CRUZEIRO

Ricardinho no Cruzeiro: dica de técnico foi crucial para multicampeão virar ídolo

Multicampeão pelo Cruzeiro, Ricardinho revisitou o passado e contou como foi sua caminhada até o futebol profissional

Maior campeão da história do Cruzeiro, com 15 títulos, o ex-jogador Ricardinho revisitou o passado e contou a sua caminhada até o futebol profissional. Nascido em Passos, no Sudoeste de Minas Gerais, em 24 de junho de 1976, o meio-campista chegou à Toca em 1990, após se destacar pelo time infantil do Esportivo, clube de sua cidade, em um amistoso contra a Raposa.

“O Esportivo de Passos jogava a primeira divisão do Campeonato Mineiro, e a gente sempre ia aos jogos. Num desses jogos, entre Cruzeiro e Esportivo, fizemos a preliminar. Terminou o jogo, estávamos passando pelo túnel e um cara me segurou pelo braço. ‘Você tem vontade de jogar no Cruzeiro?’. Eu respondi: ‘muita vontade!’. Era o Salvador Masci, na época presidente do Cruzeiro”, iniciou Ricardinho, em entrevista ao Cruzeiro Cast.

O pai de Ricardinho, que trabalhava como motorista de caminhão em uma usina de cana-de-açúcar de Passos, foi procurado por um funcionário do Cruzeiro. E eles viajaram 350 quilômetros até Belo Horizonte para o teste. O responsável por aprovar o então adolescente de 14 anos foi Eduardo Amorim, meia campeão da Copa Libertadores de 1976, que trabalhava na base celeste.

Mas Ricardinho demorou a ter oportunidades. No primeiro ano na Toca, apenas treinava. Na segunda temporada, precisou fazer novo teste para ser reintegrado ao grupo. Ele só ganhou chances em 1993, quando o juvenil caiu nas mãos do técnico Osvaldo Rossi. Em dado momento, Donizete Amorim, camisa 10 da equipe, subiu ao time principal. O garoto de Passos enfim foi escalado.

“O Donizete Amorim, camisa 10 do time, muito bom jogador, foi para o profissional. Sobrou a vaga dele, e eu entrei como titular. Jogamos contra o Frigoarnaldo, em Contagem, e empatamos por 3 a 3. Eu fiz os três gols. Não saí do time mais. Veio o Campeonato Mineiro, fiz um monte de gol e não passei pelo júnior. No fim do ano, fui chamado para o profissional”.

Ricardinho

A mudança de posição

Ricardinho em ação pelo Cruzeiro no clássico contra o Atlético em 2002

No juvenil, Ricardinho era armador. No profissional, virou volante. O pedido partiu do técnico Ênio Andrade, que aconselhou o garoto de 17 anos a inspirar o seu jogo em Toninho Cerezo. O veterano meio-campista tinha 39 anos na época e era a voz da experiência no Cruzeiro.

“O Sr. Ênio me disse: ‘você corre muito com a bola. Para jogar no meio-campo, não precisa correr muito. Quero que você distribua a bola. Fique de frente para o jogo. Já viu o Cerezo jogar? Observe-o. Ele não dribla ninguém, mas toca a bola e distribui o jogo. Daí me aproximei muito do Cerezo. Fui me adaptando como volante, de frente para o jogo tinha facilidade, e entrei no time principal”.

Toninho Cerezo foi um jogador de muita classe no toque de bola, em lançamentos e finalizações. Ídolo de Atlético, Roma, Sampdoria e São Paulo, ele disputou as Copas do Mundo de 1978 e 1982 pela Seleção Brasileira. No Cruzeiro, marcou seis gols em 31 partidas em 1994, ajudando a equipe a permanecer na elite do Campeonato Brasileiro.

O contato com Ronaldo Fenômeno

(foto: Washington Alves/EM D.A Press - 01/03/1994)
(foto: Washington Alves/EM D.A Press – 01/03/1994)

Ainda na base, Ricardinho acompanhou a chegada de Ronaldo ao Cruzeiro, inicialmente para os juvenis, em janeiro de 1993. No primeiro compromisso, o atacante oriundo do São Cristóvão-RJ fez dois gols em jogo contra o América, a ponto de ser promovido diretamente ao elenco principal, sem sequer integrar os juniores. O ex-volante relembrou o começo do camisa 9 na Toquinha.

