passem esta mensagem para o maior número possível de pessoas, para que todos possam conhecer a sujeira que ronda o futebol!”

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