
Uma “carência enorme”. É dessa forma que Zé Roberto Guimarães vê o atual cenário de levantadoras da Seleção Brasileira Feminina de Vôlei, que conta com as já veteranas Macris e Roberta, de 36 e 35 anos, respectivamente, no elenco que disputará a Liga das Nações de Vôlei (VNL). Em entrevista exclusiva ao No Ataque, o histórico técnico fez questão de destacar o porquê dessa falta de opções na posição e ainda apontou a solução para o vôlei brasileiro: investir na base.
A Seleção Brasileira iniciará a disputa da VNL em 4 de junho, quarta-feira, no Rio de Janeiro, com uma reformulação, tanto que só três atletas convocadas para essa etapa têm mais de 30 anos – veja a lista no fim da matéria. Só que as duas jogadoras mais velhas são justamente as levantadoras, posição que o Brasil ainda não conseguiu promover uma renovação.
Enquanto Macris e Roberta são as opções vistas como ideais para Zé Roberto Guimarães, a melhor levantadora da Superliga Feminina 2024/25 foi Dani Lins, atleta de 40 anos do Bauru que está fora da Seleção. Ou seja, os melhores nomes para a importante função do vôlei estão com idade avançada, e o técnico da Seleção Brasileira não hesitou ao apontar a razão.
“Falta de trabalho de base. Esse é o grande problema. Eu vejo times investindo na categoria adulta e pouco trabalho na base. Então o que que acontece quando você tem pouco trabalho na base? Você não tem quantidade. É o que acontece de ruim no vôlei brasileiro há algum tempo. Sempre temos que abrir os olhos em relação a isso, porque falta material. Grandes times precisam ser grandes formadores. A gente precisa disso. Nós estamos com uma carência enorme de levantadoras”
Zé Roberto Guimarães, em entrevista exclusiva ao No Ataque
Na sequência, o treinador da Seleção há 22 anos – assumiu em 2003 – falou sobre a utilização de outras jogadoras. Para José Roberto Guimarães, é necessário que as atletas tenham um desempenho ainda mais protagonista nos clubes antes de ser opção para o país.
“O pessoal diz assim: ‘Pô, mas tem que dar chance na seleção nacional’. Gente, a menina tem que primeiro aprender a jogar no clube. Não é na seleção nacional que ela tem que que aprender a jogar. Na seleção nacional, ela tem que botar em prática e ter resultado”, frisou Zé Roberto.
Levantadoras promissoras escolheram outro caminho
O principal ponto para Zé Roberto Guimarães é a falta de quantidade, que resultaria em melhor qualidade. Porém, além da questão que envolve as categorias de base do vôlei brasileiro, o técnico falou sobre as escolhas de algumas jogadoras por irem a grandes times devido à parte financeira, mas sem ter o mesmo protagonismo.
“A gente teve algumas algumas coisas [atletas promissoras] que acabaram não acontecendo pelas opções de irem para clubes e ficarem no banco, sem jogar. Aí é difícil porque levantadora, principalmente, precisa conseguir espaço para poder jogar, sobressair, melhorar, evoluir, perder, ganhar, mas viver aqueles momentos, treinar com bons treinadores. E isso faz parte do processo delas. Mas algumas levantadoras escolheram ir para times grandes e ficaram no banco. E elas poderiam ter evoluído ao jogar em times menores. Ganhariam menos dinheiro, mas investiriam mais na carreira. É uma escolha”
José Roberto Guimarães, técnico da Seleção Brasileira
“Agora, a gente tá sentindo um gap muito grande, porque não tem tantas levantadoras aparecendo aí. Porque essas levantadoras que a gente esperava que fossem aparecer, acabaram escolhendo de ficar no banco dos seus times e não jogaram. Eram jogadoras promissoras para o futuro”, concluiu o treinador.
