Iniciar a carreira em um grande clube, sair para construir uma sólida carreira ao redor do Brasil e retornar à instituição da juventude pouco mais de dez anos depois para reescrever a história interrompida em outrora é um roteiro raro, que agradaria grande parte dos amantes de futebol, e que poucos puderam realizar. Dentre os felizardos que atingiram tal façanha está Norberto, ex-meia e lateral-direito, revelado pelo Cruzeiro, em 2008, e que retornou ao clube em 2021.
Em entrevista ao No Ataque, o agora ex-jogador revelou detalhes da trajetória pelo clube mineiro, o início de carreira ao lado de grandes jogadores, bem como a espinhosa trajetória da equipe na Série B.
Chegada ao Cruzeiro: camisa 10 e companheiros de renome
Nascido em Brumado, na Bahia, Norberto iniciou a carreira no Santos, período em que foi companheiro de equipe do craque Neymar. Após se destacar na equipe da Baixada Santista, foi visto por Zezé Perrella, àquela altura presidente do Cruzeiro, que o contratou para integrar as categorias de base da Raposa.
Em 2008 o, até então, meio-campista desembarcou em Belo Horizonte e passou a compor um time de atletas que viriam a construir boas carreiras no futebol profissional, como o meia Bernardo (ex-Vasco, Santos e Palmeiras), o lateral Diego Renan (terceiro melhor lateral-esquerdo do Campeonato Brasileiro de 2010, pelo Cruzeiro) e Dudu (ídolo do Palmeiras e atualmente jogador do Atlético).
“Vim para o Cruzeiro comprado. Eu estava na base do Santos, inclusive treinei um pouco com o Neymar lá. O Zezé Perrela era o presidente do Cruzeiro nessa época e comprava muitos jogadores na base. Ele me comprou do Santos e ali comecei a jogar com jogadores como Bernardo, Dudu, Diego Renan, que jogou no profissional também, e o Eliandro que também jogou no profissional.”
No ano seguinte a equipe fez uma boa campanha na Copa São Paulo de 2009 e chegou a eliminar o Santos, que contava com grandes jogadores como Alan Patrick (meia do Internacional) e Neymar, com uma vitória por 2 a 1, nas oitavas de final do torneio.
A promissora equipe celeste, no entanto, foi surpreendida e caiu precocemente na competição, ao ser superada pelo Athletico Paranaense, em um jogo recheado de viradas, que terminou 5 a 4 para a equipe do Sul do Brasil.
“Tínhamos um time muito forte, fizemos uma Copa São Paulo e fomos eliminados em um jogão contra o Atlético Paranaense, no finalzinho, com uma virada. O sentimento é de que poderíamos ter sido campeões daquela Copa, mas infelizmente saímos de forma prematura pela qualidade time que tínhamos na época.”
Transição do meio-campo para a lateral
Em 2010, Norberto deixou o Cruzeiro para jogar no América de Natal. Àquela altura o atleta jogava como camisa 10, mas ante a jovialidade e ausência de oportunidades, aceitou o desafio do treinador Flávio Araújo e passou a atuar na faixa lateral do campo.
“Eu não tive a oportunidade de jogar no profissional do Cruzeiro e acabei sendo emprestado para alguns times, até que no fim do meu contrato apareceu oportunidade de ir para o América de Natal disputar a Série B de 2010.
Eu treinava muito bem, mas ficava no banco. Até que os dois laterais do time machucaram, na época o Flávio Araújo, que era o treinador do time, jogava com três zagueiros e alas, na época estava em alta isso, vindo do São Paulo lá 2006 e 2007, jogávamos em um 3-5-2.
Pela minha característica ofensiva, ele perguntou se eu poderia jogar de ala contra o Campinense, em Campina Grande, e eu, querendo uma oportunidade de jogar fui para o jogo, eu fiz um gol de perna esquerda e depois disso joguei toda a Série C de ala, fui campeão Estadual, joguei a Série B de 2010, fui destaque como lateral, fui me adaptando à lateral e joguei assim durante toda a minha carreira.”
Carreira, parceria com Mozart e retorno ao Cruzeiro
Como lateral, Norberto construiu uma carreira de sucesso por clubes brasileiros. O atleta foi campeão estadual em quatro estados (Alagoas, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte), por CSA, Vitória, Sport e América-RN.
E foi na equipe alagoana que Norberto conheceu o treinador que seria um dos responsáveis por seu retorno ao Cruzeiro: Mozart, que comandou a Raposa em 2021 e fez o convite para o ex-lateral mudar de clube.
Ao No Ataque, o ex-lateral-direito detalhou como se deu a parceria entre os dois no CSA e, posteriormente, na equipe mineira, em meados de 2021.
