ATLÉTICO

Análise de mercado, suporte ao treinador e mais: como CIGA orienta decisões no Atlético

Departamento é o responsável por avaliações internas do elenco e na observações de possíveis reforços para o Galo

Fruto de investimento milionário do Atlético nos últimos anos, o Centro de Informação do Galo (CIGA) vai muito além de apenas indicar possíveis reforços ao clube. O departamento de análise se dedica a três diferentes áreas com várias ramificações para chegar a um objetivo principal: direcionar à diretoria os melhores caminhos possíveis com base em estratégias e evidências estatísticas.

O CIGA é coordenado pelo jornalista e observador técnico Rodrigo Weber e conta com outros 13 profissionais divididos entre análise de desempenho, mercado e analytics, além de cinco observadores.

Na quarta-feira (19/3), em encontro com jornalistas, Weber explicou em detalhes como o Galo busca obter vantagens dentro e fora de campo a partir da utilização de dados e processos internos trabalhados por essa equipe. As áreas de atuação do CIGA serão destrinchadas a seguir pelo No Ataque.

Como ferramentas de auxílio, o Atlético conta com 12 softwares pagos para ter acesso a dados de diferentes aspectos de jogadores e clubes – como físicos, tempos de contratos, consultoria tática individual, relacionamento de mercado, futebol de base, entre outros.

Entre os mais famosos estão o Statsbomb, o Footlink, o Wyscout e o TransferRoom. O último é apelidado de “Tinder do futebol”, por conectar e ajudar mais de 600 clubes a negociarem atletas em escala global. A plataforma foi útil ao Galo em 2023, quando o alvinegro emprestou o atacante Felipe Felício ao Levadia, da Estônia, por exemplo.

Base do CIGA

  • Alicerce: modelo de jogo do Galo baseado em evidências
  • Desenvolvimento: potencializar ativos conforme o modelo de jogo
  • Elenco: escolha de um treinador que saiba jogar daquela maneira, potencializando atletas
  • Expectativa: mais vitórias nas quatro linhas

Como o CIGA ajuda no desenvolvimento do time?

O CIGA também tem papel fundamental na análise coletiva do Atlético e dos jogadores da equipe. O departamento produz dois relatórios de todos os jogos do time na temporada, sendo um com métricas do próprio clube e outro de acordo com o que o técnico pede.

Além disso, o setor avalia padrões ao longo de conjuntos de partidas, identificando pontos positivos e o que pode ser trabalhado a longo prazo. Neste escopo, estão mapas de finalizações, gols esperados (xG), probabilidades de vitória, domínio territorial, ações progressivas, toques na área adversária, progressões em zonas do campo (xT), entre diversas outras métricas.

Da mesma forma, esses dados são utilizados na observação dos adversários com igual quantidade de detalhes. Um exemplo: o clube identifica padrões rivais em bolas paradas, como cobradores e receptores; qual é o modelo de jogo da equipe; quais atletas costumam bater os pênaltis e como, entre outros. Com todo este repertório em mãos, profissionais do CIGA acompanham os confrontos das arquibancadas, mas em contato constante com a comissão técnica por meio de vídeos e áudios para a troca de dados em tempo real.

Parte do treino aberto do Atlético na Cidade do Galo (27/2) - (foto: Lucas Bretas/No Ataque)
Parte do treino aberto do Atlético na Cidade do Galo (27/2)(foto: Lucas Bretas/No Ataque)

A atuação do CIGA no mercado

A maioria dos torcedores conhecem o CIGA pela participação do departamento nas contratações do Atlético. Mas como isso funciona? Como o clube identifica a qualidade de um jogador? E quantos atletas são observados por ano?

Vamos por partes. O setor pode analisar uma possível contratação por diferentes motivos. O primeiro deles se dá a partir de demandas específicas: a diretoria pede um atleta com determinadas características, e a partir disso vários nomes são estudados até se chegar a um grupo de atletas com o melhor encaixe possível com o treinador e o elenco.

O próprio CIGA tem autonomia para indicar jogadores e buscar oportunidades de mercado, como no caso do meia Gustavo Scarpa. Em 2023, os profissionais do departamento souberam que o jogador gostaria de retornar ao Brasil e recomendaram o atleta ao departamento de futebol – com base também, evidentemente, nas análises estatísticas.

Por fim, há a possibilidade de avaliação de jogadores que surgem por meio de recomendações externas da diretoria, de empresários ou do próprio técnico. A partir disso, são feitos estudos técnicos, táticos, físicos e pessoais aprofundados.

Gabriel Pec, atacante que se destaca na MLS defendendo as cores do LA Galaxy - (foto: Rich Lam/Getty Images via AFP)
Gabriel Pec, destaque da MLS, esteve na mira do Atlético por indicação do CIGA(foto: Rich Lam/Getty Images via AFP)

Como é feita a análise de cada jogador?

Antes de analisar a fundo um jogador, o CIGA tem vários processos que vão se afunilando a partir da qualidade identificada e da demanda do clube. A princípio, 50 mil jogadores estiveram na base de dados das plataformas citadas anteriormente na temporada passada.

