AMÉRICA

De ida contrariada a ídolo: campeão com o América detalha dificuldades na Suécia

Ex-atacante marcou o gol que deu o título ao Coelho na vitoriosa campanha da Copa Sul-Minas, sob o comando do técnico Flávio Lopes

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Dos destinos mais comuns para um jogador de futebol que sonha em sair do Brasil, estão alguns times do Sul da Europa – como na Espanha e Itália. A migração para os países nórdicos não costuma estar na rota, seja pelas questões climáticas ou pelos clubes estarem fora das competições mais badaladas. Mas foi na Suécia, na Península Escandinava, que Álvaro Santos, campeão da Copa Sul-Minas com o América em 2000, trilhou o caminho nos gramados. Na Europa, se tornou ídolo e, aposentado, virou técnico do Helsingborg e ainda assiste ao talento do filho para lapidar os próximos passos.

Natural de Montes Claros, interior de Minas Gerais, Álvaro chegou ao América com 14 anos, ainda no infantil do clube. Depois do juvenil, subiu para o profissional, no qual ficou dois anos e meio. Na campanha da Copa Sul-Minas, sob o comando do então técnico Flávio Lopes, o ex-atacante marcou o gol que deu o título ao Coelho.

Na fase de grupos, o Coelho avançou em primeiro, com 11 pontos. Na semifinal, bateu o Athletico-PR nos pênaltis. Na grande final, no Mineirão, o América venceu o Cruzeiro por 1 a 0 na ida e 2 a 1 na volta.

“Foi um período muito rico, de muita aprendizagem. O América tinha uma base é muito forte naquela época e começou a usar muito a base. O Flávio Lopes, que também era treinador de base, apostou muito nos meninos, e a gente tinha também a força dos mais velhos, como Palhinha e outros”, relembrou Álvaro, que naquele ano disputou 12 jogos e marcou um gol.

Álvaro Santos no juvenil do América em 1997. Foto: Reprodução/Instagram

Copa Sul-Minas e transferência para a Suécia

Depois da Copa Sul-Minas, o foco era seguir em Belo Horizonte, progredindo com o profissional do América. Contudo, o empresário de Álvaro, Renê Santana, filho de Telê, tinha outros planos para o jogador. Ao No Ataque, ele detalhou como foi o processo de transferência.

“O Renê me procurou, falou: ‘Álvaro, temos uma oportunidade para você jogar fora do Brasil, na Suécia’. E na época a gente tinha pouca informação. Ele falou que o time ia jogar a Liga dos Campeões. Eles ficam no Norte da Europa. Eu sempre acompanhei muito futebol, então eu sabia que tinha um clube da Noruega que jogava a Liga dos Campeões, era o único time escandinavo que eu conhecia”, contou.

A negativa foi imediata. Nem passava pela cabeça do ex-atacante se mudar para a Suécia. Renê não desistiu fácil e seguiu insistindo por mais dois meses. Álvaro então recorreu às orações para elucidar a decisão que deveria tomar para o futuro da carreira.

“Eu não queria ir de jeito nenhum, mas falei ‘vou falar com Deus. E se Deus falar para eu ir, eu vou. Mas se ele falar não, então chega, não quero que você fale mais desse assunto’. Deus falou comigo através da Bíblia muito claramente. E aí contra a minha vontade eu voltei para a sala e falei: ‘Renê, eu vou’. Ele falou que ia arrumar as coisas e dali um mês eu estava embarcando para Suécia”, recorda-se.

A ida contrariada ainda rendeu uma confusão curiosa quando Álvaro desembarcou na Suécia.

“Na minha cabeça, eu ia para o Rosenborg, na Noruega, porque era o único clube que jogava a Liga dos Campeões. Eu sabia que o Rosenborg tinha camisa branca e shorts pretos. Eu tinha um um tradutor e fomos num restaurante, ele mostrou uma foto de um time com camisa vermelha e shorts azuis e falou: ‘Nesse time que você vai jogar’. Eu caí em pânico, falei: ‘Não, não, não, a cor é branca e preta, já vi na televisão’. Depois liguei para o Renê e ele falou que estava certo (risos)”, se divertiu Álvaro.

Álvaro Santos

As dificuldades de Álvaro na Europa

Logo no início da entrevista, Álvaro comemorou que fazia um dia de sol em Helsingborg: “Se está com sol, então está tudo bem”. A cidade portuária no Sul da Suécia pode atingir temperaturas negativas no inverno. No verão, a máxima é de 20°C. O clima foi uma das maiores dificuldades que o ex-atacante enfrentou quando deixou o Brasil, onde as máximas em BH chegam a 40°C.