A vontade de voltar à Toca da Raposa era tão grande que Norberto não hesitou em “enfrentar” a possível resistência que poderia surgir em razão da rivalidade criada a partir do descenso do Cruzeiro à Série B, em 2019, eternizado pelo polêmico pênalti perdido por Thiago Neves, bem como pelo áudio vazado entre o ex-camisa 10 e a diretoria cruzeirense.
“O retorno ao Cruzeiro é algo até difícil de explicar. Trabalhei com o Mozart no CSA e foi uma grata surpresa, cresci muito como jogador, mesmo aos 30 anos.
Quando ele foi ao Cruzeiro, o clube precisava de um lateral e ele me chamou. Na época eu era capitão do CSA, estava numa fase muito boa e havia uma pequena rivalidade relacionada ao caso do “Fala, Zezé”, do Thiago Neves, e os dois times jogavam a mesma divisão.”
Realização de um sonho, identificação e encontro com ídolos
Mesmo com o momento conturbado vivido pelo Cruzeiro à época (salários atrasados e demais dificuldades institucionais), Norberto define a transferência ao clube que lhe revelou como um “sonho realizado”.
“E era um sonho poder jogar no Cruzeiro profissionalmente, que pude realizar. O clube estava em um momento muito conturbado com salários atrasados, dificuldades, o Mozart não conseguiu implementar o estilo de jogo dele, até por ser um clube muito grande, de muito peso, é muito diferente, é um clube gigante. Eu queria que pudesse ter dado mais certo, que o nosso time tivesse encaixado mais, que tivéssemos subido, mas vestir aquela camisa para já foi um sonho, por desde a base ter alimentado aquilo e ter conseguido aos 31 anos de idade”
O atleta rememorou situações da juventude, em que consolidou a identificação com o clube a partir de cânticos antes das partidas. Para além disso, a “cereja do bolo” foi poder partilhar momentos com atletas como o goleiro Fábio e os atacantes Rafael Sobis e Marcelo Moreno, que, até então, eram seus ídolos, e já brilhavam no cenário do futebol nacional enquanto Norberto apenas sonhava em se profissionalizar.
“Voltar ao Cruzeiro foi a realização de um sonho. Eu joguei na base, joguei campeonatos cantando o hino do Cruzeiro e criei uma grande identificação e emoção.
Poder jogar profissionalmente ao lado de Fábio, que eu via quando era da base e já era ídolo do Cruzeiro, Rafael Sobis, Marcelo Moreno…jogadores que eram ídolos para mim, que vi jogar desde cedo.
Então, mesmo com todo o momento conturbado, aquilo foi o ápice, poder vestir aquela camisa e representar aquelas cores foi um sonho realizado.”
Cruzeiro na Série B em 2021: por que não subiu?
Apesar de ter realizado um sonho, Norberto lamentou o fato de o resultado obtido pelo Cruzeiro não ter sido satisfatório na Série B de 2021.
Àquela altura, a Raposa ocupou a 14ª colocação, com 48 pontos, apenas cinco a mais que o Remo, primeiro time na zona de rebaixamento.
Para o ex-lateral, que fez 16 partidas naquele ano, o elenco celeste tinha plenas condições de conquistar o acesso, porém os problemas da Raposa extrapolavam as quatro linhas. Assim, salários atrasados e mudanças de treinador, por exemplo, teriam sido causas para o insucesso do clube mineiro.
“O Cruzeiro tinha peças muito boas, era para conquistar o acesso tranquilamente naquele ano. Eram jogadores de renome, de qualidade, nosso time, no papel, era para estar jogando a Série A de forma tranquila.
Mas as coisas desandaram, a pressão extracampo, os salários atrasados, as mudanças de treinador, foram três ou quatro treinadores no mesmo ano e, com isso, não se consegue dar uma cara para o time, nosso time não tinha uma forma de jogar e em um campeonato disputado fisicamente como é a série B, você precisa ter um padrão para fazer um bom campeonato.”
O ex-jogador disse, ainda, que a chegada de Wanderlei Luxemburgo foi positiva para os jogadores. No entanto, faltava tempo para lutar pelo G4.
“O Luxemburgo chegou, um grande treinador, foi um enorme prazer poder ter trabalhado com ele, mas o nosso time não tinha tempo para consertar as coisas. A reorganização só aconteceu no ano seguinte.”
Norberto no Cruzeiro
Norberto teve passagens pelo Cruzeiro em 2008 e 2021. Na primeira, com 18 anos, ele integrou as categorias de base da Toca da Raposa.
Em 2021, Norberto participou de 16 partidas oficiais. Ele integrou o elenco do Cruzeiro no ano do centenário.
