THE PLAYERS TRIBUNE

Matheus Pereira superou vício em drogas, depressão e reencontrou alegria no Cruzeiro; veja carta

Em depoimento para o The Players Tribune, jogador disse ter reencontrado a felicidade no Cruzeiro depois de vários pensamentos negativos
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Destaque do Cruzeiro em 2024, Matheus Pereira abriu o jogo sobre como superou o vício em drogas e a depressão. Em carta publicada nesta quinta-feira (18/4) pelo The Players Tribune, o camisa 10 contou que começou a fumar maconha quando estava no time principal do Sporting, de Portugal.

“Me juntei à rodinha da maconha e passava muito, muito tempo chapado. Também bebia um monte e gastava o dinheiro que sobrava em baladas. Depois me sentia um trapo, um miserável. Me culpava de um jeito insuportável ao imaginar a tristeza dos meus pais se eles soubessem. Eles me deram uma educação cristã, eu sou filho de um lar cristão, nada a ver com aquilo”.

Segundo Pereira, a sexta-feira era o dia de “enfiar o pé na jaca” ao lado de colegas. “Ao final da tarde, juntávamos num canto e eu era o encarregado de enrolar o baseado. Aquilo fazia eu me sentir o cara, forte, sabedor de todas as respostas”.

Chegou um momento, porém, em que o jogador disse “não”, pois queria estar bem para enfrentar o Benfica no dia seguinte. Coincidentemente, Matheus revelou ter sido sorteado para fazer o exame antidoping. “Se fosse em qualquer outra partida da temporada ia dar merda. Naquela, não. De novo eu pensava nas minhas chances”.

Matheus Pereira no Sporting - (foto: AFP/PATRICIA DE MELO MOREIRA)
Matheus Pereira no Sporting (AFP/Patrícia de Melo Moreira)(foto: AFP/PATRICIA DE MELO MOREIRA)

A ida para Portugal

Matheus se mudou aos 11 anos para Portugal. O pai, vendedor de consórcios para carro, e a mãe, que trabalhava como faxineira, buscavam uma vida melhor na Europa.

Natural de Belo Horizonte, Pereira, que tem quatro irmãos, também residiu em Governador Valadares. A busca por novos ares teve mais um motivo: a fuga dos perigos no Brasil em meio à influência dos tios envolvidos com o tráfico.

O que minha mãe podia fazer? Que outra saída ela tinha? Chegamos no aeroporto em Lisboa e não deu outra: os seis pra salinha da imigração. Deram papel e lápis pros meus irmãos menores desenharem. De cara, eles desenharam um homem.

— Quem é esse?, perguntou o oficial português.

— É o papai.

— E onde ele está?

— Viajou.

Nem deu tempo de contar a mentira que a nossa mãe tinha ensaiado, dizer que a gente estava viajando de férias, só passeando. O oficial falou:

— A senhora não precisa mentir. Só queremos saber a verdade.

— Tá bom. A verdade é que eu e meu marido estávamos desesperados e viemos pra cá tentar uma vida melhor. Deixamos os meninos no Brasil, mas eles começaram a correr perigo lá e eu fui buscá-los, pra ficarmos todos juntos de novo. O pai está aí fora esperando por nós.

— Está bem. Como a senhora falou a verdade, vamos deixar vocês entrarem. Boa sorte em Portugal.

A depressão

Matheus Pereira rodou por vários clubes na Europa. Em Portugal, jogou no Sporting e no Desportivo de Chaves. Na Alemanha, passou pelo Nürnberg. Na Inglaterra, viveu a melhor fase da carreira no West Bromwich Albion, destacando-se tanto na EFL Championship quanto na Premier League.

“O projeto era muito bom — e, na parte financeira, igualmente. Tinha uma cláusula no contrato que obrigava o clube a me comprar por um dinheiraço se eu fizesse 30 jogos ou se o time subisse para a Premier League. As duas coisas aconteceram. Foi o meu melhor momento profissional”.

Matheus Pereira no West Bromwich - (foto: AFP / POOL / MIKE EGERTON)
Antes de chegar ao Al Hilal, Matheus Pereira se destacou pelo West Bromwich, da Inglaterra(foto: AFP / POOL / MIKE EGERTON)

Em duas temporadas, Pereira disputou 77 jogos oficiais e marcou 20 gols, além de contribuir com 23 assistências. O West Bromwich, então, o vendeu para o Al-Hilal, da Arábia Saudita, por 18 milhões de euros (quase R$ 100 milhões).

Se dentro de campo o meia-atacante dava sequência ao bom futebol, fora das quatro linhas lidava com a depressão e os pensamentos de autoextermínio.

Ao The Players Tribune, Matheus Pereira relatou que quase se jogou do 19º andar em um hotel em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, onde estava por empréstimo no Al-Wahda. A esposa o impediu de fazer o pior.

Um dia eu abri a janela do nosso apartamento com vista espetacular e só não me joguei porque a minha esposa foi mais rápida. Ela me agarrou, me puxou pra dentro e a gente ficou um tempão chorando abraçado ali no chão da sala, sabendo que não era o fim — nem o meu, nem o do meu sofrimento.

Matheus Pereira

Superação no Cruzeiro

Quando ainda estava no Al-Wahda, Matheus Pereira se recordou da infância em Belo Horizonte como torcedor do Cruzeiro. “Antes que tudo acontecesse, quando o futebol era só uma alegria imensa e verdadeira, eu brincava de bola querendo ser o Alex, querendo vencer a Tríplice Coroa, mesmo que todos os meus familiares torcessem para o rival”.

O caminho quem me mostrou foram as cinco estrelas mais bonitas do céu. Aquelas cinco que brilham sobre um azul infinito e glorioso. Quando o Cruzeiro me procurou, eu imaginei as cinco estrelas brilhando em cima do meu coração e falei: “Caracaaa, é isso!”. O que pode ser mais autêntico na minha vida do que o Cruzeiro?

Matheus Pereira
Matheus Pereira - (foto: Staff Images / CRUZEIRO)
Matheus Pereira é cruzeirense declarado (foto: Staff Images / CRUZEIRO)

O Cruzeiro anunciou Matheus Pereira em 24 de junho de 2023, inicialmente para um ano de contrato e opção de compra de 12 milhões de euros (R$ 66 milhões). De imediato, o armador se tornou protagonista com sua visão de jogo apurada e a capacidade de colocar os companheiros em boas condições para fazer gols.

Em 31 partidas pelo Cruzeiro, Pereira soma três gols e oito assistências. A diretoria negocia a aquisição definitiva do jogador de 27 anos e, para isso, conta com o apoio do empresário Pedro Lourenço, do Supermercados BH.

Eu tô aqui de prova. A terapia me ajudou demais, e Deus me mostrou uma luz no fim do túnel. No meu caso, a luz das estrelas, que me guiaram na escuridão e recolocaram brilho nos meus olhos. Era o futebol me estendendo a mão — sim, mais uma vez. Por isso, quando cruzei o portão da Toca, em julho do ano passado, eu prometi segurar essa mão com toda força do mundo, ser eternamente grato e retribuir com conquistas a confiança do meu clube de coração.

Matheus Pereira
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