
O processo de transformação do Atlético em Sociedade Anônima de Futebol (SAF) gerou diversas dúvidas aos torcedores. Naquele período, em debates nas redes sociais, alguns apontavam falta de transparência da diretoria acerca das trativas e acusavam conflito de interesses na negociação – já que, no fim das contas, os investidores que geriam a instituição àquela altura se tornaram também os compradores do clube-empresa alvinegro. Ao tratar o tema no último sábado (7/6), o empresário Rafael Menin demonstrou chateação com a acusação e a classificou como uma “injustiça gigantesca”.
Em novembro de 2023, o grupo que ficou conhecido como Galo Holding comprou 75% das ações da SAF do Atlético por meio de um aporte de R$ 913 milhões. Deste montante, R$ 313 milhões correspondiam a um perdão de dívida do clube com a família Menin.
Além de Rubens e Rafael, empresários do ramo da construção civil, o clube-empresa alvinegro contra com outros nomes reconhecidos no mercado. Os banqueiros Daniel Vorcaro e Ricardo Guimarães, além de Renato Salvador (empresário da área da saúde), também estão diretamente envolvidos na definição dos rumos do Atlético.
Naquela oportunidade, o clube contou com auxílio da Ernst & Young para serviços de auditoria e consultoria. O processo terminou com avaliação do Galo e de seus ativos em R$ 2,1 bilhão.
A acusação de conflito de interesses ganhou força nas redes sociais especialmente em virtude dos moldes em que a negociação foi fechada. No acordo para transformação em SAF, a Galo Holding assumiu controle sobre o departamento de futebol do Atlético, a Arena MRV e a Cidade do Galo – centro de treinamentos do clube em Vespasiano, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Rafael Menin desabafa sobre acusação
Em entrevista coletiva concedida no último sábado, na Arena MRV, Rafael Menin foi questionado pelo No Ataque sobre o tema. A pergunta também colocava em dúvida: por que a SAF do Atlético não teve (ou não apresentou aos torcedores) garantias de investimento mínimo ou de performance esportiva nos anos subsequentes?
Na resposta, Rafael Menin demonstrou chateação com a acusação de conflito de interesses vinda de torcedores. O longo desabafo do empresário contou com afirmações de que a família Menin ainda não teve benefícios financeiros reais com a negociação e que o sentimento de amor pelo clube levou os atuais donos do clube-empresa atleticano à decisão. Leia a seguir.
O desabafo de Rafael Menin sobre possível “conflito de interesses” na SAF do Atlético
“Foi um processo que levou mais de um ano. A gente (família Menin) é apaixonado pelo Galo, mas naquele momento não era projeto nosso ser sócio da SAF. A gente escuta algumas pessoas: ‘Ah, eles querem ganhar dinheiro do Atlético’. Acho que a família teria formas de alocar esse grande capital que foi colocado aqui dentro e, talvez, ter uma remuneração melhor. Mas fato é que a gente passou por um processo muito longo. A gente foi assessorado por EY, BTG, grandes advogados. Seguimos um rito muito formal, muito organizado. O Conselho (Deliberativo) sempre foi informado desse rito.
Felizmente ou infelizmente, ao fim desses meses, meses e meses de trabalho, dada a condição do Atlético naquele momento, não apareceu ninguém com uma proposta formal e com uma garantia de recurso que pudesse fazer o aporte de R$ 1 bilhão. Ninguém. E a gente já estava aqui dentro. Era uma batata quente que você não faz ideia. Pensa em uma situação difícil! Agora, coloca ao quadrado essa situação difícil. Era a situação do Galo. Então, nós tivemos que resolver. ‘Já que não tem ninguém seremos nós’. Quando começou esse projeto, era intenção nossa? Não era. Nós já falamos isso outras vezes. Meu pai (Rubens Menin) já falou, eu já falei, que nunca foi intenção nossa. A gente queria ser uma ponte para um Galo saudável e sustentável. Não conseguimos.
Quando falam assim: ‘Ah, não houve transparência’ ou ‘falta de lisura’… É um termo ruim, sabe? Eu falei um pouquinho aqui de difamação, e é um pouco sobre isso. Quem não conhece tudo o que se passou, como foi a dinâmica no Conselho… Quem afirma isso, está fazendo uma difamação. São pessoas que trabalharam décadas para construir uma reputação fora do futebol, que não é fácil de ser construída. Se foi construída é porque, ao longo dos anos, ao longo das décadas, essas pessoas acho que fizeram um bom trabalho na sociedade – não só mineira como brasileira.
De novo: a gente não se arrepende. ‘Tem gente tirando dividendo’. Nunca teve um dividendo do Atlético. Pelo contrário. Nunca houve na história do futebol brasileiro uma família que colocasse tanto dinheiro em um clube de futebol. Com todo respeito à Leila (Pereira, do Palmeiras) e ao Paulo Nobre, a Leila colocou ou emprestou R$ 150 milhões para o Palmeiras. Com correção. Ela já recebeu. O Paulo Nobre… São dois dirigentes bacanas, exemplares. Mas que emprestaram dinheiro com CDI (Certificado de Depósito Interbancário) e receberam dinheiro depois. Aquela dívida nossa que foi convertida em aporte, de R$ 300 e tantos milhões, que ficou aqui durante cinco anos, não teve um centavo de correção. Um centavo.
