VÔLEI

A reflexão de Gabi Guimarães sobre a pressão pelo ouro e o ambiente ‘tóxico’ no vôlei

Em entrevista exclusiva ao Olimpicast, podcast do No Ataque, Gabi Guimarães explicou como lida com cobranças por grandes títulos na Seleção

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Capitã da Seleção Brasileira Feminina e uma das melhores jogadoras de vôlei do mundo, Gabi Guimarães precisa lidar diariamente com a pressão da responsabilidade que carrega: ser o grande nome do Brasil na caminhada rumo ao sonho do ouro olímpico. Em entrevista exclusiva ao No Ataque, a ponteira belo-horizontina garantiu, no entanto, que as cobranças e o “ambiente tóxico” gerado por elas não a afetam, pois está blindada mentalmente.

Segunda melhor atleta de vôlei do mundo em 2024, pela Federação Internacional de Vôlei (FIVB), Gabi é a primeira convidada do Olimpicast, novo videocast de entrevistas do No Ataque. O programa está disponível em NoAtaque.com.br e nas plataformas de áudio e vídeo – assista abaixo.

‘Tento me blindar há muitos anos’

Gabi carrega a responsabilidade de capitanear uma das maiores seleção de vôlei do mundo. Bicampeão olímpico no naipe feminino – venceu em Pequim 2008 e Londres 2012 -, o Brasil entra em cada torneio como um dos favoritos ao título, na visão da torcida.

A ponteira belo-horizontina, no entanto, bateu na trave nas oportunidades que teve de conquistar os dois principais títulos possíveis pela Seleção – os Jogos Olímpicos e o Campeonato Mundial.

“O meu maior sonho desde criança sempre foi representar a Seleção Brasileira. E o que falta aí seria uma medalha de ouro olímpica, medalha no mundial também. Acho que são os dois grandes sonhos que eu tenho na minha carreira. Espero realizá-los agora neste ciclo”

Gabi Guimarães, em entrevista exclusiva ao Olimpicast, podcast do No Ataque

Nas duas edições de Jogos Olímpicos que disputou, ela ganhou duas medalhas, mas nenhuma delas da cor mais sonhada: em Tóquio 2020 (disputados em 2021), aos 27 anos, foi prata – a Seleção de Zé Roberto chegou à final, mas perdeu por 3 sets a 1 para os Estados Unidos; já em Paris 2024, foi bronze – os mesmos Estados Unidos eliminaram a equipe, na semifinal.

Já em Mundiais, Gabi amargou o vice-campeonato em 2022, quando o Brasil perdeu a final para a Sérvia; a frustrante sétima colocação em 2018, edição na qual a Seleção sequer foi à fase final; e a terceira colocação em 2014, em que o time foi eliminado para a Itália na semifinal.

“Para ser muito sincera, eu não acompanho tanto essas críticas, cobranças. Eu vejo o pessoal falando bastante, mas eu tento me blindar muito há muitos anos. Quando comecei minha carreira, eu já era uma promessa, então sempre existiu essa cobrança. Quando eu era um pouco mais nova, sofri um pouco mais. Não conseguia entender muito o porquê dessa cobrança, dessas críticas, desse ambiente tóxico.”

Gabi Guimarães, em entrevista exclusiva ao Olimpicast, podcast do No Ataque

“Mas, enfim, com autoconhecimento, com muita terapia também, a gente entende o que que realmente é importante. A autoavaliação e saber qual é a crítica ou cobrança que é mais importante. É do técnico, das companheiras do nosso dia a dia, quando a gente mesmo sai de uma partida e entende o que precisava ser feito ou não”, prosseguiu Gabi, que ressaltou seu papel em ajudar as jogadoras da nova geração a não se deixarem levar pelas críticas de redes sociais.

“Tento levar muito mais para esse lado e é o que eu tento passar para as mais novas também: esse cuidado que temos que ter com as redes sociais. Dizer exatamente o porquê, não tenho muita certeza, mas é triste de ver muitas atletas não só no vôlei, mas em outros esportes também sofrendo muita com essa questão mental das redes sociais por ser um ambiente muito tóxico. Então, o que fica é o meu conselho para essa blindagem, o autoconhecimento que é muito importante e focar no objetivo”

A ponteira ainda citou aprendizado com Bernardinho, técnico com quem foi multicampeã da Superliga pelo Rio de Janeiro: “O Bernardinho fala muito isso: não prestar atenção nos ruídos, focar no trabalho que tem que ser feito e, depois de uma derrota, fazer uma autoanálise, conversar com o técnico sobre o que precisa ser feito e o objetivo é esse.”