Aos 70 anos, José Roberto Guimarães é uma lenda do vôlei mundial e é o único brasileiro da história a conquistar três ouros olímpicos. Ele era treinador do time masculino em Barcelona 1992 e do feminino em Pequim 2008 e Londres 2012 – também ficou com a prata em Tóquio 2020 e bronze em Paris 2024. Acompanhe o No Ataque nos próximos dias para ver mais repercussões da entrevista exclusiva.
Restante da fala de Zé Roberto Guimarães sobre levantadoras brasileiras e falta de base
Em meio à fala, Zé Roberto ainda fez outros comentários sobre as levantadoras do vôlei brasileiro, a falta de base e até o investimento maior nos Estados Unidos. Veja os trechos restantes abaixo.
Os times no Brasil e a crítica por falta de base
“Nós cometíamos um erro muito grande. Os grandes times do Brasil não tinham a obrigatoriedade de ter time de base. Osasco, Rio de Janeiro, eles não não trabalhavam na base. Agora, o Sesc Flamengo tem base. Não era esse time de Osasco que tinha tinha base, era o Bradesco. Você tinha Barueri, trabalhando na base, botando grana no bolso, São Caetano, Pinheiros. Esses times trabalham muito bem na base, mas são poucos. O Minas tem base, mas poderia também trabalhar melhor. Eu sei que o pessoal vai ficar bravo comigo, mas eu preciso dizer aquilo que eu penso. Eu não posso ficar… Você vê o Praia Clube, que agora voltou a ter base. Algumas jogadoras tinham vindo do Praia porque tinham acabado o trabalho de base lá. Tinham saído. Agora, o Praia voltou a formar”
Utilização das jogadoras da Seleção em relação aos outros países
“‘Ah, mas os outros times fazem isso’… Todas essas jogadoras que jogam, estão fora, seja da Sérvia, seja da Croácia, seja do Canadá. De todos os países, a maioria joga fora. Até recentemente, eu estava trabalhando na Turquia. Tinham três levantadoras turcas que estavam voltando para Turquia após jogar fora, na França, na Alemanha. São boas jogadoras que estão em campeonatos que estão evoluindo, melhorando, e elas tão fazendo as suas experiências, né? E precisa”
Pelo investimento na base, Estados Unidos tinha que dominar, segundo Zé Roberto
“Para mim, os Estados Unidos tinham que ganhar tudo. O pessoal fala: ‘Ah, o Brasil não ganha’… Os Estados Unidos ganharam pouco em relação ao que podia ganhar. Com a quantidade de times, jogadoras e investimento que tem, das instalações que tem, a minha opinião é que ganha pouco. Deveria ganhar muito mais, que nem no basquete masculino e feminino. Um dia fiz a conta, perguntei para a Federação Internacional quantas jogadoras americanas estavam jogando fora dos Estados Unidos. 264. 264 jogadores. Você forma [seleções]… Então, assim, [para o Brasil], falta é a quantidade para a gente ter uma qualidade”
Jogadoras da Seleção Brasileira Feminina de Vôlei na VNL no Rio de Janeiro
Centrais
- Diana, 26 anos, Türk Hava Yollari (THY) -TUR
- Júlia Kudiess, 22 anos, Minas
- Lorena, 25 anos, Flamengo
- Luzia, 21 anos, Barueri
Ponteiras
- Ana Cristina, 21 anos, Fenerbahçe-TUR
- Helena, 20 anos, Flamengo
- Júlia Bergmann, 24 anos, Türk Hava Yollari (THY) -TUR
Opostas
- Jheovana, 24 anos, Barueri
- Kisy, 25 anos, Minas
- Rosamaria, 31 anos, Denso Airybees-JAP
- Tainara, 25 anos, Shanghai Bright-CHI
Levantadoras
- Macris, 36 anos, Praia Clube
- Roberta, 35 anos, Türk Hava Yollari (THY) -TUR
Líberos
- Laís, 29 anos, Flamengo
- Kika, 29 anos, Minas