Mineiro, belo-horizontino e cruzeirense assumido, Matheus Pereira chegou à Toca da Raposa sob a expectativa de representar o torcedor dentro de campo. Depois de passar três anos na Série B, o Cruzeiro voltou à elite e precisava de uma nova referência técnica, encontrada em um atleta que sempre sonhou em jogar pelo time do coração. Agora, o meia-atacante tem mais uma responsabilidade: carregar o legado da camisa 10 celeste, considerado uma ‘sina’ nos últimos cinco anos.
Nesta semana, Matheus assumiu o número, usado por Nikão na temporada passada. Em seu primeiro desafio com a 10, o meia fez uma grande atuação. Ele deu assistência para o primeiro gol e criou a jogada do segundo na vitória por 2 a 1 sobre o Villa Nova, nessa quarta-feira (24/1), no Alçapão do Bonfim, na estreia do Campeonato Mineiro.
De 2019 para cá, nenhum nome que vestiu a 10 obteve sucesso. A crise financeira e política vivida pelo Cruzeiro influenciou também no desempenho esportivo da equipe, que foi rebaixada de forma inédita à Segunda Divisão. Em um cenário de turbulência completa, poucos foram os nomes que se destacaram.
Diante das grandes expectativas criadas, Matheus ganhou a missão de quebrar a sequência negativa. O meia vai usar a 10 do Cruzeiro em um ano importante para o clube. Após dura reconstrução, a Raposa se classificou à Copa Sul-Americana e sonha em sonha em voltar a conquistar um título internacional.
“A torcida tem que esperar um Cruzeiro forte, que vai entrar para brigar sempre, não pode esperar (qualidade) só de um jogador. É como eu já falei, não sou o salvador da pátria, mas naquilo que eu puder, vou contribuir com o meu melhor e ajudar sempre os meus companheiros”, declarou Matheus após o triunfo diante do Villa.
Quem foram os últimos camisas 10 do Cruzeiro?
O Cruzeiro teve seis camisas 10 nas últimas cinco temporadas: Thiago Neves, em 2019; Rodriguinho e Regis, em 2020; Rafael Sobis, em 2021; Giovanni Piccolomo, em 2022; e Nikão, em 2023. Nenhum desses jogadores permaneceu no posto por mais de um ano.
Herói com a 30 em 2017 e 2018, Thiago assumiu a 10 no início de 2019. Nos primeiros meses, a escolha parecia acertada e até culminou em título mineiro. O clima positivo duraria só até o estouro de escândalo de corrupção nos bastidores do clube, que foi rebaixado ao final do Campeonato Brasileiro.
Destaque nos anos anteriores, quando venceu duas Copas do Brasil, Thiago foi considerado um dos protagonistas da queda do Cruzeiro. Contestado por torcedores, o jogador ainda terminou o Brasileirão afastado das atividades do time por causa de um episódio de indisciplina.
Thiago então deixou o Cruzeiro, e a 10 passou a ser de Rodriguinho. O meia a usou por dois jogos antes de deixar o clube, em janeiro de 2020. De abril até o fim da temporada, estendida devido ao estouro da pandemia de COVID-19, outro jogador da posição vestiu o número. A função foi incumbida a Regis, que teve uma passagem apagada pelo Cruzeiro.
Em 2021, o camisa 10 foi o meia-atacante Rafael Sobis, que já havia atuado anteriormente pela equipe mineira e tinha forte conexão com a torcida celeste. Apesar do vínculo afetivo, o atleta teve atuações pouco expressivas naquele ano, que ficou marcado por ser o último de sua carreira e o centésimo da história do Cruzeiro.
Sobis terminou a trajetória como jogador diante de grande festa dos cruzeirenses. Com a Raposa livre da possibilidade de rebaixamento à Série C, após outra temporada difícil, mais de 60 mil torcedores compareceram ao Mineirão no jogo de despedida. Aquela foi uma das primeiras partidas abertas ao público depois do surgimento do novo coronavírus.
Na campanha do retorno à elite, o Cruzeiro não teve um 10. O meia Giovanni Piccolomo usou o número nos primeiros meses de 2022, mas deixou a Toca da Raposa sem fazer parte do título da Série B.
De volta à Série A, o clube resgatou a camisa 10, que passou a ser de outro meia-atacante belo-horizontino e cruzeirense desde a infância: Nikão. O armador teve ano apagado, com poucos gols e assistências, e deixou o time no fim de 2023.
Últimos grandes camisas 10 deixaram a Toca pela ‘porta dos fundos’
Os últimos grandes camisas 10 do Cruzeiro são estrangeiros. O argentino Walter Montillo usou o número entre 2010 e 2012. Nesse período, foi eleito o melhor meia do Brasileirão, pelo prêmio Bola de Prata (2010 e 2011), e da América do Sul, pelo jornal El País (2012). O sucesso individual, porém, não se refletiu em títulos: o jogador só venceu o Campeonato Mineiro de 2011 nessa passagem.
No início de 2013, Montillo foi vendido ao Santos. A decisão foi tomada à contragosto da torcida celeste, que o via como um potencial ídolo. O término abrupto da relação gerou um desgaste na imagem do meia, que passou a ser taxado por muitos torcedores como ‘mercenário’.
Situação parecida ocorreu com o uruguaio Giorgian de Arrascaeta, alguns anos depois. Entre 2015 e 2018, o meia-atacante venceu três títulos pelo Cruzeiro e marcou vários gols em finais. Ele ganhou o Campeonato Mineiro de 2018 e as Copas do Brasil de 2017 e 2018 – em todas as decisões, balançou a rede pelo menos uma vez.
Tudo corria bem, até que De Arrascaeta não compareceu à reapresentação do clube, no começo de 2019, e pediu para ser vendido ao Flamengo. A saída ‘forçada’ incomodou dirigentes e torcedores da Raposa, pois o armador havia sido decisivo nas duas conquistas do ano anterior.
Assim como Montillo, o uruguaio ficou com a imagem dividida para a torcida do Cruzeiro. Há muitas pessoas que ainda o consideram ídolo, mas uma parte dos cruzeirenses se sentiu traída com a forma como ele se transferiu para o Flamengo.
Matheus Pereira tentará resgatar legado da camisa 10
Para muitas pessoas, a camisa 10 funciona como uma coroa e deve ser designada ao principal jogador do time. E foi isso que ocorreu na maior parte da história do Cruzeiro. Com esse número nas costas, muitos meias se tornaram ícones e levantaram troféus. Foi assim com Dirceu Lopes, Palhinha, Alex… Mas, há cinco anos essa relação já não termina tão bem.
Líder técnico do Cruzeiro do treinador Nicolás Larcamón, Matheus Pereira tentará resgatar o legado dos grandes ídolos celestes e reconduzir o clube à trajetória de títulos.