Em outubro, a Sociedade Anônima de Futebol (SAF) do Atlético apresentou aos investidores uma proposta de reestruturação dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) da Arena MRV. No documento, o clube detalhou a projeção financeira até o ano de 2030, com previsão de “estagnação” da dívida por três anos até o início da redução dos débitos – e não o total encerramento dessas pendências até 2028, diferentemente do que havia estimado recentemente o principal nome da cúpula do Galo, o empresário Rubens Menin.
Na projeção mais recente, feita no último mês de setembro pelo CEO da SAF Bruno Muzzi durante conversa com jornalistas na Arena MRV, a dívida do Atlético encerraria 2024 em R$ 1,2 bilhão – número ainda não confirmado oficialmente em balanço.
O documento apresenta a projeção do fluxo de caixa da SAF do Atlético até 2030. Na comunicação aos investidores dos CRIs da Arena MRV, o Galo prevê “três anos de rolagem de dívida até o clube iniciar a redução do endividamento”.
O débito, de toda maneira, passa a se reduzir em ritmo tímido de 2028 a 2030. O montante estimado para o último ano da apresentação, inclusive, é maior do que o de 2025.
O endividamento líquido do Atlético foi projetado em R$ 1,281 bilhão ao fim de 2025, R$ 1,385 bilhão ao fim de 2027 (quando em tese se iniciaria a redução das pendências) e R$ 1,316 bilhão ao fim de 2030. A estimativa da gestão alvinegra levou em consideração uma taxa Selic de 12% em 2025, com queda de 0,5 pontos percentuais ao ano até 2030 – chegando aos 9,5% no último ano do projeto.
Em contato com fontes ligadas ao Atlético, o No Ataque apurou que esta é uma projeção “conservadora” por parte do clube, desconsiderando a possibilidade de um fato novo que injete dinheiro nas finanças da SAF.
Em caso de novos aportes no clube-empresa – seja por parte dos investidores que ditam os rumos do Galo ou da abertura de capital na bolsa de valores, por exemplo -, a tendência seria de uma redução mais acelerada deste endividamento.
O Atlético promoverá, na próxima quarta-feira (8/1), apresentação de Bruno Muzzi à imprensa na sede do clube em Belo Horizonte para esclarecer tópicos relacionados à saúde financeira da instituição e pretende abordar, entre outros temas, a dívida.
Documento contradiz investidor do Atlético
A apresentação disponibilizada aos fiduciários dos CRIs da Arena MRV contradiz uma declaração de Rubens Menin, principal empresário associado à SAF do Atlético. Na última segunda-feira (30/12), o investidor afirmou que o clube trabalhava com novo prazo para zerar o endividamento: antes 2026, agora metade de 2028.
O documento, contudo, diz que os débitos começarão a cair só daqui três anos. A previsão, assim, não é que sejam zerados em 2028.
“Não, não vamos conseguir [quitar a dívida até 2026]. A expectativa era de que até 2026 a gente terminasse. A gente tem que ser realista, né? A hora que os juros sobem, e subiram… Tínhamos uma expectativa de que os juros acabassem em 8% esse ano. Vai acabar em 14% – seis pontos a mais. Cada seis pontos percentuais de juros comem R$ 50 milhões do Atlético por ano – do Atlético e de todos os times do Brasil. Os juros no Brasil, infelizmente, pegaram uma trajetória muito ruim e isso vai consumir um pouco mais de dinheiro nosso. É um dinheiro até ruim, que a gente paga juros e não investe, mas o nosso planejamento está indo para o meio de 2028 agora.”
Rubens Menin em entrevista à Rede 98
Mesmo diante da extensão do prazo para a quitação da dívida bilionária, o empresário atleticano demonstrou otimismo diante do cenário de momento no clube. Menin valorizou os compromissos que o Galo conseguiu honrar no passado recente.