Os profissionais do Atlético avaliaram 6,6 mil deles por meio de vídeos antes de avançar para uma observação mais profunda, em que se pesa a relação entre rendimento e projeção, comportamentos táticos, capacidades técnicas, adaptação ao modelo de jogo e diferentes contextos. Cerca de mil atletas estiveram neste filtro.

A shortlist (lista restrita, em português) é a etapa seguinte, e apenas 150 atletas chegaram a esse nível em 2024. Os nomes desses jogadores são guardados pelo CIGA e entregues à diretoria em caso de necessidade.

Neste ponto, o Atlético se movimenta nos bastidores e realiza observações técnicas in loco, background check (verificação de antecedentes, em português), histórico de lesões e viabilidade financeira. A partir desses estudos, o CIGA recomendou 55 atletas à diretoria em 2024.

Para identificar pontos positivos e negativos de possíveis alvos, são utilizadas 77 métricas comparativas e avançadas, divididas da seguinte forma: 11 físicas, 21 defensivas, 40 ofensivas e cinco de impacto.

No background check, o departamento estuda detalhadamente diversos fatores:

  • Histórico de vida (onde e com quem o atleta cresceu, estrutura da família)
  • Pessoas relevantes (em quem o atleta confia, quem admira)
  • Perfil extra-campo (o que o atleta gosta de fazer, hábitos e hobbies)
  • Perfil profissional (como o atleta treina, atividades extras como nutrição, prevenção de lesões, comportamento se for reserva, como é no vestiário, se é engajado com o clube, como entrevistas e torcida)
  • História no futebol (onde o atleta jogou, quem o treinou e com quem jogou)

O CIGA não necessariamente veta um atleta que não for “aprovado” em algum desses pontos, mas deixa claro aos donos do clube que são pontos a serem trabalhados internamente.

Depois de analisar todos esses aspectos, o departamento oferece uma lista ainda mais reduzida à diretoria, que é inteiramente responsável pela decisão final. Ou seja, o departamento recomenda determinados jogadores, mas não tem autonomia para determinar quais serão contratados.

Quando a negociação está avançada, o CIGA ainda contribui com a apresentação do “Projeto do Galo”. Por meio de reuniões virtuais (na maioria das ocasiões), Weber e Victor Bagy, diretor de futebol do Atlético, se juntam ao atleta e explicam: a história do clube, como é a cidade de Belo Horizonte, locais para se morar, a estrutura do CT, como é o estádio e a torcida, quem são os donos do Galo, o modelo de jogo, entre outros tópicos.

Em 2025, todos os nomes passaram pela avaliação do CIGA. De acordo com Rodrigo Weber, apenas dois dos 10 jogadores contratados não tiveram indicação direta do departamento.

CIGA auxilia Atlético também no longo prazo

O Atlético tem, junto à Sociedade Anônima do Futebol (SAF), um projeto nomeado como Galo30. Nele, o clube identificou um modelo de jogo ideal de acordo com a história da instituição e critérios pré-estabelecidos pela diretoria. Neste sentido, o CIGA criou 10 índices para unificar o estilo ideal, sendo cinco com bola e cinco sem.

O alvinegro busca, por exemplo: agressividade ao atacar; não permitir que o adversário tenha uma saída de bola curta; velocidade para chegar rapidamente na área adversária; muitas finalizações e, claro, uma equipe dominante ao longo dos jogos.

Parte do documento apresentado pelo Atlético ao treinador Gabriel Milito - (foto: Reprodução/Redes sociais)
Parte do documento apresentado pelo Atlético ao treinador Gabriel Milito(foto: Reprodução/Redes sociais)

Para chegar a este conceito, o Atlético buscou métricas com correlação positiva com o sucesso no Campeonato Brasileiro e características alinhadas com a história do time. Um exemplo é o próprio Galo de 2013, comandado por Cuca, que conquistou a Copa Libertadores daquele ano.

A ideia é que o clube sempre busque treinadores com os mesmos macroprincípios no modelo de jogo, para que, assim, as mudanças táticas não sejam tão bruscas com eventuais trocas no comando. Além disso, os atletas seguiriam sendo úteis à instituição independentemente do treinador vigente.

A longo prazo, o departamento ainda identifica carências no elenco a cada temporada, a quantidade de jogadores indicada para cada posição, de acordo com a versatilidade e atletas da base que podem ser utilizados.

O Atlético também conta com o CIGA para identificar a demografia ideal do elenco, como faixas de idade e salariais, possíveis evoluções de jogadores da base, ativos (atletas com possibilidade de venda), entre outros pontos.

Para isso, os jogadores do elenco são analisados constantemente a partir de dados como impactos ofensivos e defensivos, fisicalidade, desempenho técnico e tático, custo por mês de acordo com importância para o time, entre outros. O acompanhamento de atletas emprestados é mais uma responsabilidade do setor na montagem do elenco.

Por fim, o CIGA auxilia em pontos extracampo, como na otimização de processos e na montagem do orçamento da SAF. Ao fim do encontro com jornalistas, Rodrigo Weber disse acreditar que o Atlético está entre os clubes que mais investem no departamento de análise e, com isso, tem softwares, processos e profissionais do mais alto nível no futebol brasileiro. A confiança no setor é tão expressiva que o clube pretende ampliá-lo de forma gradual ao longo dos próximos anos.

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