VÔLEI DE PRAIA

Ana Patrícia sobre Marta: ‘Mulher sempre tem que fazer a mais para receber o mínimo’

Parceira de Duda na conquista do ouro no vôlei de praia em Paris 2024, Ana Patrícia tem Marta como grande referência até pelas histórias parecidas

A caminhada não foi fácil, mas elas escreveram os seus nomes na história do esporte não só brasileiro, como mundial. E a semelhança na trajetória faz de Marta uma grande referência para Ana Patrícia. Campeã olímpica no vôlei de praia em Paris 2024, a parceira de Duda Lisboa vê a jogadora de futebol como uma inspiração até pelos esforços para colocar o Brasil no mais alto patamar.

Em entrevista exclusiva ao No Ataque, Ana Patrícia lamentou que ainda “nunca teve nenhum tipo de contato” com a craque do futebol, porém deixou claro: é a grande referência. A atleta nascida em Espinosa, cidade do Norte de Minas Gerais, até destacou quão mais difícil é para uma mulher ser valorizada. Marta foi seis vezes a melhor jogadora do mundo, o que é um recorde no futebol feminino, e conquistou três medalhas olímpicas pelo Brasil – Atenas 2004, Pequim 2008 e Paris 2024.

“Eu sempre coloquei ela nesse lugar de grande admiração, porque eu, enquanto mulher que jogava futebol quando criança, me identifico com muitos preconceitos que ela sempre sofreu, sofro até hoje. Sempre digo que a mulher tem que sempre fazer a mais para ter o mínimo de reconhecimento, então, a história dela, a luta dela sempre foi muito inspiradora para mim, porque eu vivi muito desses preconceitos”

Ana Patrícia, campeã olímpica em Paris 2024 no vôlei de praia

“Por ser mulher, por jogar com homens na minha cidade e acredito que ela também, na época dela. Então, assim, eu acho que essa força que ela teve para passar por cima disso tudo, se tornar o que ela se tornou, que é um ícone do esporte, não tem como, na minha história de vida, não colocar ela como uma grande inspiração”, completou Ana Patrícia.

Enquanto Paris 2024 foi a despedida de Marta dos Jogos Olímpicos – ela segue jogando por clubes e se destaca no Orlando Pride, dos EUA, aos 39 anos -, um grande nome do esporte brasileiro alcançou o ápice no ano passado. A ginasta Rebeca Andrade fez história na Olimpíada ao conquistar quatro medalhas – um ouro, duas pratas e um bronze – e se tornou a brasileira com mais premiações no torneio. E isso é mais do que merecido, segundo Ana Patrícia.

“O pouco que conhecemos e tivemos a oportunidade de estar junto deu para ver que é totalmente merecido tudo que a Rebeca conseguiu conquistar. Tenho certeza que ainda vai conquistar muito mais, até porque é muito importante o esporte brasileiro ter esse reconhecimento que tivemos através dela, através de todas as outras pessoas, que foram medalhistas e as que não foram também. Estar na Olimpíada é um fato que tem que ser comemorado. Então assim, é até difícil falar qualquer coisa sobre ela, né? Rebeca é a Rebeca, não tem o que o que falar”, concluiu Ana Patrícia

As lembranças de Paris 2024

O desempenho do Brasil em Paris 2024 deixa claro: foi a Olimpíada das mulheres. Além de Duda e Ana Patrícia no vôlei de praia e Rebeca Andrade no solo, a outra medalhista de ouro foi Beatriz Souza, do judô. E o país ainda contou com destaques como Rayssa Leal, no skate, a própria Marta e o time feminino de futebol, e várias outras representantes do esporte feminino que brilharam.

As recordações desses Jogos Olímpicos farão parte da memória da dupla do vôlei de praia para sempre. E Duda Lisboa fez questão de definir que tudo que ocorre durante a disputa é “muito intenso”. Até por isso, a sergipana de São Cristóvão ressaltou que o que mais a impressionou em Paris 2024 foi a própria força mental da parceria com Ana Patrícia.

“Você vive 12 dias na maior intensidade, adrenalina, medo, ansiedade, felicidade, então é um misto. [O que mais me impressinou] foi a força mental: o quanto você aguenta estar naquele momento, entrar naquela quadra em frente à Torre [Eiffel], uma multidão. Então, sabemos o quanto conseguimos. Não é fácil. […] E nós fomos muito felizes ali dentro. Queríamos nos divertir, sabe? Óbvio que divertir numa Olimpíada, às vezes, é uma responsabilidade gigantesca, mas a gente aproveitou tudo que tinha aproveitar”

Duda Lisboa, campeã olímpica no vôlei de praia

Só que o posto de campeã olímpica não fala apenas sobre o objeto dourado recebido em Paris. Os sete meses posteriores à conquista na França já mostraram para Duda e Ana Patrícia a valorização do povo brasileiro. E elas, inclusive, valorizam o reconhecimento que recebem em todos os lugares do país, incluindo Uberlândia, onde elas moram e representam o Praia Clube.