“Foi o maior desafio da minha carreira, principalmente socialmente, eu estava preparado em alguns aspectos, em outros não. Como jogador de futebol, a gente se prepara para não estar em casa, perto da família. Mas o inverno… O primeiro inverno foi muito difícil, fazia -17°C, muita neve e a gente treinava fora, não era em ginásio”, confidenciou.

Outro aspecto de difícil adaptação foi a língua. O idioma oficial é o sueco, mas o inglês é amplamente falado no país, com alto nível de proficiência, inclusive. Contudo, para Álvaro, nenhum dos dialetos estava no seu domínio.

“A língua, no começo também foi um um grande desafio. Como eu não sabia inglês bem, acabei mergulhando no sueco e comecei também a conversar com os suecos. Nos primeiros seis meses mergulhei muito na língua deles, na cultura deles. Consegui fazer amigos, o grupo era bom”, falou.

A adaptação à cultura não foi tão complicada, mas o ex-jogador acabou esbarrando em outro fator: a gastronomia sueca: “O sueco não é tão aberto assim, como o brasileiro, mas quando você conquista a confiança dele, ele vê que você quer aprender a língua. É um povo gentil, que sabe receber as pessoas bem, ainda mais o imigrante. Acho outra grande diferença é a comida. A alimentação não é ruim, é bem mais simples e menos complicada que os nossos pratos. Mas quando você está com fome, aprende a comer a comida do outro (risos)”.

De ídolo a treinador

A vida na Suécia decolou. Depois de oito meses, Álvaro se casou com a namorada brasileira. O ex-jogador ficou no Helsingborg até 2003. Depois, acumulou passagens por outros times da Europa, como Copenhague, da Dinamarca; Sochaux, da França; e Orgryte, da Suécia. Em 2011, retornou para o Helsingborg.

Com a camisa do time sueco, conquistou uma Liga Sueca, Supertaça Suécia e Taça da Suécia. A idolatria foi natural. Mesmo que os suecos não sejam tão calorosos, Álvaro contou que ainda é parado na rua para tirar fotos. As novas gerações se referem a ele como um jogador que foi o preferido dos pais.

“Não era meu objetivo, se fosse escolher, não escolheria jogar na Suécia, então, estava acima dos meus planejamentos. No versículo que Deus me deu, Ele falava que me faria grande. E realmente eu me tornei grande aqui. Todas as coisas aconteceram de maneira bastante natural, mas também fruto de muito trabalho, fui bem preparado, muito preparado fisicamente e tive grandes treinadores como o Hamilton, ex-atacante do América. Tive grandes mentores”, pontuou.

Álvaro Santos como técnico do Helsingborg

O caminho de treinador foi planejado antes mesmo da aposentadoria. Álvaro pendurou as chuteiras em 2014. No total, pelo Helsingborg, considerando as duas passagens, foram 161 jogos e 50 gols, segundo o site de estatíticas Ogol.

“Quando fiz o meu último contrato no Helsingborg, chegamos a um acordo que eu iria trabalhar no clube depois da minha carreira como jogador. Começaria nas categorias de base. Quando começamos a conversar, eles me ofereceram um cargo de assistente técnico no Sub-17, só que o que me interessava mais nisso tudo eram os cursos da Uefa. Então, entramos em acordo que o Helsingborg iria me dar todos os cursos”, disse.

O caminho até o profissional foi mais rápido do que o esperado. Em 2022, ele chegou ao time principal do Helsingborg. Depois, foi para o Helsingor, da Dinamarca.

Filho de Álvaro também é jogador

O talento de Álvaro foi herdado pelo filho Gabriel, de 16 anos, que atua como ponta-direita. Ele é camisa 10 da Seleção Sueca Sub-17 e nasceu no país nórdico em 2009, ano em que Álvaro defendia o Orgyte.

“Vi que meu filho, Gabriel, desde muito pequenininho batia na bola muito bem. Ele tem a coordenação motora para chutar. E existia também a paixão pela bola. Sempre gostou muito de ficar jogando bola, muitas vezes sozinho. Então, quando eu estava em casa, a gente sempre jogava juntos, ele foi crescendo e aquilo continuou crescendo nele também. Sempre incentivei de maneira natural”, comentou.

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