“O importante é a gente ter saúde financeira, não atrasar os pagamentos. A gente faz muita questão disso, sabe? Acho que isso é muito importante para fazer a história nova da SAF. Salários em dia, compromissos em dia, não temos mais aquelas dívidas trabalhistas. Está tudo organizadinho, e isso é importante. Uma coisa que o Atlético nunca teve: fluxo de caixa. Não devemos jogador, não devemos Fifa, não devemos nada. Isso é muito, muito bom para nós”, completou.
O que são CRIs?
Parte significativa do débito se refere justamente aos CRIs. Os Certificados de Recebíveis Imobiliários são títulos de investimento em renda fixa, que possibilitam que as construtoras ou incorporadoras transformem em títulos os pagamentos que têm a receber de compradores de seus imóveis. Esses papéis podem ser adquiridos por investidores no mercado, com resgate apenas no vencimento pré-estabelecido.
Sem recursos para a conclusão das obras da Arena MRV, o Atlético foi ao mercado e captou R$ 440 milhões com investidores por meio dos CRIs entre dezembro de 2021 e setembro de 2022. Os títulos têm taxa anual baseada no Certificado de Depósito Interbancário (CDI) + 5,25%, e o clube deve quitá-los até novembro de 2029.
No documento apresentado aos investidores, o Galo estimou que a dívida em CRIs ao fim de 2024 seria de R$ 343 milhões – quase R$ 100 milhões a menos que os R$ 440 iniciais. Na avaliação do clube, “naquele momento [captação de recursos durante as obras da Arena MRV], o risco associado a esse empréstimo era significativamente maior que hoje”.
Atlético segue com dívida bilionária
A apresentação também destacou o endividamento líquido do Atlético ao fim de 2023: cerca de R$ 1,3 bilhão. A cifra já considerava a dívida do clube ligada aos CRIs da Arena MRV. Os números de 2024 devem ser divulgados pelo Galo até abril.
O perfil do endividamento líquido do Atlético ao fim de 2023
- CRI + PUT: R$ 486 milhões (37% do total)
- Bancário: R$ 465 milhões (35% do total)
- Profut/Perse: R$ 323 milhões (25% do total)
- Outros: R$ 36 milhões (3% do total)
Atlético teve fluxo de caixa positivo em 2024
Ainda de acordo com Rubens Menin, o Atlético voltou a ter fluxo de caixa operacional positivo em 2024. O próximo balanço financeiro do Galo, portanto, deve evidenciar com números que o clube arrecadou mais do que gastou com as principais operações neste ano.
De toda forma, o investidor voltou a mencionar os juros e o empréstimo para a conclusão das obras da Arena MRV como fatores dificultadores para a evolução financeira do Atlético. O clube convive com a necessidade de construir novos anos de fluxo de caixa positivo para caminhar na direção da quitação das pendências monetárias.
“Hoje é dia 30, nós não fechamos o balanço. Nós já sabemos o que será. Vai ser o primeiro ano que o Atlético vai ter fluxo de caixa operacional positivo dos últimos 10, 15 anos, não sei. (…) Isso vai ser importante. Tivemos recorde de arrecadação. Não vou antecipar o número não, mas teve. Muito bom. A gente teve dois problemas: um déficit financeiro, que foram os juros, não operacional. A Arena também tem um empréstimo que dá um prejuizinho todo ano, que são os CRIs da Arena. Nós temos uma dívida da Arena de R$ 400 milhões ou alguma coisa dessa ordem. Coisa que nós estamos diminuindo, porque já foi R$ 500 milhões”, disse.
“A partir do momento que os juros forem sendo pagos e a dívida for diminuindo, cada vez menos a gente vai ter custo financeiro. O importante é a gente ter resultado operacional. Isso mostra a saúde do time. O Atlético vai fechar 2024 com resultado operacional, com diminuição de dívida e com recorde de receita. Estou antecipando para vocês números que sairão em breve”, encerrou Rubens Menin.
Os balanços financeiros dos clubes brasileiros costumam ser divulgados em abril. No próximo documento, o Atlético detalhará o estado da dívida ao fim de 2024, além de apresentar novas projeções para honrar os compromissos.