“Eu falo que o torcedor brasileiro realmente agarra. Ele abraça, fica feliz, conta como se emocionou. É muito legal poder ver crianças torcendo, vibrando, e, não sei se vão estar em um esporte, mas você sabe que elas estão admirando. É muito legal porque a gente já passou por isso [de admirar atletas] e agora vemos outras pessoas retribuindo. Hoje, a gente ser uma inspiração é muito divertido. E eu fiquei muito emocionada com todo o carinho, tanto de Uberlândia, do Brasil todo, da minha cidade, da cidade da Ana Patrícia. Quando a gente caminha aqui pelo Praia Clube todo mundo fala”, destacou Duda.

Mais de Duda e Ana Patrícia

Em entrevista exclusiva ao No Ataque, Duda e Ana Patrícia falaram mais sobre a Olimpíada de Paris e o momento da carreira. Fique de olho em mais conteúdos que foram publicados nos dias anteriores.

Como foi o descanso de Duda e Ana Patrícia no fim de 2024?

“Foi muito legal. Acho que foi um período muito importante para a gente também. Pós-Olimpíada, conseguir ter esse tempo com a nossa família, com os nossos amigos, receber o carinho de todo mundo que estava ali torcendo vibrando com a gente naquele momento tão especial de Paris. E um momento que a gente também descansou bastante”, enfatizou Ana Patrícia. Ela complementou.

“Acho que em toda a nossa carreira foi o período que a gente mais teve esse tempo um pouco maior para olhar para a gente também, para as nossas necessidades que acaba ficando um pouquinho de lado ali por conta do processo. E agora estamos de volta, construindo esse caminho de novo, cheio de desafios, mas muito felizes por recomeçar essa história com um objetivo e um sonho tão grande conquistado”

Ana Patrícia

“Foi muito legal poder ver a cidade [São Cristóvão-SE] e todo o Brasil torcendo pelo nosso time depois do ouro olímpico. Eu fiquei muito feliz e feliz também de ter tirado um tempo para nós, né? Assim, muito tempo jogando, sei lá, 12 anos sem parar, então você ter esse ‘tempinho’ com a família, curtir todo esse processo, curtir as pessoas que fizeram, trabalharam, estavam ao seu lado em momentos difíceis e depois do ouro olímpico. Então, a gente aproveitou muito nossas férias. Mini-férias [risos]”

Duda Lisboa

Qual foi o maior aprendizado da Ana Patrícia em Paris 2024?

“Eu acho que foi uma afirmação muito grande de algo que, às vezes, a gente fala muito e que até cai no clichê, que é sobre acreditar nos seus sonhos, nas coisas que você almeja para sua vida. Eu acho que para a gente ficou muito marcado porque vivemos um processo muito longo. Duda já está aí há quase 12, 13 anos, eu estou há 10 anos, e a gente viveu muita coisa, teve a oportunidade de vivenciar muita coisa no esporte, de bom e de ruim, mas nada que que tenha [nos desanimado]. Mesmo quando a gente achou que a chama, em algum momento, tinha se apagado, acho que quando a gente foi construindo o nosso processo juntas novamente, a gente entendeu realmente que aquilo estava ali e que realmente era um grande sonho que a gente tinha”, disse Ana Patrícia, que seguiu.

“Focamos muito nisso e conseguimos tirar a atenção e o foco de coisas que muitas vezes acabam desanimando, fazendo a gente sofrer, porque a gente também sofre com coisas que acontecem. Acho que, para a gente, o que fica é essa coisa da força do acreditar, da força de sonhar e, principalmente, sonhar esse sonho com pessoas que acreditam nele tanto quanto você, que foi o nosso caso. A nossa família nos apoiou muito, nossa comissão técnica nos apoiou muito. E então é acreditar e seguir trabalhar que acho não tem outro caminho para conquistar os sonhos”

Ana Patrícia

Após não aproveitar tanto em Tóquio 2021, Ana Patrícia curtiu Paris 2024?

“Sem dúvida alguma [aproveitamos]. Hoje, eu falo que eu realmente joguei uma Olimpíada. Joguei feliz, entendendo e respeitando a responsabilidade, porque se a gente carregava essa responsabilidade era porque, em algum momento, tínhamos entregado algo que criou essa expectativa nas pessoas. Mas fui muito feliz, vivi de tudo. Não tem nada que eu possa falar assim que eu queria e não vivi, porque nós fizemos tudo. A gente jogou, treinou, aproveitou, conheceu outras pessoas, conversou com outras pessoas, trocou histórias de vida com pessoas maravilhosas” ressaltou Ana Patrícia, que continuou.

“Hoje, eu realmente considero [que joguei uma Olimpíada]. Não que eu não tenha jogado Tóquio, né? Mas assim, foi uma experiência completamente diferente e eu nem falo por conta da medalha. Acho que a medalha foi a cereja do bolo, mas todas as experiências que a gente viveu ali dentro são coisas que levaremos para o resto da vida. E quanto mais o tempo passa, e a gente vai saindo do turbilhão, de tudo, é que você vai se lembrando das coisas que aconteceram e tudo vai ficando ainda mais especial”

Ana Patrícia

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