“O diretor do Cruzeiro falou com a gente: ‘Vai chegar um centroavante do Rio de Janeiro, que foi contratado. E ele vai jogar com vocês contra o América’. O centroavante nosso era um dos artilheiros. Ele disse: ‘vai sair o centroavante e entrará o Ronaldo’. E a gente não conhecia quem era Ronaldo, não tinha visto treinamento, nem nada. Ele chegou e foi para o jogo. Contra o América, já fez dois gols, daquele jeito, avassalador, levando todo mundo, muito técnico. No intervalo do jogo, o diretor do América disse que era para tirar o Ronaldo para ficar juvenil contra juvenil, porque ele era muito acima”.

Ricardinho, ídolo do Cruzeiro, sobre Ronaldo Fenômeno

Ronaldo marcou 56 gols em 58 jogos em pouco mais de um ano no Cruzeiro. Vendido ao PSV Eindhoven, da Holanda, após a Copa do Mundo de 1994 (US$ 6 milhões), o Fenômeno foi substituído justamente por Ricardinho em sua última partida pela Raposa, no empate por 1 a 1 com o Botafogo, em amistoso no dia 7 de agosto, no Mineirão.

Titular, goleador e multicampeão

Ricardinho - (foto: Euler Junior/Estado de Minas -20/03/2001)
Ricardinho ganhou prêmios individuais no Cruzeiro, entre os quais a Bola de Prata pelo desempenho no Brasileirão em 1996 e 2000(foto: Euler Junior/Estado de Minas -20/03/2001)

A partir de 1995, Ricardinho jogou com regularidade no Cruzeiro e contribuiu para a “reinvenção” da posição. O volante franzino e de baixa estatura era o “motor” da equipe, pois costumava levar vantagem na velocidade. Além disso, destacava-se pela qualidade nas finalizações, sobretudo em chutes de longa distância e cobranças de falta. Sua presença em campo era uma arma extra para o time, que não dependia somente de armadores e atacantes para fazer os gols.

De 1994 a 2002 pelo Cruzeiro, Ricardinho ganhou Copa Libertadores (1997), Copa do Brasil (1996 e 2000), Campeonato Mineiro (1994, 1996, 1997 e 1998), Recopa Sul-Americana (1998), Copa Sul-Minas (2001 e 2002), Copa Ouro (1995), Copa Master (1995), Copa Centro-Oeste (1999), Copa dos Campeões Mineiros (1999) e Supercampeonato Mineiro (2002).

Contando a segunda passagem, em 2007, o volante jogou 441 vezes e marcou 46 gols – a maioria em arremates de fora da área. Por ser magro e ágil, ele recebeu o apelido “Mosquitinho Azul” do locutor esportivo Alberto Rodrigues, que narrava os jogos do Cruzeiro para a Rádio Itatiaia.

Veja abaixo um compilado com gols de Ricardinho pelo Cruzeiro

Copa do Brasil de 2000

O ano mais artilheiro de Ricardinho no Cruzeiro foi o de 2000, quando contabilizou 13 gols em 68 jogos. Naquela temporada, a Raposa conquistou a Copa do Brasil de forma invicta, deixando para trás Gama, Paraná, Caxias, Athletico-PR, Botafogo, Santos e São Paulo. O time ainda competiu no Campeonato Mineiro (vice), na Copa Mercosul (quartas de final) e no Campeonato Brasileiro (liderou a primeira fase e caiu para o Vasco na semifinal).

A Copa do Brasil de 2000 é vista como um dos troféus mais representativos do Cruzeiro devido às circunstâncias da final contra o São Paulo. O jogo de ida, no Morumbi, terminou empatado por 0 a 0. Ricardinho esteve perto de balançar a rede nesse duelo, já que carimbou uma bola na trave esquerda de Rogério Ceni no segundo tempo em batida de falta de “três dedos”.

