Psicologia

Como o tema saúde mental dos jogadores é tratado por Atlético, Cruzeiro, Minas e Praia?

Clubes de futebol e de vôlei explicam como tratam o bem-estar psicológico dos atletas. Minas Tênis Clube identificou um percentual aumentado de jogadores com sinais de alerta para desenvolvimento de doenças mentais nos últimos anos

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Em ambientes tão competitivos como os do esporte, mais do que nunca é preciso falar sobre o bem-estar psicológico dos atletas, tendo em vista o caso recente do atacante Alisson, ex-Cruzeiro e hoje no São Paulo, que revelou ter pensado em tirar a própria vida. Para conscientização geral sobre a importância do tema, foi celebrado neste mês o Dia Internacional da Saúde Mental. A propósito disso, o Estado de Minas / No Ataque consultou clubes mineiros sobre como o assunto é tratado internamente.

No futebol, o Atlético informou que possui, nos departamentos de base e profissional, “especialistas em psicologia esportiva e assistência social para dar suporte aos atletas desde a iniciação até a equipe principal”.

“No caso do futebol profissional, a psicóloga Michele Rios acompanha todas as atividades do dia a dia, seja em treinos ou em jogos, participando ativamente junto com a comissão técnica. Além das dinâmicas e trabalhos em grupo e coletivos, ela faz acompanhamento individualizado. Importante ressaltar que o trabalho é integrado com o comando técnico da equipe profissional, o departamento médico e a diretoria de futebol”, afirmou o clube, em nota.

No Cruzeiro, há uma diferença no atendimento. Para o elenco profissional, o clube trabalha com uma profissional parceira para atender os atletas. Nas categorias de base, o atendimento é feito por um psicólogo do clube. A comunicação da SAF preferiu não passar detalhes de como o trabalho psicológico é feito.

Por sua vez, o América comunicou que reformula o setor de psicologia e não informou os dados.

Alerta do Minas

O Minas Tênis Clube, que possui equipes profissionais em várias categorias, criou o CESE (Centro de Especialidades da Saúde no Esporte), o qual identificou um percentual aumentado de atletas com sinais de alerta para desenvolvimento de doenças mentais nos últimos anos.

“Uma possível explicação seria o stress que estes atletas foram submetidos durante o período de pandemia com limitações de treinamento, cancelamento de competições e comprometimento de metas. O assunto já foi discutido com equipe de parceiros para um provável aumento de demanda. É provável que este fenômeno possa estar ocorrendo em outros clubes”, destacou o diretor médico do Minas, Mauro Becker Martins Vieira.

Atualmente, o Minas conta com o trabalho direto de quatro profissionais de psicologia do esporte e uma equipe de parceiros para demandas clínicas e psiquiátricas.

Diretor médico do Minas, Mauro Becker Martins Vieira

“O Minas tem uma preocupação não só na assistência de eventos de saúde mental em seus atletas, mas também na prevenção e diagnóstico precoce com identificação de sinais que possam indicar um problema futuro”, destacou Vieira.

O clube mineiro, um dos maiores formadores do esporte olímpico brasileiro, possui trabalho específico feito nas categorias de base.  

“Na base, ocorre uma estratificação dos 12 aspectos relativos às capacidades psicológicas para o esporte, associados à percepção dos treinadores de cada categoria sobre aspectos emocionais e comportamentais de cada atleta. Em função destes dados são definidas as intervenções individuais e coletivas na rotina diária das categorias, bem como a verificação em algumas sessões de treinamento e o acompanhamento em competições chave”, destacou.

Já o atual campeão da Superliga Feminina, o Praia Clube disse que “oferece programas internos dedicados a apoiar nossas equipes de voleibol em todas as categorias”.

O time de vôlei do Cruzeiro foi procurado, mas não respondeu.

Depressão, crises de ansiedade e vitória

Ex-atacante de Atlético e Cruzeiro, Thiago Ribeiro viveu momentos difíceis e sabe a importância do cuidado da saúde mental. Em 2014, quando defendia o Santos, ele perdeu sete quilos e entrou em uma depressão que duraria entre quatro e cinco anos.

“Eu comecei a passar por isso no final de 2014 e sofri com depressão por vários anos, inclusive, quando estava no Atlético, estava passando por esse problema difícil. Foram anos muito difíceis”, disse, em entrevista ao Estado de Minas / No Ataque.

Pior adversário da carreira de Thiago Ribeiro, a depressão minou a saúde e prejudicou a carreira do atacante, que nunca mais foi a mesma. Depois que descobriu a doença, ele ficou longe do sucesso no Atlético e no Bahia.

Na sequência, ele vestiu as camisas de clubes de menor porte, como Londrina, Guarani, Bragantino, Grêmio Novorizontino, Chapecoense, Londrina e Democrata-MG.

Thiago Ribeiro atacante - (foto: AFP)
Thiago Ribeiro, ex-jogador do Cruzeiro(foto: AFP)

O atacante, que hoje está sem clube, descreveu os sintomas. “Eu perdi peso, eu não conseguia me alimentar corretamente. Nos quatro, cinco anos com a doença, tinha problema de vômito, ficava muito ansioso e vomitava constantemente, passava mal quando comia por causa da ansiedade. Foi uma coisa que afetou muito meu preparo físico, afetou muito meu psicológico, eu não conseguia mais render o que poderia”.

Além da ajuda profissional de psicólogos e psiquiatras, Thiago Ribeiro buscou auxílio na fé. Ele se converteu ao protestantismo e se reergueu aos poucos.

“O que eu mais trabalhei foi a minha fé, colocando fé em Deus, sabendo que era um momento difícil e que ia passar, que não ia durar para sempre, confiante para superar esse momento difícil, e sempre tive o apoio da minha esposa e dos meus pais”, disse.

“Eu falava comigo mesmo: isso não está normal, isso não faz parte de mim, eu nunca fui assim, não aceito essa situação e buscava forçava, orava, lia a bíblia, me converti e aceitei Jesus, isso foi me fortalecendo. Fazia meus jejuns com um propósito e comecei a exercitar a minha fé. Não passou do dia para noite, tem que ter bastante paciência e superei”, acrescentou.

Thiago Ribeiro disse que recebeu suporte, mas acredita que os clubes deveriam investir mais na psicologia esportiva. “O Santos me deu todo suporte, me indicou outros profissionais. Mas o que eu percebo, de forma geral, é que há uma preocupação, mas acho que está longe do ideal. Os clubes têm que se interessar mais por isso”, disse. 

“Acho que os psicólogos deveriam conversar mais com os jogadores, não apenas sobre futebol, mas de temas de fora do esporte, saber se a vida dele está bem fora de campo, porque às vezes têm jogadores que não estão bem e ficam com receio de falar alguma coisa. Imagina você falar que precisa ficar fora de um jogo porque a sua cabeça não está boa. Como isso vai ser repercutido na imprensa? Como vai ser repercutido na torcida? Muitas vezes o cara não fala nada e vai para o jogo, não joga bem e ninguém sabe o que está acontecendo”, finalizou.

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