A Câmara Municipal de Belo Horizonte (CM-BH) decidiu chamar para o centro do debate aqueles que estão diretamente envolvidos com o mercado das apostas esportivas. Uma audiência pública marcada para o dia 1º de outubro, no Plenário Helvécio Arantes, deve reunir representantes de clubes, arenas esportivas, federações, além de jornalistas e influenciadores digitais patrocinados por casas de apostas.
Entre os convocados estão Atlético, Cruzeiro e América, além do Mineirão, da Arena MRV, do Independência e do Mineirinho. Também foram chamados dirigentes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), da Federação Mineira de Futebol (FMF), da Federação Mineira de Voleibol (FMV), da Associação Mineira das Federações Esportivas (Amife) e do Minas Tênis Clube.
Os clubes não foram convocados oficialmente, mas vão receber o convite na próxima semana. O texto foi aprovado.
A lista se estende a influenciadores e jornalistas como Samuel Venâncio, Heverton Guimarães, Fael Lima, Fernanda Cunha, Alex Domingos e outros nomes que hoje têm contratos com plataformas de apostas online.
O requerimento apresentado pelo vereador Wagner Ferreira (PV) ressalta que clubes, arenas e comunicadores não são apenas beneficiários financeiros, mas também formadores de valores e comportamentos sociais. Nesse sentido, a audiência deve colocar em discussão os limites éticos da publicidade esportiva, especialmente diante da multiplicação de casos de ludopatia na capital.
Ao EM/No Ataque, Wagner disse que “não se pode ignorar que cada contrato de patrocínio, cada ação de marketing ou cada menção publicitária em redes sociais tem o potencial de estimular práticas que podem levar ao adoecimento de seus próprios fãs e admiradores do futebol.”
“Precisamos refletir sobre os limites éticos da publicidade institucional e da monetização da influência e equilibrar os interesses financeiros dos clubes, que são legítimos, e influenciadores que devem ter responsabilidade ao influenciar. Entendo que o tema que ultrapassa o campo do marketing esportivo e entra no domínio das políticas públicas de saúde, educação e proteção social, e, de modo especial, esporte e lazer, enquanto direitos fundamentais e instrumentos de promoção da cidadania”, concluiu.
O PL que mira a publicidade das bets
A convocação ocorre em paralelo à tramitação do Projeto de Lei 326/2025, também de autoria de Wagner Ferreira. A proposta recebeu parecer favorável da Comissão de Legislação e Justiça (CLJ) e agora segue para outras comissões. O texto proíbe a veiculação de propaganda de apostas em espaços físicos da cidade, veta contratos da administração municipal com empresas do setor e impede que marcas ligadas às bets comprem naming rights de equipamentos públicos.
O autor da proposta defende que a medida busca reduzir os danos sociais e de saúde pública ligados ao vício em jogos de azar. A iniciativa ganhou adesão de vereadores de diferentes partidos, como Edmar Branco (PCdoB), Flávia Borja (DC), Iza Lourença (PSOL), José Ferreira (Podemos), Juhlia Santos (PSOL), Lucas Ganem (Podemos) e Luiza Dulci (PT).
Na CLJ, a única divergência registrada veio da vereadora Fernanda Pereira Altoé (Novo), que preferiu se abster. Ela alertou que a Constituição atribui à União a competência exclusiva para legislar sobre publicidade comercial, mas reconheceu a gravidade do tema. Wagner Ferreira, por sua vez, sustentou que o projeto respeita a alçada municipal ao tratar de restrições em espaços públicos, em contratos da prefeitura e em concessões de nomeação de arenas.
Economia x saúde pública
O embate sobre as bets expõe duas faces distintas. Por um lado, as plataformas se consolidaram como financiadoras centrais do esporte brasileiro, sustentando clubes, arenas e competições. Em Belo Horizonte, contratos milionários de Atlético e Cruzeiro exemplificam a força econômica desse mercado. Por outro, vereadores contrários à prática alertam para a naturalização do vício em apostas, que tem provocado endividamento de famílias e ampliado a demanda por atendimento médico especializado.
A audiência de outubro promete colocar frente a frente esses interesses. Clubes e arenas tendem a defender os aportes financeiros que recebem, enquanto influenciadores e jornalistas devem relatar sua relação contratual com as casas de apostas. Já os vereadores pretendem pressionar para que se discutam limites éticos e responsabilidades sociais em um mercado que, ao mesmo tempo que injeta recursos, é acusado de estimular um problema de saúde pública crescente.