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Profissionalismo ‘forçado’ e ascensão meteórica: como o Athletic chegou à Série B

Fundado há 115 anos, o Athletic tem dado cada vez mais orgulho a São João del-Rei e irá disputar a Série B do Brasileiro
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No Caminho Velho da Estrada Real, encontra-se a charmosa São João del-Rei, cidade que carrega junto de si parte da história de Minas Gerais. De seus 310 anos de existência, 115 são divididos com o Athletic, clube de futebol que tem dado cada vez mais orgulho à população e espalhado o nome do município nos quatro cantos do Brasil. 

Outrora palco da Guerra do Emboabas, travada no século 18 pela exploração do ouro em território mineiro, a cidade de 90 mil habitantes foi, nesse sábado (19/10), anfitriã da finalíssima da Série C do Campeonato Brasileiro.

Horas antes de Athletic e Volta Redonda entrarem em campo, já se via o listrado alvinegro sob o corpo das pessoas ao redor de São João del-Rei. Ainda que o resultado da partida não tenha sido positivo para os mineiros, a campanha que se encerrou nesse sábado coroa o renascimento de uma equipe que ficou 49 anos afastada do futebol profissional e que tem a volta às principais competições ligadas a uma determinação da Federação Mineira de Futebol (FMF).

Quem conta essa história é Cláudio Gonçalves, que presidiu o Esquadrão de 2013 a 2018. Foi na gestão dele que o Athletic iniciou a crescente que parece estar longe do fim.

“A gente começou em 2016, os diretores da época, que eram o Samuel Rocha e o vice-presidente Cláudio Salomé, convidaram o Fábio Mineiro para ser o captador de recursos no futebol do Athletic. A intenção do Athletic era disputar os torneios da categoria sub-20. Em 2016, nós disputamos o Campeonato Mineiro Sub-20 em uma parceria com o Guarani de Divinópolis, nós entramos com o nome de Guarani, mas mandamos os jogos em São João del-Rei, com o uniforme que tinha o escudo dos dois clubes”, iniciou.

“O presidente do Guarani era o Vinicius (Morais) na época, em um voto de confiança muito grande, com o acerto que ele fez com o Fábio Mineiro, ele permitiu que o Athletic usasse o nome do Guarani. Foi um ano muito bom para nós, evoluímos bem no campeonato. Em 2017 nós disputamos o sub-20 com o nome de Athletic. E aí, em 2018, que era o meu último ano, pleiteamos também, pagamos a taxa de profissionalização, que era de R$ 200 mil, e aí a Federação falou: ‘Para disputar o sub-20, vai ter que disputar o profissional’. Aí foi uma loucura, eu endoidei, o Fábio correu atrás, e a gente conseguiu entrar no profissional.”

Cláudio Gonçalves, ex-presidente do Athletic

Estão vivas na memória as barreiras enfrentadas para a profissionalização. No semblante e nas palavras, Cláudio exalta o orgulho e a felicidade pelo presente. “É momento de celebrar, de comemorar e de festejar”, comentou. O resultado do jogo contra o Volta Redonda, assegura, pouco importava: “É dia de festa para o Athletic, para a região e para o estado. Dia de chorar, abraçar”.

Cláudio Gonçalves (E), ex-presidente do Athletic, ao lado do amigo João Luiz (D), torcedor do clube. Juntos, ele carregam o primeiro troféu da história do Esquadrão - (foto: Leandro Couri / EM / D.a Press)
Cláudio Gonçalves (E), ex-presidente do Athletic, ao lado do amigo João Luiz (D), torcedor do clube. Juntos, ele carregam o primeiro troféu da história do Esquadrão(foto: Leandro Couri / EM / D.a Press)

Ascensão meteórica

Logo no primeiro ano de profissional, o Esquadrão foi vice-campeão do Campeonato Mineiro da Segunda Divisão (equivalente à terceira divisão do estado) e garantiu o acesso ao Módulo II. Em 2020, foi a vez de subir para a elite de Minas Gerais.

A transformação em SAF se deu em 2021, e na temporada seguinte o clube conseguiu feitos históricos e inéditos: chegou à semifinal do Mineiro (caiu para o Cruzeiro) e garantiu vaga na Copa do Brasil e na Série D do Campeonato Brasileiro.

Estar entre os quatro melhores do Estadual se repetiu em 2023 – a eliminação, desta vez, foi para o Atlético. Na Quarta Divisão, avançou até a semifinal e conseguiu a vaga na Série C desta temporada.