O terreno no qual essa Arena foi feita a nossa família comprou e doou para o Atlético. E aí, tem algumas coisas importantes. ‘Pô, mas o terreno a família comprou da MRV’. Qual é o percentual que a família tem da MRV, você sabe? A gente tem um terço da MRV. São 70 mil acionistas do mundo todo. Um terço é da família, e dois terços pertencem a 70 mil acionistas. A MRV tinha desembolsado um valor x pelo terreno. Diferente do que muitos falam, esse terreno estava no final do processo de licenciamento. A gente levou o tema ao Conselho da MRV, fez um laudo independente e a família pagou quase R$ 50 milhões nesse terreno. O dobro do valor que havia sido desembolsado por ele. Então, a família que tem um terço da companhia foi lá e pagou. Pegou dinheiro do banco, pagou R$ 50 milhões e doou para o Atlético. Vocês talvez não saibam disso.

Sabiam que os R$ 300 e poucos milhões que a gente colocou aqui dentro não tiveram um centavo de correção? Então, gente… Às vezes, a gente faz afirmações muito fortes – de ‘falta de transparência’, ‘conflito de interesses’ -, mas o que houve aqui dentro foi o contrário disso. A gente entrou no Galo em uma situação terminal, assumimos a maior parte dos problemas. R$ 200 milhões de (dívida) Fifa, só pepino que você não faz ideia. Colocamos R$ 300 e poucos milhões, doamos o terreno de R$ 50 milhões, avalizamos os famosos empréstimos bancários. Chegamos a avalizar quase R$ 800 milhões em nosso nome.
Isso é outra coisa: ‘Pô, por que é que não fizeram RJ (recuperação judicial)?’ Porque para o clube sobreviver, estava lá (em contrato): se essa dívida não for paga, quem tem que pagar é a família. Nunca, ninguém no futebol brasileiro, nem de perto, teve uma exposição pessoal de R$ 1,1 bilhão. Nunca. Nunca. O Ricardo (Guimarães) também a mesma coisa. Ele avalizou, colocou dinheiro. Então colocar que essa família teve conflito de interesses no processo é de uma injustiça gigantesca. (…) É o contrário disso.
Hoje a gente enxerga: ‘Pô, vamos tentar fazer como legado. Essa Arena, fazer com que o Galo seja um clube cada vez melhor’. Mas o que a gente passou aqui nos últimos cinco anos vocês não fazem ideia do tamanho do desafio e do problema. Se nós não tivéssemos assumido, entre aporte e aval, mais de R$ 1 bilhão, o clube tinha desaparecido. Poderia ter aparecido outro comprador. Não teria desaparecido, mas teria aparecido um outro comprador. Sei lá quem teria aparecido. Sempre aparece alguém. Mas com qual condição? Como é que se daria? Seria melhor? Acho difícil.
Posso te garantir que tudo foi feito com rito muito correto, com bons assessores, informando ao Conselho, e com a melhor das boas intenções. Quem tiver alguma dúvida, marca aqui, a gente faz um bate-papo só sobre esse tema, porque é um tema que vira e mexe volta e os acionistas ficam tremendamente… ‘Puts, depois de tudo que a gente passou’. Porque a gente é ser humano também, gente, como todos vocês. ‘Depois de tudo que a gente passou, desse sofrimento, a gente ser acusado de falta de transparência, de conflito de interesses’. Isso é algo que magoa muito.
Falar: ‘O elenco é ruim!’ Ou: ‘É bom!’ ‘Não sabe mexer com futebol!’ Isso faz parte do jogo. Isso é opinião. Isso não incomoda em nada. Mas quando fala que tem conflito de interesses, que não teve ética, que sumiram com o dinheiro do Diamond Mall, isso machuca demais. Porque quem está aqui está aqui por amor, por paixão, porque quer fazer o mais bem feito possível, com a maior ética possível. Diferente do que foi feito muitas vezes com esse clube. As pessoas se colocavam em primeiro lugar, e o clube em segundo lugar – ou em terceiro, ou em quarto. A gente sempre colocou o clube em primeiro lugar. Sempre.
(…) Acho que a gente tem que estar mais próximo. Vão ter críticas, vamos errar, vamos aprender. Mas tem uma turma aqui que se mata por esse projeto. Que é apaixonada por esse projeto e que tenta fazer de forma bacana, ética. Sempre querendo fazer o bem. Eu fico muito feliz. Eu vejo aqui a turma: Bruno (Muzzi, CEO), ‘Pedrão’ (Tavares, diretor de competições), Sérgio (Coelho, presidente da associação)… Só tem gente do bem nesse clube. É um ambiente tão saudável. Isso não tem preço. Eu me orgulho muito de fazer parte de um projeto assim, com pessoas tão éticas e bacanas. E assim: nós vamos errar, mas vai dar certo lá na frente. Quando as intenções são boas, quando as pessoas são boas, costuma dar certo.“