A atleta mineira de vôlei Heitora Beatriz Freire Santos foi vítima de transfobia durante jogo em Gurupi, Sul do Tocantins. Comentários preconceituosos foram proferidos em direção à jogadora pelo advogado Giovani Fonseca de Miranda, de 65 anos – que foi preso em flagrante, mas liberado em seguida com medidas cautelares. O caso aconteceu no último sábado (25/10), durante partida pela Copa Matrix, competição entre amadores e profissionais.
O time de Heitora, Alpha Formoso, enfrentou o da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB) de Palmas, na quadra da Escola Municipal Luiza Borges. Natural de Tupaciguara, no Triângulo Mineiro, a jogadora, de 29 anos, havia sido contratada uma semana antes do início da competição. Ela joga vôlei desde os 12, é motorista de aplicativo e usa o esporte como forma de renda extra.
“Foi muito constrangedor e humilhante ouvir aquelas palavras e saber que todos sabiam que eram para mim. Questionar o corpo de uma mulher cis, trans ou lésbica, é inaceitável”, disse a atleta, em depoimento à polícia.
Em entrevista ao G1, Heitora afirmou estar “acostumada” a reações do tipo, mas ressaltou: “Nunca foi tão forte”.
“Eu sei que com o tempo a minha mente vai dar uma esquecida, mas nunca sai do coração. Fiz [a denúncia] para incentivar que outras pessoas também tenham coragem. Porque se todas as vezes que isso começar a acontecer a gente tiver coragem de lutar e de buscar o nosso direito, uma hora isso vai diminuir”, disse a atleta.
O advogado Giovani Fonseca de Miranda – marido de uma das jogadoras da equipe adversária – foi preso em flagrante suspeito de fazer ofensas transfóbicas contra Heitora Beatriz. Ele alega que as acusações são improcedentes, e que isso será comprovado ao longo do processo.
Heitora Beatriz, por sua vez, afirmou que as ofensas começaram logo no início do jogo, mas que só percebeu ser alvo delas quando saiu para trocar a joelheira: “Ele [o advogado] falou uma coisa que ele citou órgãos genitais, citou comparações, como se tivesse uma pessoa que não fosse mulher jogando com mulheres”.
Quais as regras para que mulheres trans possam atuar com mulheres cis?
Heitora ressaltou seguir as regras impostas por órgãos superiores para disputar campeonatos com mulheres cis. Essas normas são determinadas por instituições como o Comitê Olímpico Internacional, a Federação Internacional de Voleibol e a Confederação Brasileira de Voleibol.
“Eles exigem que eu tenha 12 meses de exame com a minha testosterona abaixo de 5 nanomoles por litro de sangue. É o primeiro ponto para que eu possa atuar com as meninas cis. Minha identidade de gênero tem que ser reconhecida em firma há pelo menos dois anos, mas nessa competição específica foram pedidos só seis meses de exame, por não ser profissional mesmo, é entre o amador e o profissional”, explicou a atleta.
Como fica o agressor?
Em liberdade provisória com medidas cautelares, o advogado está proibido de se ausentar de sua residência por mais de 30 dias, sem autorização judicial, quando a permanência for conveniente ou necessária para a investigação ou instrução processual.
Ainda, está proibido de frequentar quaisquer eventos esportivos em todo o território nacional e de manter contato com a vítima, além de obrigatoriamente manter distância de pelo menos 500 metros de Heitora.
Giovani Fonseca deve comparecer a todos os atos do inquérito e de um possível processo, sempre que for intimado para comparecimento, além de manter o endereço atualizado.
De acordo com a imprensa local, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Tocantins informou acompanhar o caso e que o encaminhará ao Tribunal de Ética para análise de conduta profissional.
Pronunciamentos
O Alpha Formoso, o AABB Palmas e a Copa Matrix se manifestaram sobre o fato. Externaram apoio à atleta e repúdio ao crime.
Íntegra da nota do time da AABB Palmas
A AABB Palmas reforça que não compactua com quaisquer práticas de discriminação, preconceito ou intolerância, seja de natureza transfóbica, racial, religiosa ou de qualquer outra forma de desrespeito à dignidade humana.
Esses valores estão expressamente previstos no Código de Ética da AABB Palmas, disponível em nosso site, em conformidade com o artigo 5º, parágrafo IV, que estabelece que o Clube ‘atua em consonância com os princípios constantes da Declaração Universal dos Direitos Humanos e com as Políticas Públicas voltadas à equidade de gênero e às pessoas com deficiência’.
A AABB Palmas reafirma seu compromisso com o respeito, a inclusão e a convivência harmônica, pilares que norteiam todas as suas ações e relações institucionais, esportivas e sociais.
AABB Palmas
Íntegra da nota da Copa Matrix
A organização do Copa Matrix 2025 vem a público, com o devido respeito e empatia, manifestar solidariedade à atleta Heitora Beatriz, diante da situação ocorrida durante a partida entre AABB e Alpha de Formoso, neste sábado, dia 25.
Informamos nossa total disponibilidade e apoio à atleta, que foi vítima de transfobia por um torcedor durante a partida.
Situações como a ocorrida não devem ser toleradas, muito menos esquecidas.
Ao tomar ciência da situação, a organização do Copa Matrix 2025 não hesitou em instruir a atleta sobre as medidas cabíveis, além de banir o comparecimento do acusado na sede em que ocorriam os jogos.
Ademais, a organização esteve presente na delegacia no momento de registro do Boletim de Ocorrência, se mantendo à disposição para eventuais esclarecimentos e apoio à atleta.
Em matéria publicada, fora criticada nossa postura referente à punição da equipe AABB. Quanto a isso, informamos que a não punição do time se pautou no fato de a conduta não ter sido cometida por nenhuma das atletas e membros da comissão técnica, sendo inviável que a atitude de um torcedor recaísse sobre a equipe, que dentro de quadra, se manteve com devidos decoro e respeito, não sendo registradas ofensas por parte das jogadoras ou da equipe técnica. Por óbvio, caso o time e sua equipe houvesse demonstrado conivência com a atitude criminosa ocorrida, haveria punição.
Nesse sentido, como já explicado, não houve negligência, muito menos desapoio de nossa parte, que instruímos e acompanhamos toda a situação de perto.
Por todo o exposto, reafirmamos nosso total apoio à atleta Heitora Beatriz, que não merecia ter passado por situação tão difícil, delicada e vexatória, em um momento que deveria ser de diversão e alegria para com os times e suas colegas de quadra.
A transfobia deve ser repreendida de todas as formas possíveis, e qualquer manifestação de preconceito deve ser repelida pelas vias cabíveis. O silêncio jamais deve ser considerado, e atitudes devem ser tomadas, para que assim entendam e respeitem o próximo, sua verdade e sua vida!
Com o devido respeito, empatia e solidariedade, Organização Matrix 2025
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