No confronto de volta, diante de 85 mil torcedores no Mineirão, o São Paulo começou ganhando já na etapa final, com gol de Marcelinho Paraíba. Entretanto, o Cruzeiro lutou até o fim e conseguiu a virada. Fábio Júnior empatou aos 34 minutos do segundo tempo com assistência de Müller em jogada iniciada por Ricardinho. E Geovanni fez 2 a 1, aos 44, cobrando falta.

Geovanni e Ricardinho na final da Copa do Brasil de 2000 entre Cruzeiro e São Paulo - (foto: Paulo Filgueiras/Estado de Minas - 09/07/2000)
Geovanni e Ricardinho na final da Copa do Brasil de 2000 entre Cruzeiro e São Paulo(foto: Paulo Filgueiras/Estado de Minas – 09/07/2000)

“O Müller entrou pilhado, pedindo a bola. Houve um lance em que eu toquei a bola para o Müller, ele fez a parede, tocou para o Fábio e saiu o gol. Depois, o Axel (volante do São Paulo) estava de costas, eu acelerei em cima dele para tentar tomar a bola, forçando o recuo. E o Geovanni, na velocidade que estava, passou o Rogério Pinheiro e iria fazer o gol”, recordou Ricardinho.

“As faltas de longe, eu batia. E o Geovanni, mais colocado. Mas o Müller disse que era para bater em cima da barreira, forte. Assim que ele pediu para bater forte, o Geovanni chutou forte. E o Donizete Oliveira deu uma empurradinha na barreira. Nesse tranco, a bola passou debaixo da perna de um deles. E o Rogério ficou desolado. Se o Donizete não empurra, talvez a bola batesse na perna de um dos jogadores do São Paulo e voltasse”.

Ricardinho, sobre o gol do Cruzeiro na final da Copa do Brasil

Aposentadoria e parceria com Pedrinho BH

Ricardinho saiu do Cruzeiro em agosto de 2002, aos 26 anos, para o Kashiwa Reysol, do Japão – que também havia levado o técnico Marco Aurélio e o atacante Edílson Capetinha. O volante ficou no futebol japonês por cinco temporadas, retornando ao Brasil em 2007 justamente para defender a Raposa.

A segunda passagem pela Toca foi dificultada por uma lesão crônica no tornozelo. O Mosquitinho até tentou seguir no futebol ao se transferir para o Corinthians, mas as limitações físicas comprometeram a parte técnica. Assim, a aposentadoria dos gramados ocorreu de forma precoce, aos 31 anos.

Ricardinho pelo Cruzeiro em 2007 - (foto: Juarez Rodrigues/EM D.A Press - 26/06/2007)
Ricardinho pelo Cruzeiro em 2007(foto: Juarez Rodrigues/EM D.A Press – 26/06/2007)

Ao parar de jogar futebol profissionalmente, Ricardinho entrou para o ramo comercial. Ele se tornou proprietário da distribuidora de chinelos “R8”, que trabalha com as marcas Grendene e Ipanema. Seu principal cliente é o atual proprietário da SAF do Cruzeiro, Pedro Lourenço, dono dos Supermercados BH. Segundo o ex-volante, a parceria já dura mais de 11 anos.

“Quando a gente para de jogar futebol, muda totalmente de vida. Realmente é difícil. Parei com 31 anos, muito novo. Numa dessas oportunidades, fui jogar futebol perto da fazenda do Pedrinho BH. Era um futebol beneficente em Abaeté. Encontrei ele e o Bruninho, um pessoal humilde demais, cruzeirenses fora de série. Nessas conversas, ele me pediu para passar no escritório dele”.

“Encontrei o Pedro poucas vezes, trocamos umas ideias, um cara gentil demais. Ele passou metade das lojas para atendermos como distribuidores de chinelos. Conseguimos montar a empresa rapidamente para atender aos Supermercados BH. Distribuímos os chinelos Rider e Ipanema. Sou grato por ele ter acreditado na gente Todos lá dentro são uma simplicidade. Isso foi há 11 anos mais ou menos”, concluiu Ricardinho, que reside com a família em BH e fará aniversário de 49 anos nesta terça-feira (24/6).

Caricatura de Ricardinho, multicampeão pelo Cruzeiro - (foto: Rafael Arruda - 28/10/2017)
Caricatura de Ricardinho, maior campeão pelo Cruzeiro(foto: Rafael Arruda – 28/10/2017)
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