‘Seleção está blindada’

Gabi explicou que toda a Seleção Brasileira está blindada em relação às cobranças nas redes sociais e opinou que o “clima tóxico” se deve justamente à posição de favoritismo e a ideia de que o Brasil deve estar “sempre no topo” reforçada pelos torcedores.

“Cada vez mais com a visibilidade das redes sociais, vemos um clima tóxico em muitos esportes: no vôlei, no futebol e outros esportes também. A gente entende esse favoritismo, que todos querem que o Brasil esteja sempre no topo, na busca pela medalha de ouro. Mas eu sinto que  a nossa Seleção está muito blindada. Nós mesmas não saimos satisfeitas em muitos momentos com alguns resultados. Nos cobramos bastante, somos muito competitivas e temos em mente que temos condições de brigar pelo ouro, pelo título.”

Gabi Guimarães, em entrevista exclusiva ao Olimpicast, podcast do No Ataque

“É muito triste realmente ver um ambiente tóxico, mas a gente também recebe muito apoio, muito carinho, né? Você vê nas etapas que jogamos no Brasil, o carinho que a torcida que comparece tem conosco. É isso que levamos. A cobrança, as críticas, esse ambiente tóxico, infelizmente, vão fazer parte, mas o mais importante é sabermos o que precisamos fazer ou não, comissão técnica principalmente, a cobrança que temos internamente. Essa cobrança externa vai fazer parte, não tem muito jeito”, prosseguiu.

“Talvez piore ainda mais com o tempo, com o crescimento das redes sociais e o alcance que se tem. Mas estamos muito focadas no processo, no trabalho, em nos ajudarmos aqui dentro. O mais importante é isso: saber o que precisa ser feito, a nossa dedicação 100% todos os dias aqui dentro”, finalizou.

Frustração na VNL

Assim que chegou ao Brasil após a derrota da Seleção por 3 sets a 1 para a Itália na final da Liga das Nações, a VNL, em julho, Gabi fez forte desabado: “Estou virada desde o jogo, dá para ver no meu semblante a frustração. Temos que valorizar o processo, como eu falo, mas a prata e o bronze mexem demais, fico muito incomodada mesmo. Não saio feliz depois de perder um campeonato, principalmente uma final que você tem chance de vencer.”

“É cabeça erguida ao mesmo tempo no sentido de transformar em motivação, não tem outro caminho. Essa frustração, raiva, chateação, essa “virada” de não conseguir dormir depois de perda de campeonato seja em clube ou seleção, me motiva ainda mais a tentar entender como posso ajudar mais meu desempenho em momentos decisivos, ajudar as meninas a performarem melhor. É não reclamar, não achar desculpas. Não foi fácil, tivemos oportunidades. É olhar para frente e achar soluções”, finalizou ela, na ocasião.

Perguntada sobre a frustração pela falta do “algo a mais” nas decisões pela Seleção, Gabi explicou: “Sou muito competitiva, gosto sempre de ganhar. Então, logo após a partida é difícil estar feliz mesmo que a prata seja muito importante. Sempre falo que não podemos de maneira alguma desvalorizar o trabalho, não é fácil conquistar uma medalha, estar em pódios, principalmente com o nível internacional que vemos hoje. Mas (a VNL) foi mais difícil ainda porque tivemos a oportunidade, começamos ganhando, mas não conseguimos fazer um bom jogo principalmente no ataque.”

Então, fica essa essa dor de entender que tivemos uma grande oportunidade contra uma grande seleção, e conseguimos bater de frente em muitos momentos. Queríamos muito jogar contra a Itália. Era a oportunidade que tínhamos de entender o parâmetro, onde que o nosso time está [em relação à] grande seleção a ser batida. Não podemos desmerecer o trabalho que elas têm feito. Você vê que elas terminam a partida com um time reserva, mas jogando em alto nível ainda assim. Mas para nós é muito importante bater de frente com a seleção que hoje é imbatível e que vem ganhando tudo.

Gabi, ao Olimpicast, videocast do No Ataque

Objetivo até o Mundial

“Agora é entender o que precisamos melhorar, é bola alta, é o contra-ataque, é ser mais efetivo em momentos de dificuldade. E esse é nosso objetivo até o Mundial. No tem essa mentalidade de ‘vamos baixar a guarda’. Muito pelo contrário. Saímos desses momentos ainda mais fortalecidos para buscar o nosso objetivo. E sabemos o que precisa ser trabalhado”, ressaltou a ponteira.

“A gente tem uma comissão técnica muito bem preparada, que já conversou com a gente logo depois da VNL e montou um planejamento de treinamentos. A nossa seleção já teve uma evolução muito grande desde a VNL e esperamos implementar isso na primeira fase de grupos”, finalizou.

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