Primeira mulher trans a jogar e a ganhar a Superliga Feminina de Vôlei, a oposta Tifanny não teve a participação autorizada no Mundial de Clubes Feminino de Vôlei. Mas a torcida do Osasco fez questão de lembrar-se em alto e bom tom dela antes da estreia da equipe na competição, na noite desta terça-feira (9/12), no ginásio do Pacaembu, em São Paulo.
Quando o time entrou em quadra para aquecer, Tifanny subiu à arquibancada e foi tietada por alguns torcedores, enquanto a arena cantava “É, Tifanny!”. No anúncio da escalação, os torcedores voltaram a entoar o mesmo canto para a ícone da equipe, decisiva nos títulos do Campeonato Paulista, da Copa Brasil e da Superliga de 2024/25, além da Supercopa de 2025/26.
— galo liverpool (@liverp46658) December 9, 2025
Imediatamente antes do saque inicial, mais um coro entoou o nome da atacante de 41 anos – que está concentrada com o elenco em hotal na capital paulista, mas não pode jogar.
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O ‘caso Tifanny’
No final de novembro, Tifanny ficou de fora da lista preliminar do Osasco para o Mundial devido à exigência feita pela Federação Internacional de Voleibol (FIVB) da realização de “mais testes” para atletas transgênero.
Os resultados dos testes não foram divulgados pela entidade, que escolheu não se pronunciar sobre o caso. Apenas na manhã da estreia, nesta terça, saiu a decisão final – na lista decisiva de inscritas para o Mundial, o nome de Tifanny não estava lá.
A história de Tifanny
Tifanny iniciou sua carreira no vôlei masculino, em que chegou a defender o Juiz de Fora e iniciou oficialmente o processo de transição de gênero no final de 2012, fora do Brasil. Ela se submeteu a dois procedimentos cirúrgicos e a tratamento hormonal para diminuição dos seus níveis de testosterona, o principal hormônio sexual masculino.
Em 2017, a Federação Internacional de Vôlei (FIVB) autorizou formalmente a oposta a jogar em campeonatos femininos regularizados pela entidade e, ainda naquele ano, tornou-se a primeira mulher trans a jogar a Superliga Feminina, á época pelo Bauru. Quatro anos depois, ela se transferiu para o Osasco, onde fez história em 2024/2025 com a conquist da Tríplice Coroa: Campeonato Paulista, Copa Brasil e Superliga.
Mesmo seguindo a regulamentação do Comitê Olímpico Internacional e fazendo exames regulares, que atestam que ela está bem abaixo do nível máximo permitido de testosterona por litro de sangue, Tifanny foi alvo de muito preconceito até no meio do vôlei, entre jogadoras e ex-jogadoras e até o técnico Bernardinho.
O treinador da Seleção Brasileira Masculina de Vôlei disse, em 2019, após ponto da oposta contra seu time, o Rio de Janeiro (atual Flamengo), a seguinte frase: “Um homem, é f***”. Depois da repercussão negativa após ser flagrado em câmera, ele se desculpou com a atacante. Em 2018, a oposta Tandara, que à época jogava no Osasco e na Seleção Brasileira, também se declarou contra a presença dela na Superliga, sob a justificativa vaga de que “a puberdade dela se desenvolveu no sexo masculino”.
Com o passar dos anos, embora tenha seguido sofrendo com preconceito, a jogadora passou a ser mais aceita na Superliga e chegou a ser cotada na Seleção Brasileira devido ao bom desempenho na Superliga. A convocação nunca aconteceu, mas ela atingiu feito mais importante: abriu portas para as mulheres trans no vôlei – e no esporte em geral – brasileiro.