O ápice da ascensão foi atingido em 2024. Ainda no começo do ano, o Esquadrão venceu o Troféu Inconfidência, torneio secundário no cenário estadual. Ao eliminar justamente o Volta Redonda, passou da primeira fase da Copa do Brasil pela primeira vez, em sua segunda participação.

O destaque, entretanto, ficou para a campanha na Série C. Após uma primeira fase espetacular, na qual o Athletic terminou como vice-líder, os mineiros repetiram as boas atuações no quadrangular, garantiram vaga na Segunda Divisão e também na final do torneio. O título seria a cereja do bolo.

A festa que o Volta Redonda “estragou”

Escondida entre as casas do Bairro Matozinhos, próximo ao Centro de São João del-Rei, está a Arena Sicredi – o Estádio Joaquim Portugal. Para quem chega de longe, é difícil até identificar as entradas do caldeirão do Athletic. Isso, claro, em dias normais. Nesse sábado, a multidão alvinegra se fez notável: não havia dúvidas, ali jogaria o Esquadrão.

Ainda faltavam horas para o início da partida, mas o clima já era de comemoração. As caixas de som colocadas em cima do palco animavam os torcedores, que aguardavam ansiosos pela chegada dos jogadores. O bom público fez a felicidade dos vendedores ambulantes – apesar de alguns se queixarem da forte concorrência, incomum em outros dias de Athletic. Como na maioria dos grandes jogos, havia também os cambistas, que se esforçavam para se desfazer dos ingressos já esgotados na venda oficial.

Quando o ônibus do clube chegou, a festa aumentou. Os hits do momento deram lugar às canções da torcida, os sinalizadores foram acendidos e uma só mensagem foi passada: “Vamos, vamos Athletic, que esse jogo teremos que ganhar”. Em meio à luz vermelha, andaram os jogadores, concentrados na “guerra” que começaria em breve.

Ao passo que o horário de início do jogo se aproximava, as arquibancadas se enchiam. Por um momento, o sol, sumido há dias em São João del-Rei, deu as caras. Nas arquibancadas, houve quem entendeu aquilo como um sinal de que o objetivo seria conquistado.

Enquanto os times entravam em campo e a torcida aumentava o barulho, as nuvens escuras tomaram apagaram o brilho do céu, e as gotas começaram a cair incessantemente. Mas poderia chover o que fosse, eles permaneceriam firmes na arquibancada, jogando junto dos atletas.

Torcedores do Athletic arrumaram maneiras de se protegerem da chuva, mas sem arredar os pés das arquibancadas

Se o sol era um presságio de coisas boas, a chegada da chuva foi o anúncio da tragédia. A festa pré-jogo seguiu nas arquibancadas, mas em campo a realidade foi outra. O Athletic se mostrou nervoso durante a partida, sem aproveitar as oportunidades criadas, enquanto o Volta Redonda foi eficiente e venceu por 2 a 0.

Ao fim do partida, havia, sim, o sentimento de tristeza pela derrota, mas prevaleceu o orgulho pela história que o Athletic escreve dia após dia. “Time de Guerreiros” foi a alcunha escolhida pelos athleticanos para se referirem ao grupo de jogadores que levaram o clube, que até pouco tempo estava no futebol amador, para a Série B do Campeonato Brasileiro.

Os próximos passos do Athletic

Em São João del-Rei, não há tempo nem motivo para lamentar o vice-campeonato. O foco, agora, são os próximos passos. Nas palavras de Fábio Mineiro, presidente e controlador da SAF do Athletic, são perceptíveis a ambição e o desejo de consolidar ainda mais o clube no cenário nacional.

“Segunda-feira (21) já começam as obras no estádio, que vamos ampliar a capacidade para 8 mil pessoas, para a Série B ano que vem. Vamos concluir os dois campos que já estão em execução (no novo centro de treinamento) e depois começar os outros dois, os dois prédios de performance, para o Athletic ter condição de estrutura ano que vem, tanto para treinar quanto para jogar a Série B”, listou.

Se o Athletic continuará tendo sucesso ou não, é impossível saber, mas uma coisa é certa: o clube tem ressignificado o sentimento dos são-joanenses. Isso fica claro nas palavras de Mateus Augusto, estudante de 21 anos.

“É uma sensação de orgulho muito grande. A sensação de pertencimento à conquista é muito grande também. A gente que apoiou o time em outras fases, na Série D, no Módulo II do Mineiro. Ver agora esse acesso à Série B nos faz sentir parte do clube.”

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